Em busca da música de qualidade para todos
Com poucos discos gravados nos últimos 20 anos, Laércio de Freitas deu prioridade aos choros e à música orquestral, que considera injustamente elitizada no Brasil
Carlos Calado
08/01/2001
Só no final dos anos 70, já radicado definitivamente em São Paulo, é que Laércio de Freitas pôde gravar o seu segundo álbum. Seus choros originais chamaram a atenção do crítico Armando Aflalo, durante os saraus que a escola de música Play promovia aos sábados. A idéia de gravar um disco foi levada pelo jornalista a Aluizio Falcão, da gravadora Eldorado, que produziu São Paulo no Balanço do Choro - Ao Nosso Amigo Esmê, lançado em 1980. Nesse trabalho, além de exibir nove de seus choros inéditos, o pianista teve a chance de homenagear seu maior mentor musical: Esmeraldino Salles, responsável pelo cavaquinho do regional da Rádio e TV Tupi. Laércio veio a conhecê-lo por volta dos nove anos de idade, quando a mãe o levou para assistir ao programa Gurilândia. Em pouco tempo, o garoto adotou Esmeraldino como seu orientador musical.
"O Esmê era o meu guru. Praticamente, foi o meu mentor. Ele não tinha como passar informações de maneira muito técnica, porque era um músico prático, mas as dicas que ele dava eu procurava associar com o que eu aprendia nas aulas", conta Laércio, que ingressou aos sete anos de idade no respeitado Conservatório Musical Carlos Gomes, em Campinas, onde estudou durante 11 anos. Foi graças a Esmeraldino também que Laércio ganhou seu primeiro cachê com a música: aos 16 anos, tocou contrabaixo no Bar e Restaurante Interlagos, em São Paulo, num quinteto do qual fazia parte o acordeonista Caçulinha, hoje funcionário da TV Globo.
Filho de um bancário e bandolinista amador, Laércio recebeu da mãe, que era violinista, as primeiras lições musicais. Começou a estudar solfejo ao mesmo tempo em que foi alfabetizado. "Eu tinha três cadernos: num deles, treinava o abecedário maiúsculo; no outro, o abecedário minúsculo; no terceiro, eu escrevia as notas musicais", recorda. Além de ouvir rádio em casa, o garoto tinha acesso à vitrola de um centro espírita, que freqüentava com o pai. Ali ouviu pela primeira vez um disco de 78 rotações com a valsa The Belle of the Ball, do compositor e arranjador norte-americano Leroy Holmes (1913-1986), que o impressionou bastante. Coincidência ou não, a primeira composição de Laércio é justamente uma valsa, que não chegou a receber título, escrita por ele com cerca de 10 anos de idade.
"Interessei-me pela coisa orquestral desde muito cedo. Aos nove anos, eu já sentia a possibilidade de reproduzir no piano as sonoridades da orquestra", afirma o maestro, que tinha entre suas orquestras favoritas, naquela época, as dos britânicos George Melachrino (1909-1965) e David Rose (morto em 1990). "Eles compunham e escreviam para o cinema norte-americano, que ajudou a divulgar esse gênero de música orquestral conhecida então como neoclássica", situa o maestro, consciente desde cedo de que precisaria se preparar muito para poder trabalhar na área da música sinfônica. Além de aprimorar a técnica ao piano, Laércio também estudou contrabaixo, flauta, trompete, trombone e saxofone. "Passei por todos eles, praticamente, para ampliar o meu ferramental", justifica.
Gravações esparsas
Sempre bem-humorado, Laércio ironiza o fato de ter tido poucas chances até hoje para registrar suas composições próprias, ou mesmo seu trabalho como solista. "De dez em dez anos, eu gravo alguma coisa", diz, lembrando que depois de seu álbum de choros pela Eldorado (que ainda permanece, absurdamente, inédito em CD), gravou apenas um álbum de piano solo (Terna Saudade, lançado pelo selo L’Art, em 1988), além de dividir um CD com o saxofonista Carlos Malta, gravado pelo selo alternativo Tom Brasil, já em meados da década passada.
Cada vez mais envolvido com o meio sinfônico, o maestro acredita que um público maior não acompanha o trabalho das orquestras brasileiras por pura falta de condição econômica. "É preciso estreitar mais a relação entre palco e platéia. A sala de concerto não pode ser franqueada apenas a pessoas de alta prosápia. Isso não vai levar a lugar nenhum. Quem gosta mesmo de música é o povão. As pessoas comuns só não freqüentam as salas de concertos por causa dos preços dos ingressos", afirma. O fato de ter sido obrigado a trabalhar em outras áreas musicais para ganhar a vida não o desagrada. "Todos os segmentos com os quais eu pude trabalhar foram proveitosos. Não condeno quem não leva a música a sério. Lamento porque é um a menos para nos ajudar a remar este barco", reflete.
