Família divulga informações sobre saúde de Herbert Vianna

Em texto para a imprensa, Hermano Vianna, irmão do paralama, diz que ele se encontra num estado de confusão mental e talvez não saiba da morte da mulher

CliqueMusic
30/04/2001
Eis, na íntegra, a nota divulgada esta tarde por Hermano Vianna, com esclarecimentos sobre o estado de saúde de Herbert Vianna. O cantor e compositor, líder do grupo Paralamas do Sucesso, se recupera do acidente de ultraleve ocorrido no dia 4 de fevereiro em Mangaratiba (RJ), no qual morreu sua mulher, Lucy Needham.

"Muitos amigos, muitos admiradores do trabalho dos Paralamas e muitos jornalistas têm nos pedido informações sobre o estado de saúde do Herbert. Reconhecemos nossa incapacidade de responder a todos e pedimos aqui desculpas pelo nosso silêncio. Todos nós estamos nos dedicando exclusivamente à recuperação do Herbert e ao cuidado das crianças, e não nos sobra tempo mais para nada, até para atender o telefone. A cada dia temos que aprender rapidamente a lidar com novos aspectos de uma realidade dura e muito complexa. Mesmo agora, enquanto escrevo esta mensagem para todos, me sinto culpado por não estar do lado do Herbert ou brincando/ estudando com um de seus filhos. Mas sei que é necessário dizer para todos o que está acontecendo para evitar boatos e notícias falsas (a última matéria, do [jornal] Globo, além de um grande número informações erradas, ainda nos fez o desfavor de publicar o endereço da casa do Herbert), mas sobretudo para retribuir o carinho com que estamos sendo tratados desde que essa tragédia aconteceu nas nossas vidas.

Gostaria que essas minhas palavras não fossem tratadas como uma "nota oficial" da família. É apenas um depoimento pessoal, escrito quase sempre na primeira pessoa, uma tentativa de responder à maior parte das perguntas que nos têm sido feitas. É a maneira como eu, Hermano, irmão do Herbert, entendo tudo que está acontecendo e devo deixar claro, logo de início, que estou longe de entender tudo, ou mesmo uma parte pequena do que aconteceu, por mais longas que tenham sido minhas conversas com os médicos (peço desculpas também pelos erros de linguagem médica que vou inevitavelmente cometer). Vou escrever tudo no esquema perguntas e respostas para facilitar escrita e leitura:

Como está o estado de saúde do Herbert?
Além de um grande número de queimaduras e pequenos cortes (que só agora estão cicatrizando totalmente), além da fratura no pulso esquerdo (que deixou a mão ainda enfraquecida), o Herbert tem dois problemas principais: a lesão na medula e um conjunto de lesões no cérebro. Todos os médicos que participaram do seu tratamento afirmam que não se pode prever quais serão as conseqüências dessas lesões. Tudo é possível. É mais ou menos estabelecido hoje, que só se pode ter certeza sobre as seqüelas desses tipos de lesão dois anos depois do acidente. Até lá, muitas surpresas podem acontecer.

No caso específico do Herbert, não podemos separar hoje as conseqüências da lesão cerebral e da lesão medular, apesar de as duas atuarem de forma aparentemente independente. Como o Herbert está com afasia, um estado de confusão mental impressionante, apesar de ter voz e fala preservadas, ele não consegue nos dizer o que está sentindo.

A memória de fatos que aconteceram depois do acidente está bastante comprometida: Herbert parece viver num misterioso presente, sem se lembrar do que aconteceu há poucos minutos. Por isso, quanto mais calma no ambiente da casa, melhor. Estamos tentando ter uma vida normal, apesar de tudo, principalmente para evitar mais situações difíceis para as crianças. Precisamos sobretudo de tranqüilidade.

Esse estado de confusão mental gerado pelo trauma cerebral dificulta em muito o tratamento da lesão medular e a reabilitação. Herbert está saindo agora de seu choque medular. Mas como já disse, é incapaz de nos dizer se tem alguma sensibilidade abaixo da lesão. Ele já apresenta alguns sinais animadores como contração em determinados músculos das pernas quando submetido a estimulação elétrica, mas não sabemos se isso é voluntário ou apenas reflexo. Estou confiante de que alguma melhora vai acontecer, mas essa é uma questão de fé e de esperança, não de prognóstico médico.

Que tratamento está sendo feito?
Herbert está recebendo tratamento neurológico e toma vários remédios que estimulam sua memória e capacidade de atenção. Faz fisioterapia e apresenta uma boa evolução nos movimentos dos seus membros superiores e equilíbrio do tronco.Nesta semana, vai começar a ter sessões de terapia ocupacional e fonoaudiologia. Além disso, há os cuidados clínicos e urológicos. Os riscos de infecção urinária são constantes. Foi por isso que o Herbert foi submetido na semana passada a uma avaliação urodinâmica, para se ter uma idéia mais precisa do funcionamento de sua bexiga. Foi a primeira vez que saiu de casa. Herbert ainda precisa se locomover de ambulância.

