De musa da Bossa Nova a inventora da MPB
Nara Leão ganha biografia de Sérgio Cabral, resgatando a influência da cantora em nossa música
Marco Antonio Barbosa
02/08/2001
Entre as várias imagens que a cantora Nara Leão deixou de si mesma para a posteridade, pode-se citar a de musa da Bossa Nova, a da cantora de voz suave e afável, a artista combativa que tomou parte no lendário show Opinião, em 1965. Essas facetas estarão todas resumidas no livro Nara Leão: Uma Biografia (Editora Lumiar), que o jornalista Sérgio Cabral lança oficialmente na próxima segunda (dia 6), no centro cultural Casa de Rui Barbosa (RJ). Junto a essas "várias Naras", o volume escrito por Sérgio também põe a cantora, falecida em 1989, sob um enfoque que poucos - ou ninguém - já haviam cogitado: o de literal inventora da MPB.
"Foi redigindo o livro que eu me dei conta de que Nara, em seu primeiro LP - Nara , de 1964 - foi quem criou o que hoje chamamos de MPB. Antes de reunir toda a história dela, nem eu tinha percebido isso", afirma Sérgio Cabral, nome que, do alto de seus 45 anos de carreira, dispensa apresentações no front do jornalismo musical. E ele mesmo explica o porque de sua "tese": "O fato é que com seu primeiro disco, Nara rompeu com a Bossa Nova - sendo inclusive muito atacada, diziam que ela havia 'passado para o outro lado', leia-se o lado de uma música mais popular, quando resolveu gravar compositores como Zé Keti e Nelson Cavaquinho, além de ter aberto seus ouvidos para as influências nordestinas. O que ela estava fazendo, na verdade, era inaugurar uma outra estética para a música brasileira."
O veterano jornalista continua: "Ela incorporou o que havia de bom na bossa nova e juntou com Nordeste, samba, Baden Powell. Deu um tratamento moderno, pós-bossa, sem o formalismo e o purismo daquele movimento. O fato é que a geração de compositores surgidos nos anos 60 - Caetano, Gil, Chico, ou seja, sinônimos eternos de MPB - já estava compondo as canções que cabiam no repertório de Nara. O que se entende por música brasileira moderna foi inaugurado com aquele primeiro LP dela."
O fato é que Nara Leão nunca se esgotou na figura mítica da "Nara Joelhão", de sainha curta e violão, cantando eternamente O Barquinho e outra platitudes. "Gosto de pensar que estou escrevendo a história da música brasileira através de seus personagens. Então, para falar da música dos anos 60 e 70, escolhi a Nara, que foi uma legítima protagonista de seu tempo", explica Sérgio Cabral. "Ela era muito antenada com tudo o que acontecia no cenário musical e serve muito bem de fio condutor para a história daqueles anos."
Testemunha da gênese da Bossa Nova (ficaram famosas as tardes em seu apartamento em Copacabana, nas quais gente como Carlos Lyra, Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli desfiavam futuros clássicos do gênero), Nara já debutou profissionalmente distanciando-se do movimento, e seguiu pelos anos 60 "pregando peças" em quem achava que podia rotulá-la. "Cada álbum novo dela era uma surpresa. Mas Nara nunca se rendia aos modismos. Ou ela os antecipava, ou fazia algo completamente inesperado, resgatava algum compositor esquecido ou um ritmo fora de moda. Tinha muita personalidade", relembra Sérgio.
"Ela estava sempre à frente de seu tempo, e não se rendia aos patrulhamentos. Foi por isso que ela conseguiu lançar tantos compositores novos, como o próprio Chico Buarque e o Sidney Miller", continua Cabral. Nara preconizou a fase do cancioneiro de protesto, viveu a época dos festivais, trafegou pela Jovem Guarda, viu o desbunde tropicalista (participou do seminal álbum Tropicália ou Panis et Circensis , em 1968) e - mesmo já sem tanta exposição pública - manteve-se ativa até morrer.
Para compôr Nara Leão: Uma Biografia, Sérgio Cabral entrevistou várias personalidades presentes em fases distintas da vida de Nara: Chico Buarque, Maria Bethânia (que a substituiu na segunda montagem do show Opinião, em 1965), Menescal, Lyra, o cineasta Carlos Diegues (ex-marido da cantora) e outros. "A maioria dos depoimentos foi feita exclusivamente para o livro", conta Cabral, "mas alguns foram coletados do meu arquivo. Também me baseei em minhas memórias pessoais. Conheci Nara em 1961 e fui muito amigo dela."