"Estou chegando aos 60 anos, mas ainda quero fazer muita coisa", afirma o maestro e compositor, revelando que seu próximo projeto, já em fase de pré-produção, é um disco de piano solo com repertório calcado em composições de Milton Nascimento, Dori Caymmi, Cartola e Nelson Cavaquinho. "Vou gravar primeiro. Depois verei quem se interessa em lançar", avisa. Ao mesmo tempo, pretende finalizar duas peças para orquestra sinfônica, que já está escrevendo: Litorânea, que tem como tema o litoral do estado de São Paulo, e Cantareira, inspirada nas belezas naturais da serra paulista. "Quero poder continuar fazendo música de qualidade, de uma forma sincera e honesta, enquanto o departamento lá de cima me permitir", conclui o maestro. Mais informações sobre Laércio de Freitas no site www.laerciodefreitas.com.br
"O Esmê era o meu guru. Praticamente, foi o meu mentor. Ele não tinha como passar informações de maneira muito técnica, porque era um músico prático, mas as dicas que ele dava eu procurava associar com o que eu aprendia nas aulas", conta Laércio, que ingressou aos sete anos de idade no respeitado Conservatório Musical Carlos Gomes, em Campinas, onde estudou durante 11 anos. Foi graças a Esmeraldino também que Laércio ganhou seu primeiro cachê com a música: aos 16 anos, tocou contrabaixo no Bar e Restaurante Interlagos, em São Paulo, num quinteto do qual fazia parte o acordeonista Caçulinha, hoje funcionário da TV Globo.
Filho de um bancário e bandolinista amador, Laércio recebeu da mãe, que era violinista, as primeiras lições musicais. Começou a estudar solfejo ao mesmo tempo em que foi alfabetizado. "Eu tinha três cadernos: num deles, treinava o abecedário maiúsculo; no outro, o abecedário minúsculo; no terceiro, eu escrevia as notas musicais", recorda. Além de ouvir rádio em casa, o garoto tinha acesso à vitrola de um centro espírita, que freqüentava com o pai. Ali ouviu pela primeira vez um disco de 78 rotações com a valsa The Belle of the Ball, do compositor e arranjador norte-americano Leroy Holmes (1913-1986), que o impressionou bastante. Coincidência ou não, a primeira composição de Laércio é justamente uma valsa, que não chegou a receber título, escrita por ele com cerca de 10 anos de idade.
"Interessei-me pela coisa orquestral desde muito cedo. Aos nove anos, eu já sentia a possibilidade de reproduzir no piano as sonoridades da orquestra", afirma o maestro, que tinha entre suas orquestras favoritas, naquela época, as dos britânicos George Melachrino (1909-1965) e David Rose (morto em 1990). "Eles compunham e escreviam para o cinema norte-americano, que ajudou a divulgar esse gênero de música orquestral conhecida então como neoclássica", situa o maestro, consciente desde cedo de que precisaria se preparar muito para poder trabalhar na área da música sinfônica. Além de aprimorar a técnica ao piano, Laércio também estudou contrabaixo, flauta, trompete, trombone e saxofone. "Passei por todos eles, praticamente, para ampliar o meu ferramental", justifica.
Gravações esparsas
Sempre bem-humorado, Laércio ironiza o fato de ter tido poucas chances até hoje para registrar suas composições próprias, ou mesmo seu trabalho como solista. "De dez em dez anos, eu gravo alguma coisa", diz, lembrando que depois de seu álbum de choros pela Eldorado (que ainda permanece, absurdamente, inédito em CD), gravou apenas um álbum de piano solo (Terna Saudade, lançado pelo selo L’Art, em 1988), além de dividir um CD com o saxofonista Carlos Malta, gravado pelo selo alternativo Tom Brasil, já em meados da década passada.
Cada vez mais envolvido com o meio sinfônico, o maestro acredita que um público maior não acompanha o trabalho das orquestras brasileiras por pura falta de condição econômica. "É preciso estreitar mais a relação entre palco e platéia. A sala de concerto não pode ser franqueada apenas a pessoas de alta prosápia. Isso não vai levar a lugar nenhum. Quem gosta mesmo de música é o povão. As pessoas comuns só não freqüentam as salas de concertos por causa dos preços dos ingressos", afirma. O fato de ter sido obrigado a trabalhar em outras áreas musicais para ganhar a vida não o desagrada. "Todos os segmentos com os quais eu pude trabalhar foram proveitosos. Não condeno quem não leva a música a sério. Lamento porque é um a menos para nos ajudar a remar este barco", reflete.
"Estou chegando aos 60 anos, mas ainda quero fazer muita coisa", afirma o maestro e compositor, revelando que seu próximo projeto, já em fase de pré-produção, é um disco de piano solo com repertório calcado em composições de Milton Nascimento, Dori Caymmi, Cartola e Nelson Cavaquinho. "Vou gravar primeiro. Depois verei quem se interessa em lançar", avisa. Ao mesmo tempo, pretende finalizar duas peças para orquestra sinfônica, que já está escrevendo: Litorânea, que tem como tema o litoral do estado de São Paulo, e Cantareira, inspirada nas belezas naturais da serra paulista. "Quero poder continuar fazendo música de qualidade, de uma forma sincera e honesta, enquanto o departamento lá de cima me permitir", conclui o maestro. Mais informações sobre Laércio de Freitas no site www.laerciodefreitas.com.br
Leia ainda:
|