Herbert vai ser submetido a algum tratamento no exterior?
Agradecemos o oferecimento do governo cubano, que muito nos sensibilizou, e o contato estabelecido por Emerson Fittipaldi com o Miami Project to Cure Paralysis, mas estamos esperando uma melhora do quadro mental do Herbert para decidir qualquer coisa. Estamos muito satisfeitos com o tratamento que o Herbert vem recebendo no Brasil. Não acho vantajosa nenhuma viagem no momento, até porque acredito que não existe nada que esteja sendo feito no mundo hoje em dia com relação aos problemas do Herbert que não esteja também sendo feito com alta competência e muito carinho aqui no Brasil (por isso também optamos por comprar uma cadeira de rodas nacional). Há sim tratamentos experimentais sendo testados em importantes centros de pesquisa situados em vários países. Mas como esses tratamentos envolvem riscos, preferimos esperar que o próprio Herbert possa decidir o que quer fazer. Como no momento ele não tem consciência de seus problemas, acho que essa decisão ainda vai demorar.

Herbert já sabe da morte da Lucy?
Provavelmente não. É difícil dizer o que ele sabe ou não sabe. Diante do quadro mental que descrevi nas respostas anteriores, posso apenas repetir que o que ele sabe no momento presente é esquecido daqui a poucos minutos. Penso, também seguindo o conselho de médicos e psicanalistas com quem tenho conversado, que não é a hora de dar tão dolorosa notícia. Que adianta lhe dar essa notícia se ele não vai entendê-la e sobretudo se ele vai esquecê-la daqui a cinco minutos (e a notícia vai ter que ser dada novamente, gerando mais sofrimento)? Estamos esperando uma melhora no quadro mental do Herbert para dar a notícia. Estamos errados? Não temos coragem, como nos acusou um jornalista da [revista] Veja? Gostaria que cada pessoa que emitisse uma opinião a esse respeito se colocasse no nosso lugar e pensasse bem antes de nos transmitir conselhos levianos.

Como estão as crianças?
Elas perderam a mãe, e agora têm um pai hospitalizado em casa. É claro que estão sofrendo muito. Mas são crianças e têm uma maneira muito especial de lidar com tudo que aconteceu com elas. Acho que estão reagindo bem. Estamos atentos, conversando com psicólogos, trocando diariamente informações com as professoras no colégio. Conversamos muito com as crianças sobre tudo o que aconteceu. Não escondemos nada. Até porque temos que dar respostas claras para elas quando recebem informações erradas que são transmitidas para seus amigos (como por exemplo a de que o Herbert teria feito um looping antes do acidente, coisa que obviamente não fez naquele dia, nem nunca fez na vida).

O que houve com o Bradesco Saúde?
A vinda do Herbert para casa nos foi proposta como uma internação hospitalar domiciliar. Ele poderia continuar internado no Hospital Copa D’Or, mas vindo para casa (permanecendo com os mesmos cuidados que tinha no hospital) não correria riscos de infecção hospitalar e o ambiente familiar aceleraria sua recuperação. Os médicos que tratam do Herbert, alguns dos mais conceituados do Brasil, assinaram recentemente um laudo que reafirma a necessidade de que o Herbert continue a receber esses cuidados de home care. O Bradesco discorda da opinião desses médicos. O juiz que concedeu a liminar não mudou o plano do Herbert (como noticiou um jornal). Nossa família apenas exige o cumprimento daquilo que está escrito no contrato do Bradesco Saúde e queremos que os direitos do Herbert, que paga onze planos individuais do Bradesco Saúde, sejam respeitados. Pensamos que todo usuário de plano de saúde merece o (e tem direito ao) mesmo respeito.

Quando será possível visitar o Herbert?
Não sabemos. Tudo é uma questão de tempo e bom senso. Sinceramente: no momento as visitas mais atrapalham do que ajudam. Não estamos, de maneira alguma, sendo demasiadamente rigorosos ou cuidadosos. Não queremos afastar os amigos nem esconder o que está acontecendo. Queremos apenas o melhor para o Herbert. Quando houver possibilidade de visitas avisaremos a todos o melhor modo de marcá-las.

Acho que as perguntas mais comuns já estão respondidas. Quero escrever sobre o estado de saúde do Herbert semanalmente, mas não sei se terei tempo. Vamos ver. Gostaria ainda de, para finalizar, fazer alguns agradecimentos pessoais. Primeiro aos médicos e terapeutas que trataram ou ainda tratam do Herbert. Aos amigos (alguns deles deixaram vários recados e eu não tenho tempo de responder), mesmo distantes, pela grande força e ajudas de todos os tipos. Às pessoas que não conheço, mas que escrevem para e rezam pelo Herbert diariamente, espalhadas pelo Brasil inteiro e por muitos outros lugares do mundo. À imprensa que, em geral, tem também nos ajudado bastante. Tenho também que registrar um agradecimento especial ao amigo Marcelo Rubens Paiva que me apresentou o Centro de Vida Independente, uma organização que faz um trabalho importantíssimo para deficientes físicos, que eu infelizmente desconhecia, mas que tem sido de uma ajuda inestimável nesse momento difícil que estou vivendo. Aconselho todo mundo que tiver um problema semelhante a procurar o CVI para saber como tomar qualquer decisão sobre tratamento e sobre como superar as dificuldades. Aconselho também todo mundo a ajudar o CVI a melhor realizar sua missão.

Meu profundo agradecimento para todos. Até breve.

Hermano Vianna"