BIS CANTORES DO RÁDIO - CARMEN COSTA
Carmen Costa (2000)
Crítica
Cotação:
Carmen Costa começou como corista de gravações de gente ilustre como Francisco Alves (de quem chegou a ser doméstica) mas, após uma vitoriosa dupla formada com o compositor Henricão, viu sua carreira deslanchar. Houve, contudo, uma história hilária. Carmen diz que perdeu a voz aguda e passou a cantar em tons baixos por causa de uma enchente (!) ocorrida no Rio de Janeiro na virada dos anos 40 para os 50 - mas nunca explicou como se deu essa mágica. Delírios à parte, o fato é que foi graças a essa "nova voz", coloquial e diseuse, que Carmen chegou ao ápice de sua carreira a bordo de clássicos como Eu Sou a Outra, Quase e Obsessão. Esse estilo de cantar como se conversa (na época, até se comentou que ela estaria imitando a criadora desse estilo, Nora Ney) faz com que tudo que cante soe como uma confidência ao ouvinte.
No CD Bis - Cantores do Rádio é possível ouvir a vingança, o desprezo e o rancor arrolados deliciosamente pela voz lamentosa de Carmen em canções como Manchetes de Jornal ("Não torne a bater em minha porta por favor se é que ainda tens sentimento e pudor"), Sei de Tudo ("Tu és falso que nem uma nota de 15 cruzeiros") e Defesa ("Na verdade sei honrar meu santo nome de mulher/ Embora você diga pelo mundo que eu não presto/ Mas pra ganhar meu pão eu ganho honesto").
O machismo vigente nos anos 50 também está presente em algumas faixas, como na hilariante Não É Só Vestir Saia. "Você vai perder o marido que tem porque você não age bem/ Porque você não sabe ser mulher/ (...) Marido, quando chega em casa da lida da vida/ Quer tudo menos motivo pra discussão/ Só deseja o conforto do pijama e o jornal pra ler na cama/ Farto de opinião/ (...) Você vai sofrer e aprender a lição/ Pois ser mulher não é só vestir saia não". Não é uma maravilha? Do mesmo autor, Ricardo Galeno, temos Eu Sou a Outra, mais espirituosa mas igualmente machista. "Não tenho um nome/ Trago um coração ferido/ Mas tenho muito mais classe do que quem não soube prender o marido". Carmen só cala a boca das feministas em Se Eu Fosse Contar ("O homem nunca reconhece o que sua esposa faz dentro de casa/ Quando a criança chora na hora do almoço que está pra fazer/ Temos que largar as panelas, ninar a criança até adormecer/ Roupa lavada na hora casa arrumada não cansa ninguém/ E aturar brigas da rua que o marido traz pra casa também"). Como se vê, esse disco de Carmen é, acima de tudo, uma crônica perfeita de costumes dos anos 50.
Mas o CD não fica só nas queixas ou desabafos femininos, Carmen esbanja brejeirice nos delcisosos sambas Não Pode Mexer ("Só faço docinhos pra ele comer"), o carnavalesco Indecisão (dos craques no gênero Paquito e Romeo Gentil) ou Não Fique Triste ("O seu caso é comum/ Quem lhe fez infeliz faz infeliz qualquer um"). Operário (Mirabeu/ Vieira Jr.), por sua vez, chama à consciência social: "Você disse que eu não sou artista/ Vou lhe provar se sou artista ou não/ Acordo de madrugada pego na minha marmita/ Trem da central é a minha condução/ Sou artista ou não?". Para completar, há um 78 rpm de agosto de 1939 de Carmen & Henricão, cujos dois lados foram aproveitados nessa coletânea: Onde Está o Dinheiro - "Ô Neguinho/ Onde está o dinheiro/ - Mas que dinheiro, nega/ O dinheiro que eu trabalhei e ganhei? / - Oh nega, (...) eu precisei e gastei" - e Não Dou Motivo - "Se tudo nessa vida é artificial/ Eu canto para esconder meu mal". Pérolas de uma diva que marcou época na MPB com muita coragem para se expor em letras tão fortes e despudoradas.(Rodrigo Faour)
No CD Bis - Cantores do Rádio é possível ouvir a vingança, o desprezo e o rancor arrolados deliciosamente pela voz lamentosa de Carmen em canções como Manchetes de Jornal ("Não torne a bater em minha porta por favor se é que ainda tens sentimento e pudor"), Sei de Tudo ("Tu és falso que nem uma nota de 15 cruzeiros") e Defesa ("Na verdade sei honrar meu santo nome de mulher/ Embora você diga pelo mundo que eu não presto/ Mas pra ganhar meu pão eu ganho honesto").
O machismo vigente nos anos 50 também está presente em algumas faixas, como na hilariante Não É Só Vestir Saia. "Você vai perder o marido que tem porque você não age bem/ Porque você não sabe ser mulher/ (...) Marido, quando chega em casa da lida da vida/ Quer tudo menos motivo pra discussão/ Só deseja o conforto do pijama e o jornal pra ler na cama/ Farto de opinião/ (...) Você vai sofrer e aprender a lição/ Pois ser mulher não é só vestir saia não". Não é uma maravilha? Do mesmo autor, Ricardo Galeno, temos Eu Sou a Outra, mais espirituosa mas igualmente machista. "Não tenho um nome/ Trago um coração ferido/ Mas tenho muito mais classe do que quem não soube prender o marido". Carmen só cala a boca das feministas em Se Eu Fosse Contar ("O homem nunca reconhece o que sua esposa faz dentro de casa/ Quando a criança chora na hora do almoço que está pra fazer/ Temos que largar as panelas, ninar a criança até adormecer/ Roupa lavada na hora casa arrumada não cansa ninguém/ E aturar brigas da rua que o marido traz pra casa também"). Como se vê, esse disco de Carmen é, acima de tudo, uma crônica perfeita de costumes dos anos 50.
Mas o CD não fica só nas queixas ou desabafos femininos, Carmen esbanja brejeirice nos delcisosos sambas Não Pode Mexer ("Só faço docinhos pra ele comer"), o carnavalesco Indecisão (dos craques no gênero Paquito e Romeo Gentil) ou Não Fique Triste ("O seu caso é comum/ Quem lhe fez infeliz faz infeliz qualquer um"). Operário (Mirabeu/ Vieira Jr.), por sua vez, chama à consciência social: "Você disse que eu não sou artista/ Vou lhe provar se sou artista ou não/ Acordo de madrugada pego na minha marmita/ Trem da central é a minha condução/ Sou artista ou não?". Para completar, há um 78 rpm de agosto de 1939 de Carmen & Henricão, cujos dois lados foram aproveitados nessa coletânea: Onde Está o Dinheiro - "Ô Neguinho/ Onde está o dinheiro/ - Mas que dinheiro, nega/ O dinheiro que eu trabalhei e ganhei? / - Oh nega, (...) eu precisei e gastei" - e Não Dou Motivo - "Se tudo nessa vida é artificial/ Eu canto para esconder meu mal". Pérolas de uma diva que marcou época na MPB com muita coragem para se expor em letras tão fortes e despudoradas.(Rodrigo Faour)
Faixas
DISCO 1
DISCO 2