De Adoniran a Zé Keti, uma história da MPB

Um a um, os 25 discos da coleção A Música Brasileira Deste Século Por Seus Autores e Intérpretes

Rodrigo Faour
19/06/2000
Adoniran Barbosa – O ícone do samba paulista conta da dificuldade de estrear no rádio, lembra de sua fase de humorista (lembrando as vozes de vários dos seus personagens) e narra as histórias de suas criações antológicas, como Malvina, Conselho de Mulher (Pogréssio) e Trem das Onze.

Baden Powell – Embora não tenha muita voz, vale o registro de um dos principais violonistas e compositores da bossa nova cantando criações célebres como Canto de Ossanha e Berimbau, e as de ídolos como Pixinguinha, João Donato, João Gilberto, Nelson Cavaquinho e Johnny Alf.

Billy Blanco
– Especialista em sambas-crônicas, Billy conta seu convívio com a geração renovadora da MPB e canta suas jóias românticas como Esperança Perdida (parceria com Tom Jobim) e delícias como Viva Meu Samba.

Bucy Moreira – Sambista pouco conhecido do grande público, Bucy conviveu com os maiores ases da MPB da Era de Ouro (Chico Alves, Aracy de Almeida, Carmen Miranda, Linda Batista) e com a turma das raízes do samba, do bairro carioca do Estácio, como Bide e Benedito Lacerda. Ele canta sambas como Quem Pode, Pode (Quem Não Pode Se Sacode) e Não Põe a Mão.

Carlos Lyra – Histórias da bossa nova não faltam no CD. E também as de seus parceiros principais, Ronaldo Bôscoli e Vinicius de Moraes. Ótimo contador de casos, Lyra descreve, por exemplo, a advertência de João Gilberto ao lhe fornecer o telefone de Vinicius: "Cuidado com Vinicius porque ele só fala em diminutivos."

Cartola – Um dos fundadores da Mangueira, Cartola, o mito do samba carioca, conta que o cantor Mário Reis insistiu muito para ter um samba seu no repertório. Com medo, pediu 500 contos de réis pela composição. Mário ofereceu 300 e acabou levando, com a condição que seu nome aparecesse no selo do disco, mas quem a acabou gravando foi Chico Alves. Que Infeliz Sorte era o tal samba que abre seu CD, embalado por uma fala de Dona Zica.

Ciro Monteiro
– Elegância e simpatia em forma de samba. O ilustríssimo Ciro Monteiro, grande intérprete do samba da antiga, relembra neste CD vários clássicos do gênero, sempre munido de sua indefectível caixa de fósforos. Entre outras revelações, surpreende ao dizer que não agüentava mais se ouvir no rádio cantando Botões de Laranjeira (de Pedro Caetano), tamanho o sucesso do samba. Flamenguista doente, cansou de enviar camisas do time aos filhos dos amigos, o que lhe rendeu um samba-homenagem de Chico Buarque.

Copinha – O flautista e maestro Copinha lembra no CD do tempo em que fazia serenatas, "época em que São Paulo era um estado formidável para se viver. Poluição não havia". Diz que começou a tocar flauta, aos nove anos, começando sua carreira no cinema mudo. Desfila um repertório que vai de Abismo de Rosas (Canhoto) a Chega de Saudade (Tom & Vinicius).

Época de Ouro – Formado por Tony (violão), Ronaldo do Bandolim, Dino 7 Cordas, Jorge Filho (cavaquinho), Jorginho (Pandeiro) e pelo pai de Paulinho da Viola, César Faria (violão), o belo regional de choro executa números completos. Seus integrantes cantam mais do que falam. Melhor para os fãs do grupo. Odeon, Brejeiro e Carinhoso não poderiam faltar no roteiro.

Geraldo Filme – Bíblia do samba paulista, Geraldo comandou os festejos carnavalescos locais até a morte. Em relato curiosíssimo, no CD ele conta toda a história do samba paulista, da época em que o gênero era marginalizado àquela dos grandes desfiles. Espirituoso, chama carro alegórico de porta-viado. De brinde, canta desde o clássico Silêncio no Bexiga até menos manjadas como Lava-pés e Que Gente É Essa.

Jackson do Pandeiro – Irresistível estilizador do forró, rei da embolada e excelente intérprete que traz ritmo no sangue, Jackson do Pandeiro torna-se ainda mais interessante nesse disco em que, com narração ágil, conta como nasceram sucessos como Sebastiana, Forró em Limoeiro e A Mulher do Aníbal.

