SÃO PAULO RIO

O desejo de se aproximar da fluência musical do Rio de Janeiro não significa, de modo algum, que o paulistano José Miguel Wisnik tenha abandonado neste São Paulo Rio a essência de sua música. O lirismo sofisticado de suas primeiras canções (delineado oficialmente no álbum de estréia, em 1993) continua se manifestando no samba Viúvo e na balada Por Um Fio, composições mais recentes que seguem tratando de sentimentos profundos, em tom confessional, sem apelar para o romantismo exacerbado. Ainda nessa linha, Virtual já revela uma vocação mais pop, com cara de hit inclusive, realçada pelo bem-sacado duo vocal com a cantora Jussara Silveira, cuja voz brilha igualmente em outras faixas. Não falta também um novo exemplar da antiga parceria com Luiz Tatit: a deliciosa Para Elisa, canção que combina lirismo com o canto falado que fez a fama do já extinto grupo paulista Rumo. O que realmente projeta Wisnik em sua pretendida Via Dutra musical são faixas como o choro Comida e Bebida, veículo para um verdadeiro show interpretativo de Elza Soares; a bossa Efeito Samba, que revela, inclusive na maneira de interpretar do compositor, a influência de Caetano Veloso; ou ainda o samba Inverno (Anhangabaú da Felicidade), que aponta para uma síntese inusitada do samba paulistano de Adoniran Barbosa com o tropicalismo ácido de Tom Zé. E para aqueles que encaram Wisnik como um seguidor mais recente da famigerada vanguarda paulistana, ele responde com Relp, uma fusão de rap e poesia musicada, criada a partir de palíndromos (frases que também podem ser lidas de trás para frente), cuja gravação conta com as vozes de Arnaldo Antunes e Jussara Silveira. Fundindo um ritmo essencialmente pop com uma letra essencialmente poética, Wisnik parece sugerir que o confronto de aparentes contrastes pode ser um caminho para novas sínteses musicais.(Carlos Calado)