ZÉ RAMALHO CANTA RAUL SEIXAS

Equivocado. Infelizmente, é só o que se pode dizer deste Zé Ramalho Canta Raul Seixas. O há muito prometido projeto (que, em cima da hora, acabou ficando sem as músicas em parceria com Paulo Coelho) se respalda na amizade dos dois e se beneficia da história de um encontro que eles tiveram nos anos 80. Mas, como artistas, não poderiam ser mais diferentes o paraibano e o baiano. A profunda ironia das canções de Raul é simplesmente ignorada na interpretação de profeta do Apocalipse (de Avohai) que Zé achou por bem tornar sua marca registrada. O resultado é que músicas como S.O.S. e Dentadura Postiça acabaram totalmente descaracterizadas - a última, que era um rock bem-humorado, virou um blues grave, fazendo com que letra e música se chocassem. Outro problema é com Prelúdio, que tem a participação da cantora Roberta do Recife, e que no meio descamba estranhamente para algo como uma trilha de musical da Broadway. Além disso, no saldo geral, o disco é bem paradão - fora As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor, que ainda tem guitarras em cópulas com uma viola, e Você Ainda Pode Sonhar (versão de Raulzito para Lucy In The Sky With Diamonds, dos Beatles), mas essa tinha sido recuperada primeiro (e melhor) pelo Ira!

As versões de Trem das 7 e Ouro de Tolo não são tão más, com bons arranjos de cordas, mas a de Metamorfose Ambulante não acrescenta coisa alguma à tão revisitada canção. Zé pára de recitar e canta em Planos de Papel, um meio bolero. E ainda arrisca, de próprio punho, uma homenagem, Para Raul, com uma levada de rock brega. A letra diz tudo: "E em cada pedaço de recordação/ Lembre do povo, da alma-irmã/ Não se esqueça de mim/ Que sou seu fã". Algo que, se não é digno do bom Zé Ramalho, que dirá de Raul.(Silvio Essinger)