Daniel Carlomagno estréia em CD solo

Cantor é mais um dos Artistas Reunidos da gravadora Trama

Marco Antonio Barbosa
08/06/2001
A eminência parda agora dá sua cara a tapa. Da turma que se auto-denominou Artistas Reunidos - João Marcelo Bôscoli, Pedro Mariano, Luciana Mello, Wilson Simoninha, Jairzinho de Oliveira e Max de Castro, todos eles aquartelados na gravadora Trama - só faltava mesmo Daniel Carlomagno para estrear em CD. Ou quase, visto que Daniel participou de praticamente todos os discos já lançados pelos AR, seja como compositor, arranjador ou músico. O rapaz saiu da sombra de vez lançando seu primeiro álbum, Daniel Carlomagno ouvir 30s, no qual dispensou qualquer "reunião de artistas" e se encarregou sozinho de instrumentos, composição e produção.

"A sensação é a mesma do domador que troca de lugar com o leão. O domador conduz a fera mas fica em segundo plano. Já o leão é o centro das atenções, porém apanha pra burro", brinca Daniel ao falar sobre como é estar, pela primeira vez, à frente de um álbum (e não apenas nos bastidores). "É uma experiência diferente", considera ele, agora falando sério. "Tem o lado um pouco desconfortável de não estar, digamos, 'protegido'. Mas ao mesmo tempo é a possibilidade de interpretar a minha própria criação, o que é muito gratificante."

Essa possibilidade foi explorada ao extremo por Daniel em sua estréia solo, visto que das 15 músicas do álbum, 12 são assinadas exclusivamente por ele (as exceções são uma parceria com o rapper Xis, em Precioso Instante, outra com Antônia Teixeira, em Dia Triste e uma versão para Caminhos Cruzados, de Tom Jobim e Newton Mendonça). Além disso, Daniel deu conta sozinho de toda a instrumentação (teclados, guitarras, baixo, violões e programações eletrônicas).

" Para mim, foi fundamental para que eu mantivesse íntegra a idéia de composição, já que trata-se de um disco autoral", fala Daniel. "Tudo foi meio que concebido de uma vez só: a canção é a espinha dorsal e os arranjos e execuções são extensões da mesma. Quanto a tocar todos os instrumentos sozinho, essa não foi uma nova experiência. Foi uma 'possibilidade' já testada e comprovada em vários outros projetos anteriores".

Daniel Carlomagno, o disco, configura-se como ponto de chegada (e não de partida) de uma estrada artística que já tem bastante quilometragem. Antes de reunir-se a Bôscoli, Simoninha & Cia, Daniel colaborou com Nelson Motta e Cesar Camargo Mariano; foi arranjador do programa Companhia da Música, da TV Cultura; e tocou na banda de Kiko Zambianchi. "Foi ouvindo John Lennon cantar, há muitos anos, que eu pensei: é isso que eu quero na vida", rememora Daniel. "Depois disso, encarei uma longa trajetória como músico, produtor, arranjador, compositor e técnico de som. Posso dizer que este CD é um velho sonho realizado com a demora necessária."

Sobre as músicas do disco, Daniel conta que elas foram pinçadas entre um repertório pessoal que vinha crescendo aos poucos. "São músicas compostas nos últimos cinco anos. O critério de escolha das faixas foi muito pessoal - eram as canções que eu mais gostava e mais me emocionavam", diz ele. Dsse "baú" de músicas saltaram baladas (Dia Triste, O Que Ficou, Sem Você), quase-sambas (Jardim Sem Flor, Mais Um Caso) e aproximações com a MPB mais tradicional (como em Um Querer). Mas a "cara" principal do disco é de música pop moderna, plena de influências black - Pedra Sobre Pedra, Precioso Instante e Inverno são alguns dos exemplos dessa sonoridade.

"Guardando as infinitas proporções, se artistas como Beatles, Prince, Sting, Lulu Santos, Cássia Eller e tantos outros que admiro estiverem inclusos nesse rótulo, eu não tenho nenhum problema em ser considerado pop. O que eu não acho certo é transformar tudo o que não tem rótulo ou qualidade em música pop. Isso é uma insensatez", afirma Daniel. O multi-homem também assume a influência black, com reservas: "É o trabalho de composição o que me norteia. Então acabo usando os estilos - não só a black music como o rock, hip hop, eletrônico, bossa, baião etc - como ferramentas de expressão. Dentro da música negra americana posso citar com admiração Stevie Wonder, que é um gênio", diz Daniel.

E como é fazer parte dessa "patota" que são os Artistas Reunidos? Tem um "lado bom" e um "lado ruim" da associação? "Foi uma forma de mostrarmos o nosso trabalho, numa época em que não havia espaço para a nossa música. Além disso, foi para mim uma grande oportunidade de experimentar e crescer artisticamente (afinal, tocamos juntos toda segunda feira durante um ano e seis meses) com gente muito talentosa ao meu lado", conta Daniel.

Mesmo com toda a proximidade (física e estilística) entre os jovens talentos da Trama, Daniel não tem se queimar com comparações. "Não há motivo para tal coisa acontecer. Pela convivência que temos, que já vai para sete, oito anos, nossos trabalhos possuem pontos em comum. Porém, fundamentalmente eles são muito diferentes", é o que acha o "velho estreante". E para quem insiste em ver na turma os messias de uma nova era da MPB, Daniel manda o recado: "Não tenho nenhuma pretensão quanto a mudar o pop brasileiro. Só espero que haja mais espaço para nós: gente nova com trabalho de qualidade, esperando apenas por oportunidade."