Gal Costa e Simone: as divas e suas releituras

Cantoras fecham 2002 com álbuns que apelam para canções bastante conhecidas; opção estética ou oportunismo?

Marco Antonio Barbosa
20/12/2002
As duas estão, sem dúvida, no panteão das grandes intérpretes da MPB de todos os tempos - cada qual em sua seara, claro. Ambas enfrentam (ou enfrentaram há pouco) polêmicas sobre a suposta estagnação criativa de suas carreiras. E, talvez não por coincidência, ambas apostaram neste fim de ano em discos com repertórios testados e consagrados, buscando um "mínimo denominador comum" junto ao gosto coletivo. Falamos de Gal Costa e Simone, ambas de volta às prateleiras de CDs com novas coleções de sucessos regravados. Gal estréia em casa nova - o selo MZA, distribuído pela Abril - com o álbum Bossa Tropical, no qual repassa um amplo espectro de referências (BRock, jovem guarda, cancioneiro norte-americano) sob a indefinível égide da bossa. Já Simone, que vem de um álbum de inéditas (Seda Pura, do ano passado) até certo ponto ousado, apela à formula das releituras em Feminino, gravado ao vivo, com um repertório centrado em canções já bem conhecidas. Opções estéticas legítimas das cantoras, pausas seguras para reavaliar seus rumos? ou caça-níqueis mirando a época dos presentes natalinos?

Gal justifica sua escolha ao dizer que buscou uma "maneira brasileira" de interpretar as várias nuances do repertório de Bossa Tropical. "A bossa do título é o jeito brasileiro que eu encontrei de cantar um repertório desse quilate, com coisas nacionais e internacionais. O resultado é eclético mas tem sotaque brasileiro", opinou a cantora. Eclético, sem dúvida, o novo disco de Gal o é. Produzido por Marco Mazzola (dono da MZA), Bossa Tropical procura dar unidade estética a um conjunto variado que inclui Titãs (Epitáfio), pop sessentista (Marcianita), sucessos gringos (The Fool on the Hill, dos Beatles, e o standard As Time Goes By), Arnaldo Antunes (Socorro) e Tom Jobim (O Amor em Paz).

Para emoldurar essa coleção eclética, Gal e Mazzola optaram por uma instrumentação econômica, filha direta de um show de voz e violão (com Luiz Meira) que a cantora fez há pouco tempo. Meira juntou à Gal e ao produtor para conceber os arranjos, que incluiram apenas o bandolim de Armandinho e a percussão de Marcos Suzano. "Tudo foi feito de forma muito rápida no estúdio", relatou Gal. "Da idéia inicial de fazer só com voz e violão, a coisa ganhou outra forma com a chegada do Suzano e do Armandinho. Tendo criado (os arranjos) com os músicos, me senti mais solta para cantar, para que minha voz sobressaísse."

Um álbum só com música consagradas (tirando Onde Deus Possa Me Ouvir, de Wander Lee e Quando Eu Fecho os Olhos, de Chico César e Carlos Rennó) pode parecer, a olhos mais céticos, uma posição defensiva de Gal. Afinal, ninguém esqueceu a confusão que a cantora gerou no ano passado, ao lançar De Tantos Amores - que também investia em regravações - dizendo que faltavam talentos novos na praça, o que a obrigou a recorrer a músicas antigas. A cantora afirma agora que tudo não passou de um mal-entendido. "Referi-me ao período imediatamente após o disco Aquele Frevo Axé (1998), quando eu recebi uma grande quantidade de material que não me satisfez", afirmou Gal. A baiana também despista aqueles que a acusam de apelativa, por apresentar uma (aparentemente) conservadora escolha de repertório. "O importante é que tratam-se de músicas que eu quero cantar neste momento. Mesmo que sejam todas bem conhecidas, há criatividade na minha forma de interpretá-las", disse Gal.



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