As duas faces musicais do Seu Casseta

Reinaldo, do Casseta & Planeta, chega ao mercado em dois CDs: a coletânea das músicas do grupo de humoristas e o álbum de estréia da Companhia Estadual de Jazz

Silvio Essinger
20/07/2000
Além do Devagar Franco, do policial Sucker e de várias outras hilárias figuras, o humorista (e cartunista) Reinaldo, do Casseta & Planeta, encarna um papel que pode surpreender quem não o conhece bem. Ele é músico, contrabaixista de mão cheia, e está aí nas lojas com dois discos para mostrar que é capaz de brincar nas quatro cordas. O mais conhecido dos lançamentos é The Bost Of (Som Livre), coletânea com músicas recentes do grupo de humoristas (Rap do Maçaranduba e os sambas Nenê de Papá e Meganhas Assassinas) e algumas de seus dois discos anteriores, Preto com um Buraco no Meio (1989) e Para Comer Alguém (1994). Já o menos conhecido é o disco independente Companhia Estadual de Jazz, a estréia fonográfica do seu quinteto, especializado em traçar standards de Dizzy Gillespie, Tom Jobim, Horace Silver, Moacir Santos e outras sumidades da música popular sofisticada.

Dos integrantes do Casseta & Planeta, Reinaldo foi o único que se arriscou a ir além dos vocais – gravou as partes de contrabaixo de algumas faixas dos discos do grupo, como Caldo Verde, Surfista e Caçapas de Ilusão. Consciência instrumental dos humoristas, ele alerta para o timaço de músicos reunidos nas faixas dos discos do grupo: Carlos Malta, Leo Gandelman, Itamar Assiere, Bidinho, Serginho Trombone, Armando Marçal, Jamil Joanes... As gravações de Caldo Verde, por exemplo, Reinaldo teve a honra de dividir com o sanfoneiro Sivuca e o percussionista Marcos Suzano. Ele lamenta que, por problemas de liberação de faixas, os dois discos não puderam ter sido relançados na íntegra. Evitou-se assim, porém, o problema de arrumar um novo título para que Preto com um Buraco no Meio passasse da era do bolachão de vinil para a do CD. "Teria que ser Prateado com um Buraco no Meio, sei lá", arrisca.

Reinaldo conta que desde o começo a banda se preocupou com que as músicas não ficassem datadas – e daí caprichou no instrumental. Em The Bost Of , renova-se a graça de músicas como Mãe É Mãe (na sátira a Tim Maia e a Banda Vitória Régia), o sambão Tô Tristão e o reggae Tributo a Bob Marley (onde a letra "Se o Botafogo daqui é assim/ Imagine o da Jamaica" foi mudada – afinal, penúria por penúria, o Fluminense virou exemplo melhor). A única lástima é que o Casseta & Planeta não fará nenhum daqueles seus anárquicos shows para divulgar o lançamento da coletânea. "Há muitos convites, mas não dá mais tempo agora que o programa de TV é semanal", informa Reinaldo.

Jam sessions semanais
Seguindo o exemplo de outros craques do humor (como Luiz Fernando Veríssimo, Chico Caruso e Paulo Caruso, que volta e meia se juntam para tocar jazz), o Seu Casseta também achou sua turma de músicos para fazer umas jam sessions. Com eles, começou a tocar três anos atrás, na happy hour do bar Santa Fé, no Centro do Rio de Janeiro. "Tocar lá toda semana era melhor do que alugar estúdio para ensaiar", entrega. Surpreendentemente, algumas pessoas voltavam para rever o show, o que animou a banda a seguir. Nos últimos meses, a jam semanal passou a ser realizada em outro bar, o Satchmo.

Reinaldo acha que não tem perfil de solista – passa a bola para os outros integrantes da Companhia Estadual de Jazz: o pianista Sergio Fayne, o saxofonista e flautista Guilherme Vianna, o guitarrista André Barion e o baterista Chico Pessanha. "Sou mais é um bom acompanhador", define-se. Com um repertório que inclui clássicos como Nanã (Moacir Santos e Mário Telles), Señor Blues (Horace Silver), Inútil Paisagem (Tom Jobim e Aloísio de Oliveira) e Birks Works (Dizzy Gillespie), a banda embarcou mês passado para o Festival Internacional de Jazz de Montreal, onde fez algumas apresentações. "Unimos o útil ao agradável", diz o baixista. O convite veio graças à intervenção do amigo saxofonista Jean Pierre Zanella (autor de Caminha, gravada no CD).

Reinaldo não nutre ilusões quanto às possibilidades de sucesso do CD da Companhia. "É uma coisa para poucos. Aproveito a minha figura pública para chamar a atenção para essas músicas, porque se as pessoas não as ouvirem, vão passar pela vida e perder a oportunidade de gostar delas", diz. Nesta sexta-feira, a Companhia faz uma participação no festival Jazz & Blues no balneário de Búzios (RJ).