<i>Jam</i> eletrônica lança a compilação <i>Caipiríssima</i>

Para marcar a edição nacional da coletânea americana de música eletrônica brasileira, expoentes da cena, como Anvil FX, Apollo 9, Ramilson Maia e João Parayba, realizam um improviso

Carlos Calado
25/04/2001
Qualquer fã da atual cena de música eletrônica ficaria curioso por presenciar uma jam como a que aconteceu na manhã de ontem, no estúdio da gravadora YB Music, em São Paulo. Mas foi apenas um pequeno grupo de convidados que teve o privilégio de assistir ao energético encontro musical dos DJs Anvil FX, Apollo 9 e Ramilson Maia com o percussionista João Parahyba. Na platéia, estavam os compositores BiD e Amon Tobin, que também fazem parte da compilação Caipiríssima - Batucada Eletrônica amostras de 30s, cujo lançamento no Brasil pela YB serviu de pretexto para a jam. Assinando faixas desse CD também aparecem DJ Dolores, Arto Lindsay, Suba (em parceria com o DJ M.A.U.), DJ Soul Slinger, cYz, I.N. Project e Chelpa Ferro.

"A torcida grita ‘Pelé, Pelé’ ", berrou um locutor de rádio, narrando o histórico milésimo gol do rei do futebol, no sample que Anvil FX utiliza como motivo e trilha sonora de sua composição 1000 ouvir 30s. Essa foi a faixa da compilação escolhida para deflagrar a jam, com FX e Maia pilotando seus toca-discos, Apollo 9 tocando um clássico órgão Hammond e Parahyba alternando bateria e percussão.

Minutos antes, os seis artistas conversaram com os jornalistas presentes. Na falta de Béco Dranoff, produtor brasileiro radicado em Nova York, que criou a compilação (leia matéria), João Parahyba assumiu o comando da conversa, de modo informal. "Esse disco mostra que tem muita gente no Brasil fazendo música eletrônica com uma assinatura. Você ouve e sabe que é BiD, Ramilson, Apollo ou Anvil", disse o compositor e percussionista paulista, lembrando que Central do Brasil, sua faixa na compilação, foi gravada cinco anos atrás, num momento bem diferente para a cena da música eletrônica. "Naquela época eu ainda estava criando o conceito de reprocessamento de ritmos brasileiros junto com o Suba. Central do Brasil não tinha essa idéia de música eletrônica. Em 1996 ela ainda não era considerada assim", observou.

O compositor e guitarrista paulista BiD não perdeu a chance de alfinetar as grandes gravadoras e sua política de lucro fácil. "Caipiríssima traz uma visão ampla do que está acontecendo por aqui, mas é uma pena que foi preciso alguém de fora, que vive em Nova York, fazer isso. No Brasil, infelizmente, impera esse funk carioca. Não sei se muita gente vai se interessar por este projeto. Aqui só vivemos de arrastões sonoros", criticou o também líder da banda Funk Como Le Gusta, que já está em fase de gravação de seu segundo CD.

Mais otimistas, os DJs Apollo 9 e Ramilson Maia enfatizaram o crescimento da cena eletrônica no país. "Esse público é mais alternativo e está sempre à procura de coisas diferentes", comentou o primeiro. "O número de DJs de fora que vêm tocar aqui cresceu muito. A quantidade de adeptos da música eletrônica também aumentou bastante e vai crescer mais ainda", disse Maia, ressaltando o sucesso cada vez maior de artistas brasileiros, como o DJ Marky, no cenário internacional desse gênero. "Os DJs nacionais arregaçaram os gringos no Skol Beats", disse o paulista, provocando sorrisos na platéia.

Já Anvil FX comentou que só tinha percebido o quanto sua música tinha características brasileiras recentemente, ao participar do show de lançamento de Caipiríssima, nos EUA. "Mais do que samplear coisas daqui, acho que existe um DNA brasileiro na nossa música, algo que a gente não costuma perceber", afirmou o DJ mineiro, que não concorda com o termo "música eletrônica". Para embasar sua opinião, FX citou o ensaísta e compositor contemporâneo Florivaldo Menezes. "Ele diz que não existe música eletrônica. O que existe é composição eletrônica", justificou.

A questão da brasilidade também motivou Amon Tobin a dar uma espécie de conselho a seus colegas brasileiros. "As pessoas sempre estão à procura de coisas de fora, nunca olham para as coisas de seu país. Ninguém quer uma cópia das suas coisas. Vale a pena fazer uma experimentação eletrônica brasileira. Isso é que vai fazer barulho", ensinou Tobin, falando português com uma dificuldade típica de quem deixou o Brasil ainda criança.

"A grande vantagem do brasileiro é que ele ouve uma música de fora e em cinco minutos já está misturando essa música com a música brasileira, tocando até sanfona. Somos Macunaímas eletrônicos. Você quer tocar igual a um gringo, mas tem um suíngue que é natural daqui", concluiu o veterano Parahyba, que vai tocar com Anvil FX, dia 27, no festival Electronica Telemig-Celular, em Belo Horizonte, na mesma noite em que se apresenta Amon Tobin.

Leia ainda: