Dos palcos para o rádio

Declínio da música ao vivo nos bares acabou levando Sabá a virar apresentador de um programa musical, atividade que exerce até hoje, paralelamente às bandas

Carlos Calado
20/02/2001
Com a desativação do Som Três e o crescente fechamento das casas noturnas para a música ao vivo, Sabá viu-se obrigado a alterar a trajetória de sua carreira, em 1971. Virou integrante de um tradicional grupo vocal gaúcho, o Conjunto Farroupilha. "Passei quase três anos vestindo bombacha. O pessoal me chamava de paraúcho, paraense com gaúcho", diverte-se o contrabaixista, que ficou no grupo até ser convocado a acompanhar o pianista e cantor Dick Farney, na boate Flag, onde tocaram por cerca de seis anos.

Já no final dos anos 70, ao participar de um programa da rádio paulistana Jovem Pan, aceitou um convite que veio a transformá-lo em radialista. Começou a fazer comentários musicais durante o Show da Manhã, apresentado por Randal Juliano. Depois de quase uma década nessa emissora, já passou pelas rádios USP e Gazeta até chegar à Trianon, na qual trabalha há oito anos. Atualmente produz e apresenta o Clube da Música, que vai ao ar aos sábados, de 11h às 12h, com reprise aos domingos, às 14h.

"Escolho e comento os discos que eu acho que devo. Como eu gosto de tocar compositores como Cole Porter, Gershwin e Tom Jobim, não é um programa de grande público", reconhece. Mesmo que essa atividade tenha se tornado seu ganha-pão, Sabá jamais abandonou o contrabaixo. Ainda se apresenta, eventualmente, com o trio ou o quarteto que levam seu nome, em eventos fechados. "O rádio acabou se tornando uma paixão para mim. O bom é que ele não interfere na minha atividade musical", diz o contrabaixista, que se prepara para uma temporada de shows em Lisboa, neste ano.

Aulas com Johnny Alf
Filho de uma pianista e um violinista, que se conheceram animando sessões de cinema mudo em Belém, Sabá fez sua estréia profissional aos 16 anos, na Rádio Clube do Pará. Apresentou-se ao lado do conjunto vocal Os Gaviões do Samba, com os quais tocou violão até sua mudança para São Paulo, em 1952. Desse grupo também fazia parte Luiz Chaves (o único de seus oito irmãos que foi registrado com o sobrenome da mãe), que até hoje é o contrabaixista do Zimbo Trio.

Em São Paulo, Sabá conseguiu seu primeiro emprego no conjunto do acordeonista Bruno Zwarg (pai do contrabaixista e arranjador Itiberê Zwarg). No final de 1953, passou a acompanhar Johnny Alf na Baiúca, que ainda funcionava na rua Major Sertório, próxima ao João Sebastião Bar e ao Mackenzie, na região central da capital paulista. "Graças à paciência do Johnny Alf, consegui ficar ali quase três anos. Tudo que eu sei hoje, em termos de harmonia, aprendi praticamente com ele. Quando meti a mão no instrumento, junto com o piano do Johnny, percebi que não sabia nada de contrabaixo", reconhece Sabá.

O duo só não seguiu adiante porque a Baiúca foi fechada pelas autoridades sanitárias. Reabriu em 1956, na praça Roosevelt, centro da agitação musical paulistana na época, com casas noturnas e bares badalados, como o Stardust, o Farney’s e o Cave. Foi na nova Baiúca que Sabá presenciou o incidente que acabou gerando o trio mais duradouro da música brasileira. Por causa de uma briga com o proprietário da casa, o pianista Moacyr Peixoto deixou os músicos de seu trio - o baterista Rubinho Barsotti e o baixista Luiz Chaves - a ver navios. Rubinho não pensou duas vezes: foi buscar o pianista Amilton Godoy para substituí-lo. "No dia seguinte, quando os três tocaram juntos pela primeira vez, o que soou foi exatamente o que o Zimbo Trio faz até hoje", relembra Sabá.

Revendo sua carreira, o fundador do lendário Jongo Trio diz que sua única frustração foi ver tantos colegas desistirem da música, especialmente da bossa nova, por falta de oportunidades de trabalho. "Hoje não há uma casa noturna em que você pode ir para ouvir um trio ou um quarteto, que toque um repertório na base de Tom Jobim, Carlos Lyra ou João Donato. Parece que o sucesso da bossa nova foi tanto que decidiram cortar de vez essa música", lamenta.

Leia ainda: