Dez dicas para uma boa produção independente

Henrique Cazes escreve aos músicos sobre o que fazer - e o que não fazer - na hora de gravar por conta própria

Henrique Cazes
21/11/2002
Muita gente me procura para consultar sobre os caminhos que levam ao final feliz de uma produção independente. São perguntas sobre estúdio, editoras, distribuição, etc que eu procuro esclarecer na medida da minha experiência. Reunindo as dúvidas mais frequentes, preparei dez dicas (poderiam ser vinte ou trinta) para ajudar quem se aventura a bancar seu próprio trabalho.

1-Filosofia e planejamento
Para gastar o mínimo e ter o máximo de resultado é muito importante ter em mente o jeitão do disco que se vai fazer. Um planejamento detalhado evita por exemplo que se grave algo que depois será dispensado ou que tenha que se refazer uma base porque ficou fora do clima. O que não adianta também é delirar. Começar gastando muito e ficar no meio do caminho. O melhor disco é aquele que se consegue fazer até o final.

2-Um produtor ou diretor de estúdio
Principalmente quando as pessoas envolvidas no projeto não experiência em estúdio, é melhor chamar um produtor mesmo que seja apenas para fazer a direção da gravação. Pode parecer estranho mas tendo-se um diretor de estúdio competente gasta-se menos tempo e ganha-se em qualidade.

3-Escolha do repertório
É um dos pontos que o pessoal novo mais quebra a cara, principalmente os que não são compositores. Um disco independente deve ter os direitos autorais negociados antes de começar a gravação por dois motivos. O primeiro é você saber quanto vai ter que pagar para as editoras na hora de lançar o produto. O segundo é que se o preço for muito alto você tem a opção de gravar outra música, para fugir do apetite de alguns editores. Vale lembrar que o repertório em domínio público no Brasil já é vasto e de altíssima qualidade. Autores como Nazareth, Chiquinha Gonzaga e Anacleto de Medeiros são liberados. Quem pensa em gravar Tom Jobim pode ir anunciando o carro pra vender.

4-Escolha do estúdio
Existe uma falsa impressão de que como existem muitos estúdios hoje em dia, as opções para gravar bem também aumentaram. Não é bem assim. A maior parte dos estúdios baratinhos são ruins e só servem para uma gravação que não envolva nada ou quase nada de som acústico. Faltam microfones de qualidade, pré-amplificadores e muitas vezes é usado um sistema de gravação não profissional. Entre gravar em ADAT (multicanal digital) ou em ProTools (gravação direta em HD) a segunda opção é melhor. Quem vai gravar samba deve estar preparado para gastar mais pois até hoje não se conhece um disco de samba gravado em digital que alcance o resultado dos gravados em sistema analógico. Para quem vai fazer um disco acústico é fundamental que o estúdio tenha uma sala de gravação com acústica razoável. Isso vai fazer o trabalho andar mais rápido. Tente negociar, pagar antecipado para ter desconto, mandar de véspera o plano de gravação para poupar tempo de arrumação do estúdio, enfim faça o seu investimento valer em qualidade.

5-Ensaios com o produtor
Se você tem a chance de ensaiar na presença do diretor de estúdio será ótimo. A partir do ensaio ele fará um plano eficaz para a gravação. Em caso contrário procure chamar gente experiente com gravações no estilo a ser feito e sobretudo lembre-se do conselho que um dia o veterano Chiquinho do Acordeon me deu: “Para a gravação chama os melhores. Não chama seus amigos porque se eles tocarem mal você não vai poder nem apagar.”

6- Resolvendo na hora
Tente resolver o máximo das questões de timbre na hora em que você está gravando senão sua mixagem vai ser uma obra de igreja. Nunca acredite nessa história de que “na mixagem a gente conserta”.

7-Média de monitores
Ouça sua mixagem em casa muitas vezes e em outros lugares que você esteja acostumado a ouvir música. A média de resultados pode te ajudar a decidir se a mixagem está OK. Se você tem boas caixas em casa, não se acanhe de levá-las para o estúdio.

8-Capa
Normalmente quando o cara chega nesta etapa o dinheiro já acabou ou está acabando. Isso ajuda a explicar a grande quantidade de capas medonhas dos discos independentes. Não adianta caprichar no som e fazer uma capa horrível. Chame um designer gráfico, faça fotos com um profissional. O investimento vale a pena.

9-Venda direta, distribuição ou licença
Existem basicamente três opções para um CD independente. Se você tem um universo menor de alcance, a venda direta é a melhor opção. A diferença entre distribuir e licenciar é que no primeiro caso você fabrica e paga o direito autoral antecipado, a empresa vende o CD e te paga cerca de R$ 6,00 por disco vendido. No segundo caso é a empresa para a qual você licencia que paga a fabricação, os direitos autorais e te pagará um percentual em torno de 15%, sobre um preço de capa de aproximadamente R$ 10,00. Não coloquei aquí a hipótese de venda dos fonogramas para uma empresa porque está cada vez mais raro acontecer e quase sempre não é um bom negócio.

10-Assessoria de imprensa
Vocês já devem ter reparado que um disco lançado com uma boa assessoria de imprensa, coloca realmente o artista no mercado. Se você já está encalacrado, já gastou mais do que planejou – como em quase toda produção – mesmo assim não abra mão de uma boa assessoria. Peça uma grana para aquela tia rica que te adora e vá fundo.

Espero que as dicas apresentadas ajudem a encorajar mais e mais artistas a pegarem o caminho da independência. Pela minha experiência posso afirmar após dezenas de produções que não fiquei nem mais rico nem mais pobre, só muito mais feliz.