A hora da verdade da Penélope

Grupo baiano lança Buganvília, seu segundo CD, aposta no rock e lança inédita de Herbert Vianna

Marco Antonio Barbosa
27/06/2001
Não ouse chamar o som do grupo Penélope de pop na frente de seus integrantes. Epítetos como "fofinho" ou "doce" também estão barrados. "Fazemos rock. Estamos sempre em busca das bases pesadas, da guitarra distorcida", afirma o baterista do quinteto baiano, Mário Jorge. Mas ele emenda em seguida, amenizando: "Sermos considerados pop é uma conseqüência da nossa projeção, apenas. Não temos nenhum preconceito com o rótulo, só que não precisamos dele; quem precisa é o público". Com esse discurso pró-rock'n'roll, a Penélope lança seu segundo álbum, Buganvília ouvir 30s, pela Sony Music. Dois anos depois de Mi Casa, Su Casa ouvir 30s, e quatro anos depois de serem revelados ao mundo na edição 1997 do Abril Pro Rock, o grupo encara a chamada "hora da verdade" - e tem de provar que veio para ficar.

"Nós sempre pensamos em ter uma carreira estável, de longo prazo, e não ser um daqueles grupos que hoje vendem 500 mil cópias e no disco seguinte somem do mapa. Não temos o interesse em estourar de vez, virar um supersucesso de uma hora para outra. Ainda bem que a Sony também percebeu isso e renovou com a gente antecipadamente, enquanto ainda estávamos trabalhando o primeiro álbum", conta Mário. Mi Casa, Su Casa não chegou a ser uma explosão de vendas (atingiu 50 mil cópias, patamar sólido mas modesto para uma gravadora multinacional). Com Buganvília, o grupo - Érika Martins (voz e guitarra), Constança Scofield (flauta e teclado), Érika Nande (baixo), Luisão (guitarra) e Mário - pretende ampliar essa base de fãs sem mudar seu método de trabalho. "Nossos planos são os mesmos de sempre: tocar, construir uma carreira na estrada. Fizemos assim até agora e as pessoas entenderam a nossa proposta", diz o baterista.

Apesar da resoluta opção pelo rock'n'roll, a primeira impressão que se tem de Buganvília é a de um álbum romântico, talvez mais até que o primeiro disco. Letras como as de Filme da Alma ("Um doce beijo, suave, pra não despertar o meu amor") ou Caixa de Bombom ("E pra que ler tantos livros/Se o amor não te ensina/Que junto a mim levaria o tem coração") só reforçam a idéia. "Não tive essa impressão...", desconversa o baterista, opinando: "Creio que a diferença está nas letras da Érika (Martins), que agora estão mais pessoais. Antes ela escrevia coisas mais abrangentes, tipo Naqueles Dias (do primeiro disco), que falava num tom mais feminista. Agora não, as letras estão confessionais. Pode ser um sinal de amadurecimento."

Outro dado marcante do disco é a influência do pop inglês no som da banda - uma presença que já existia em Mi Casa, Su Casa, mas que agora dá as cartas abertamente em músicas como Plus, Junto do Mar e Continue Pensando Assim. "Sempre tivemos essa influência bem forte desde o início, mais pela Érika e pela Constança - que ouvem Britpop direto", fala Mário Jorge. O baterista sustenta que, apesar (ou por causa) disso, o som do grupo, fundamentalmente, não mudou. "Continuamos com nossa fórmula, que sempre foi casar as guitarras distorcidas com a voz doce da Érika, ou com a flauta da Constança. A diferença do primeiro para o segundo disco é que na hora de gravar o Mi Casa, nós fizemos um registro bem cru, totalmente fiel ao som que fazíamos ao vivo. Neste álbum nós nos libertamos dos preconceitos que tínhamos - por medo de que 'alterassem' nosso som - e variamos mais os arranjos", conta.

E nenhuma outra que não a Ternurinha Wanderléia comparece ao disco (cantando em Não Vou Ser Má), para dar seu referendo à nova fase da banda. "Conhecemos ela na entrega do Prêmio Multishow no ano passado e ela foi superlegal com a gente", lembra Mário. "A música já existia, e sempre teve essa levada meio anos 60, à la Jovem Guarda. Convidamos a Wanderléa e ela topou participar na hora. Pensando bem, várias letras de Érika têm uma temática parecida com as músicas da Wanderléa, como essa mesmo, que fala de uma garota que não se deixa oprimir pelos outros."

Um momento emocionado do álbum é Junto ao Mar, canção inédita de Herbert Vianna. O grupo tinha uma relação muito próxima com o casal Herbert e Lucy (a esposa do vocalista dos Paralamas, morta no acidente de ultraleve que deixou o músico tetraplégico): ela era a empresária da Penélope, e o disco é dedicado a ela. No ano passado, Érika Martins gravou com Herbert (no disco solo do Paralama, O Som do Sim ouvir 30s) uma versão para Inbetween Days ouvir 30s, do grupo inglês The Cure. "Lucy era a inglesa mais baiana do mundo. Devemos muito a ela", lembra Mário. "O Herbert fez essa música ano passado e entregou a Érika cantar. Não sabíamos ainda se iríamos gravar ou não, quando aconteceu o acidente. Depois ficamos na dúvida, foi uma decisão difícil - afinal, a letra fala da Lucy. Colocamos também como mais uma homenagem."

Além da voz de Wanderléa e dos versos de Herbert, outro famoso que dá seu aval à Penélope é Lulu Santos, que assina o press-release do álbum "Não conheço o grupo pessoalmente, mas preciso dizer que acho este disco super charmoso", afirma Lulu no texto. "Naquela música Made in Brazil ouvir 30s, o Lulu nos cita de uma maneira muito legal. Ficamos lisojeados. Apesar de não o conhecermos, o convidamos para fazer o release, ele topou e nem cobrou um tostão por isso! É ótimo ter alguém como ele - que tem uma tremenda visão, uma grande noção de música - nos elogiando", diz Mário.

Buganvília foi gravado no estúdio caseiro do produtor Tom Capone, que além de ter produzido o primeiro álbum do grupo também é casado com a tecladista Constança. "Ficou literalmente uma coisa familiar", brinca Mário. "Trabalhar assim em casa deu um clima supertranqüilo ao álbum, e influiu decisivamente no processo de gravação. O Tom entende perfeitamente o nosso som, além de ter virado brother do grupo também."

Para dar corpo à filosofia de "vida na estrada" pregada pela banda, a Penélope agora pretende renovar completamente seu show, de forma a poder levar ao palco as sutilezas do novo álbum. "Toda a grana que juntamos desde o começo da banda tem sido revertida para que possamos fazer um show mais trabalhado. Queremos fazer uma coisa mais produzida visualmente, com cenários e um palco legal. E um som legal também, para podermos ter ao vivo uma sonoridade igual à do CD - uma preocupação que a gente passou a ter agora", conta Mário Jorge. Mas o baterista finaliza, sempre fiel ao espírito roqueiro: "Ao mesmo tempo, não queremos dispensar o clima de garagem que sempre marcou nossos shows. Uma coisa mais despojada."