RAÍZES DO SAMBA - ARY BARROSO
Ary Barroso (2000)
Crítica
Cotação:
Um dos maiores compositores brasileiros, o mineiro de Ubá Ary Evangelista Barroso (1903-1964) foi também uma figuraça. Locutor esportivo, animador de programa de calouros, egocêntrico, ranzinza profissional, ele era capaz de criticar até o próprio desempenho como cantor, preciosidade registrada no LP Encontro com Ary, de 1955 (e não 1964 como foi anotado na minúscula ficha técnica) reproduzida em duas faixas desta coletânea. "Agora – vejam! – vou cantar Camisa Amarela", ironiza antes de mandar ao piano e voz trêmula um de seus clássicos. Repete o estratagema com Nem Ela, prefaciado por um discurso onde trata o disco como "um documentário" onde deixou "pensamento, alma e coração". Emenda com "minha saudação eterna", Aquarela do Brasil dedilhada no piano. O mesmo hino abre o disco na gravação original de Francisco Alves de 1939, com amplo arranjo orquestral de Radamés Gnattali, o maestro que vestiu o samba com roupa de câmara. Na colcha de retalhos (quase todos preciosos) da antologia há tanto o modernista Mario Reis (do amaxixado Vou à Penha ao sincopado Vamos Deixar de Intimidade) quanto os conservadores Candido Botelho (Brasil Moreno) e Moraes Neto (Isto Aqui o Que É, reciclada por João Gilberto). Da divina Elizeth Cardoso (No Rancho Fundo repleto de erres puxados) aos dissonantes 4 Ases e Um Coringa (Terra Seca, canção de protesto racial pioneira) e a dupla Carmem Miranda & Silvio Caldas naquele tipo de samba exaltação dialogado (Quando Eu Penso na Bahia) em que Ary (também) foi mestre. Só, ao violão, Dorival Caymmi apropria-se de Na Baixa do Sapateiro, faixa extraída de Ary Caymmi e Dorival Barroso, disco em que Ary toca Caymmi ao piano e o baiano canta as músicas do mineiro ao violão. O lado orquestrador e pianista (econômico, percussivo e/ou grandiloquente) de Ary salta de faixas como É Mentira, Oi, O Correio já Chegou, Foi Ela, Malandro Sofredor, Faceira, Falta de Consciência, do disco Meu Brasil Brasileiro, gravado por ele em 1958. Há ainda orquestrações mais antigas como Sem Ella/No Tabuleiro da Baiana, de 1939, num painel um tanto caótico que contracena bem com a personalidade vulcânica e brilhante do compositor.
(Tárik de Souza)
Faixas
No tabuleiro da baiana (Ary Barroso)
Aquarela do Brasil (Ary Barroso)