A volta de Carlos Maltz, ex-Engenheiro do Hawaii

Após tentativa solo anterior e de um upgrade filosófico e profissional, o ex-baterista ressurge com um disco solo independente

Ricardo Schott
25/11/2002
Carlos Maltz passou boa parte dos seus 40 anos dedicado à cozinha da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii. Nos dias de hoje, tanto ele quanto sua ex-banda estão em patamares diferentes dos do passado: os Engenheiros são quase um projeto solo do líder Humberto Gessinger - que de tempos em tempos troca a formação da banda - e apesar de pertencerem ao cast de uma gravadora multinacional, são quase um grupo cult, impulsionado por um séquito de fâs e esparsas aparições no rádio e na TV.

Já Maltz, após os Engenheiros, voltou a ser underground: gravou um CD com o grupo Irmandade Interplanetária, passou a estudar profundamente astrologia - assunto ao qual ele já dedicava desde o começo dos anos 90 - e praticamente surmiu do mercado musical. O reaparecimento de Maltz está se dando este ano, com seu primeiro verdadeiro disco solo, Farinha do Mesmo Saco, lançado às próprias custas. Maltz, que saíra dos Engenheiros por questões ideológicas (ele começou a não concordar com as letras do líder-mentor Humberto Gessinger) pela primeira vez assina, sozinho ou com parceiros, todas as faixas de um disco. Após ficar anos sem contato com Humberto, Maltz, que reencontrou-se com ele numa simples troca de e-mails (que gerou a faixa e-stória, do disco novo dos EngHaw, Surfando Karmas & DNA ouvir 30s), teve a coleaboração do antigo parceiro em inúmeras faixas. Maltz canta - com um registro vocal aproximado do rock rural e da country music - toca, bateria e violão. Gessinger canta na faixa de abertura, toca guitarra, baixo e é um dos produtores, junto a Maltz, Fábio Tabach, Rodrigo Kuster e Guto Dufrayer. De acordo com Carlos, não houve problemas para juntar cinco produtores num disco, já que "todos estavam lá para ajudar um amigo". O CD, que ainda contém gravações feitas em 1997 e 1999, foi todo concebido no estúdio carioca Casa de Pedra (antigo Rock House), que vem apostando no trabalho de Maltz há tempos.

Desde 1995, quando saiu o seu último disco com os Engenheiros, Simples de Coração ouvir 30s, Maltz vem trilhando um caminho de busca, de auto-descoberta, que culminou na escolha da astrologia como segunda profissão e no estudo de temas como karma, a energia das palavras, etc. Esses estudos de Maltz acabaram envolvendo o agora cantor numa confusão recente: quando em, 1997, os Raimundos deram aquele fatídico show em Santos que terminou com a morte de alguns fâs, Maltz, ao ser procurado pela imprensa, declarou que a banda "colheu o que havia plantado". Bandas como Raimundos, Planet Hemp e Charlie Brown Jr. costumam encher seu repertório e suas letras de alusões à maconha, assunto que decididamente não faz parte do universo de Carlos Maltz. As letras de Farinha do Mesmo Saco giram em torno de temas como perdão, religião, humanidade, existência e algumas faixas têm realmente temas religiosos, embora Farinha... esteja longe de ser um disco gospel. Atualmente Carlos Maltz, judeu de nascença, é ligado à Igreja Messiânica, assim como os músicos que o acompanham. O novo parceiro mais constante é Marcus Melgar, que compõe algumas faixas com Maltz e toca violão no disco.

No disco, Maltz apresenta um pop-rock coeso, alegre, totalmente recomendável para quem gosta da fase inicial dos Engenheiros do Hawaii (algumas músicas lembram muito o som de discos como Longe Demais das Capitais). O som mescla rock, country, reggae, ska, folk e até sonoridades meio góticas, como no caso de Quase uma Oração, uma das melhores faixas do CD. Aparecem reggaezinhos, como a faixa-título, e uma versão quase brit-pop para Jardim das Acácias, de Zé Ramalho - que por sinal participa do CD, cantando em Passos do Mundo. O encontro com Zé Ramalho, de quem é fâ desde 1977, foi algo muito significativo para Maltz: ele escreveu para o cantor e recebeu do ídolo escritos e discos raros, além da participação no CD. Além disso, Maltz também musicou Ubiquidade, poema de Manoel Bandeira, e regravou sua única música gravada pelos Engenheiros, O Castelo dos Destinos Cruzados, em versão folk-pop-rock.

Quem se interessar pelo disco, é só entrar no site oficial de Maltz, o www.carlosmaltz.com.br. No site, Maltz apresenta uma autobiografia detalhada e bem escrita (na qual até mesmo o fâ dos Engenheiros pode encontrar detalhes biográficos curiosos), divulga serviços de astrologia, publica crônicas (boas, por sinal) e vende o disco, além de comandar um fórum de discussões sobre vários assuntos pertinentes à sua obra.