João de Barro (Braguinha) – O hoje nonagenário Braguinha desfila nada mais nada menos que 25 super sucessos, na maioria, dos anos 30 e 40. Ele conta sua trajetória desde a época do Bando dos Tangarás, explicando inclusive a razão de seu pseudônimo de João de Barro (na época, ser sambista sujava...) Aproveita para falar da assombrosa personalidade de uma de suas maiores intérpretes, Carmen Miranda. "Se passasse atrás da gente, a gente sabia que era ela."

João do Vale – Com seu tom sereno e voz grave, João do Vale conta seu convívio com a velha e a nova guarda da MPB (o programa foi gravado em 1974), de Marlene a Nara Leão, e canta os dramas do sertanejo, como Carcará, O canto da Ema, Uricuri e Minha História.

João Pacífico – Um dos papas da música sertaneja, falecido há dois anos, João Pacífico conta sua história e canta seus maiores sucessos, como Cabocla Tereza, Chico Mulato e Alpendre da Saudade.

Joubert de Carvalho – Diretamente da Era de Ouro da MPB, o pianista e compositor conta como suas músicas (Minha Casa, Pierrot, Ta-hi) foram parar nas mãos de Carmen Miranda, Chico Alves, Silvio Caldas e Orlando Silva.

Lupicínio Rodrigues
– O compositor conta porque ganhou o rótulo de criador da dor-de-cotovelo, e aproveita para classifica-la em dois tipos: a estadual (que é a dor da saudade) e a federal (aquela que não passa nunca). E tome fossa... Vingança, Quem Há de Dizer e, para animar, Se Acaso Você Chegasse.

Manezinho Araújo
– O intérprete de emboladas, sambas e baiões (que, em 1954, abandonou a carreira para virar pintor) conta sua história. Com divisão única e voz metálica, Manezinho dá um show em sucessos como Cuma É o Nome Dele, Como Tem Zé na Paraíba e músicas menos conhecidas, como a divertida De Jeito Nenhum.

Mário Lago – Lenda viva do meio artístico brasileiro, o ator, compositor e ativista político Mário Lago conta com maestria as histórias por trás da maioria de suas músicas, como Aurora, Fracasso e Nada Além. Diz ainda que é péssimo em matemática. "Não aprendi a somar – a prova é que sou pobre até hoje – e muito menos multiplicar".

Nora Ney – A única mulher enfocada na coleção até agora, Nora esbanja calor, cantando seus maiores sucessos com voz limpíssima, em 1973, como as fossas Ninguém Me Ama e Preconceito e sambas como Vai, Vai Mesmo e É Tão Gostoso, Seu Moço. Em seu depoimento, recorda suas excursões internacionais e reconhece seu lado de precursora das cantoras modernas, que não necessitavam de grande empostação vocal.

Paraguassu – O cantor e compositor paulista Paraguassu é do tempo da gravação mecânica, ou seja, dos anos 10 e 20, época das modinhas e serenatas. Com uma memória incrível, revelou-se ótimo contador de histórias, como a do impulso suicida que provocou em meia dúzia de pessoas quando gravou o sucesso Máguas (com "u" mesmo). Um dos melhores títulos da coleção.

Roberto Martins
– O sambista da antiga conta causos engraçados da época da boêmia carioca dos anos 30 a 50, fala da convivência com bambas célebres da MPB e canta clássicos como Meu Consolo É Você, Favela, Beija-me, Renúncia (essa última, cavalo de batalha de Nelson Gonçalves), além de marchinhas como Pedreiro Waldemar e O Cordão dos Puxa-Sacos.

Roberto Paiva – Sambista da antiga, Roberto Paiva conta que lançou Nelson Cavaquinho e Geraldo Pereira, e recorda sucessos como o carnavalesco O Trem Atrasou e a brejeira O Menino de Braçanã, de Luiz Vieira.

Roberto Silva
– Clássico sambista da antiga, Roberto Silva canta o samba tradicional como ninguém, como se pode ouvir em Mandei Fazer um Patuá, Pisei num Despacho e Escurinho. Ele elogia o amigo Geraldo Pereira com uma gíria da época: "Era pedra 90!"

Tonico & Tinoco – A dupla caipira autêntica que marcou época conta seus causos, desde antes de ingressar na carreira artística, quando ainda meninos, cantavam em troca de alguns tostões. No repertório, canções da infância da dupla, como Burro Saudoso e Cana Verde, e clássicos do gênero, como Tristeza do Jeca.

Zé Kéti – Um de nossos sambistas mais originais, quando gravou este CD ainda estava com ótima voz, e arrasa em números como Amor de Carnaval e Desquite Lá no Morro. Revela no depoimento que sua música mais popular foi a marcha-rancho Máscara Negra, que estourou na voz de Dalva de Oliveira, em 1967.