Biscoitos finos também para os alemães

Discos clássicos de Chico, Gil, Gal e Caetano são lançados na Alemanha, país onde a série de CDs duplos A Trip To Brazil, só de bossa nova, é um sucesso de vendas

Felipe Tadeu
01/08/2000
Acaba de chegar às lojas da Alemanha, pela Universal Music, uma série de 16 álbuns originais da MPB. Mais um projeto detonado por aquele que é um dos alemães mais engajados na causa da música brasileira: Christian Kellersmann. O mote são os 500 anos do descobrimento do Brasil pelos navegantes lusitanos. Os CDs são alguns dos principais títulos da discografia de Chico Buarque, Gal Costa, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Os Mutantes, João Gilberto, Elis Regina, João Bosco, Maria Bethânia e... Tom Jobim, é claro. Brasil 500 é uma série das mais oportunas para aqueles que ainda não conhecem a música que se faz no lado de baixo do Equador.

Só o autor de O Meu Guri teve quatro álbuns inseridos na fornada: Construção (1971), Caetano e Chico Juntos e Ao Vivo (1972), Chico Buarque e Maria Bethânia Ao Vivo (1975) e Meus Caros Amigos (1976). De Gilberto Gil, foram selecionados o seu segundo disco, o Gilberto Gil de 1968 – aquele que traz na capa o baiano posando de Sargento Pimenta –, Expresso 2222 (1972) e Brasil, álbum assinado a oito mãos por Gil, João Gilberto, Caetano e Bethânia (1980). Enquanto Gal Costa chega de Índia (1973) e Gal Canta Caymmi (1976), Caetano tem os solos Caetano Veloso (1968), Outras Palavras (1981) e Estrangeiro (1989) lançados neste pacote, que ainda inclui ainda João Bosco Ao Vivo 100° Apresentação (1983), o Tecnicolor dos Mutantes (gravado em Paris em 1970 e só lançado poucos meses atrás), Elis & Tom (1974) e o álbum branco de João Gilberto, datado de 1973.

Dinâmico alemão de 40 anos de idade, nascido na cidade de Hamburgo, Christian Kellersmann é, no momento, o principal responsável pelos departamentos de jazz e música clássica da gravadora Universal na Alemanha. Seu envolvimento pela música brasileira começou de maneira mais intensa em 1981, quando recebeu de um amigo o disco Luar, de Gilberto Gil. "Antes eu já conhecia Garota de Ipanema na gravação de Stan Getz, mas foi através de Gil que travei contato a pop music do Brasil", diz.

Começo com Péricles Cavalcanti
Trabalhando na Universal há exatamente dez anos, Kellersmann foi desde o começo um incansável batalhador pela música brasileira dentro da sua gravadora. O primeiro artista lançado por ele foi Péricles Cavalcanti. "Ele veio fazer uma pequena turnê aqui pela Alemanha, para divulgar seu disco. No final, o álbum não vendeu muito, mas foi bacana o trabalho com ele", conta. Pouco tempo depois, em 1991, ele soltava no mercado outro disco de música brasileira, o Brazil Tropical, uma coletânea que trazia Elba Ramalho, João Bosco, Ney Matogrosso, Gil, Caetano, Gal e Margareth Menezes.

Em 1995, era a vez da cantora Joyce ter sua apresentação no Mojo Club, em Hamburgo, registrada ao vivo e lançada em CD. Um disco em que a artista carioca se fazia acompanhar de Tutty Moreno na bateria, Sizão Machado no baixo e vocais, e Teco Cardoso nos sopros. Live at The Mojo Club tinha como repertório, canções como Aldeia de Ogum, Samba de Gago, Povo das Estrelas e Suíte Baracumbara/Banana, dentre outras, e foi bem acolhido pela crítica musical germânica.

O seguinte da lista seria Chico Buarque de Hollanda, com Chico Total, uma representativa compilação de 24 faixas. O projeto, mais audacioso do que os anteriores, trazia todas as letras do álbum vertidas para a língua de Brecht por Karin von Schweder-Schreiner, tradutora de renome que já havia traduzido Estorvo, romance de Chico, para a edição alemã. A coletânea, que abrange o período 1966-85, teve cerca de quatro mil cópias vendidas na Alemanha, o que não deixa de ser uma boa marca para um músico que raramente aparece no país. "O disco começou vendendo super bem, a imprensa toda comentou o fato de ser o primeiro título de Chico lançado na Alemanha, mas o artista só se apresentou uma única vez por aqui até hoje!", reclama Christian.

O paraibano Chico César é citado pelo produtor alemão como um dos brasileiros que estão mais atentos ao mercado alemão. Para promover seu mais recente CD, Mama Mundi, na mídia local, o artista foi à Alemanha um mês antes do início de sua turnê só para dar entrevistas.

Bossa nova em alta
Mas sucesso mesmo fazem as duas edições do projeto A Trip to Brazil, coletânea organizada pelo produtor brasileiro Arnaldo de Souteiro, que já atingiu a marca de 15 mil cópias vendidas só do primeiro disco duplo da série. O segundo volume também tem tido ótima saída, o que deu a Christian Kellersmann a confiança para continuar com o projeto. "Eu e Arnaldo chegamos a pensar numa terceira edição do A Trip to Brazil centrada na música atual que se faz no Brasil. Mas acho que o melhor é recorrermos mais uma vez a algumas faixas de bossa nova, como garantia para o êxito do disco", conta.

Outro álbum do gênero lançado pela Universal na Alemanha foi The Fantastic Walter Wanderley – Boss of The Bossa Nova, coletânea do organista brasileiro que chegou às lojas há quatro anos. "De todos os discos lançados por nós, este é para mim o mais interessante. Conseguimos vender cinco mil cópias deste CD duplo. Antes deste lançamento, ninguém sabia quem era Walter Wanderley por aqui. Depois outras gravadoras vieram atrás de nós e começaram a relançar trabalhos antigos de Walter aqui na Europa."

O terceiro volume de A Trip to Brazil será lançado na Alemanha no próximo ano. Segundo Christian, o fato da música cubana ter estourado no mundo inteiro graças ao filme de Win Wenders abre com certeza um espaço muito interessante para a MPB entre os alemães. "O rock e o pop internacionais ficaram muito chatos. As pessoas estão procurando por coisas novas e a música brasileira tem boas chances", finaliza.