Sérgio Cabral, um notório "biografeiro" da MPB (já editou livros sobre Elizeth Cardoso, Pixinguinha, Tom Jobim, Ary Barroso e Almirante), espera que seu livro sobre Nara Leão ajude na reavaliação da importância da cantora para a MPB. "É um mistério que ela não tenha sido reconhecida como uma das figuras mais influentes de nossa música. Nós esquecemos com facilidade das pessoas. Mas creio que, pelo menos inconscientemente, a revolução que ela iniciou foi percebida pelas pessoas que a cercavam", diz o jornalista.
"Foi redigindo o livro que eu me dei conta de que Nara, em seu primeiro LP - Nara , de 1964 - foi quem criou o que hoje chamamos de MPB. Antes de reunir toda a história dela, nem eu tinha percebido isso", afirma Sérgio Cabral, nome que, do alto de seus 45 anos de carreira, dispensa apresentações no front do jornalismo musical. E ele mesmo explica o porque de sua "tese": "O fato é que com seu primeiro disco, Nara rompeu com a Bossa Nova - sendo inclusive muito atacada, diziam que ela havia 'passado para o outro lado', leia-se o lado de uma música mais popular, quando resolveu gravar compositores como Zé Keti e Nelson Cavaquinho, além de ter aberto seus ouvidos para as influências nordestinas. O que ela estava fazendo, na verdade, era inaugurar uma outra estética para a música brasileira."
O veterano jornalista continua: "Ela incorporou o que havia de bom na bossa nova e juntou com Nordeste, samba, Baden Powell. Deu um tratamento moderno, pós-bossa, sem o formalismo e o purismo daquele movimento. O fato é que a geração de compositores surgidos nos anos 60 - Caetano, Gil, Chico, ou seja, sinônimos eternos de MPB - já estava compondo as canções que cabiam no repertório de Nara. O que se entende por música brasileira moderna foi inaugurado com aquele primeiro LP dela."
O fato é que Nara Leão nunca se esgotou na figura mítica da "Nara Joelhão", de sainha curta e violão, cantando eternamente O Barquinho e outra platitudes. "Gosto de pensar que estou escrevendo a história da música brasileira através de seus personagens. Então, para falar da música dos anos 60 e 70, escolhi a Nara, que foi uma legítima protagonista de seu tempo", explica Sérgio Cabral. "Ela era muito antenada com tudo o que acontecia no cenário musical e serve muito bem de fio condutor para a história daqueles anos."
Testemunha da gênese da Bossa Nova (ficaram famosas as tardes em seu apartamento em Copacabana, nas quais gente como Carlos Lyra, Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli desfiavam futuros clássicos do gênero), Nara já debutou profissionalmente distanciando-se do movimento, e seguiu pelos anos 60 "pregando peças" em quem achava que podia rotulá-la. "Cada álbum novo dela era uma surpresa. Mas Nara nunca se rendia aos modismos. Ou ela os antecipava, ou fazia algo completamente inesperado, resgatava algum compositor esquecido ou um ritmo fora de moda. Tinha muita personalidade", relembra Sérgio.
"Ela estava sempre à frente de seu tempo, e não se rendia aos patrulhamentos. Foi por isso que ela conseguiu lançar tantos compositores novos, como o próprio Chico Buarque e o Sidney Miller", continua Cabral. Nara preconizou a fase do cancioneiro de protesto, viveu a época dos festivais, trafegou pela Jovem Guarda, viu o desbunde tropicalista (participou do seminal álbum Tropicália ou Panis et Circensis , em 1968) e - mesmo já sem tanta exposição pública - manteve-se ativa até morrer.
Para compôr Nara Leão: Uma Biografia, Sérgio Cabral entrevistou várias personalidades presentes em fases distintas da vida de Nara: Chico Buarque, Maria Bethânia (que a substituiu na segunda montagem do show Opinião, em 1965), Menescal, Lyra, o cineasta Carlos Diegues (ex-marido da cantora) e outros. "A maioria dos depoimentos foi feita exclusivamente para o livro", conta Cabral, "mas alguns foram coletados do meu arquivo. Também me baseei em minhas memórias pessoais. Conheci Nara em 1961 e fui muito amigo dela."
Sérgio Cabral, um notório "biografeiro" da MPB (já editou livros sobre Elizeth Cardoso, Pixinguinha, Tom Jobim, Ary Barroso e Almirante), espera que seu livro sobre Nara Leão ajude na reavaliação da importância da cantora para a MPB. "É um mistério que ela não tenha sido reconhecida como uma das figuras mais influentes de nossa música. Nós esquecemos com facilidade das pessoas. Mas creio que, pelo menos inconscientemente, a revolução que ela iniciou foi percebida pelas pessoas que a cercavam", diz o jornalista.