Boris Vian aparece na voz de Letícia Coura

Cantora homenageia em disco e show o cultuado e irreverente poeta e músico francês, que ainda permanece relativamente desconhecido no Brasil

Carlos Calado
13/03/2001
Cultuado em diversos países por sua irreverência brilhante, como poeta, romancista, dramaturgo, compositor e trompetista, o francês Boris Vian (1920-1959) permanece pouco conhecido no Brasil. Essa ignorância quase inexplicável pode começar a mudar a partir do lançamento do CD Letícia Coura Canta Boris Vian amostras de 30s (gravadora Dabliú) e do livro Boris Vian - Poemas e Canções (Nankin Editorial), que acontece amanhã, a partir das 19h, na área de convivência do Sesc Pompéia, em São Paulo.

A cantora e compositora Letícia Coura ainda vivia em Belo Horizonte, 12 anos atrás, quando conheceu Vian por meio de um presente: uma fita cassete com algumas de suas canções. Desde então, a mineira começou a coletar tudo o que pôde: romances, livros de poesia e gravações do francês. Não foi à toa que, ao gravar seu primeiro disco, Bam Bam Bam (Dabliú), em 1996, Letícia já havia incluído a canção Bate em Mim, versão que ela e Beatriz Azevedo fizeram para a debochada Fais-moi mal, Johnny, de Vian.

"Desde que gravei essa canção, fiquei com vontade de fazer um disco só com músicas dele", conta Letícia, que escreveu outras sete versões para o CD dedicado a Vian, além de cantar Je Bois (Eu Bebo), no original. "Pensei em fazer o disco com uma pequena orquestra, mas achei que seria complicado demais", diz a intérprete, que acabou optando pela combinação de voz e piano, a mesma que ela e Beba Zanettini (autor também dos arranjos do disco) já vinham exercitando em alguns saraus literários, nos últimos anos.

Cara-de-pau
Apesar de ter pouca prática no campo das versões, Letícia saiu-se bem. As letras que verteu para o português conseguem preservar a ironia e a malícia de Vian, acrescentando também algumas referências atuais. "Fiz as versões cantando. Por isso, elas saíram mais naturalmente. Até por já conhecer mais o Vian, fiquei tranqüila, porque ele também fazia muitas versões e era completamente cara-de-pau. Não era um purista, que tinha aquela necessidade de traduzir exatamente o original. Vian também tomava liberdades poéticas", justifica a intérprete.

Após a noite oficial de lançamento, que inclui uma palestra sobre a obra de Boris Vian ministrada pelo poeta paulista Ruy Proença (que selecionou os poemas e prefaciou o livro), Letícia inicia já no dia 15, no Café Teatro dos Sátyros, uma temporada do mesmo show, que se estende até 26 de abril sempre às quartas e quintas-feiras. Além do piano de Zanettini, ela terá a seu lado o percussionista Vítor Trindade e o ator Ivan Cabral, que vai interpretar poemas e dividir algumas "cenas" com a cantora.

"Queremos que o show tenha um clima de cabaré, com o piano e a direção teatral do Rodolfo Garcia Vázquez", explica Letícia, que vive há dez anos em São Paulo e atualmente também se apresenta como atriz, na peça Retábulo da Avareza, Luxúria e Morte, encenada pela Companhia Os Sátyros. "Tentamos evitar que a mescla das canções com os poemas não fique maçante. Se não o Boris Vian vai se revirar no túmulo", diz ela, com o mesmo humor que utilizou em suas versões.