Hélio Ziskind grava disco infantil para adultos

Autor da trilha do Castelo Rá-Tim-Bum, o ex-integrante do grupo Rumo lança O Gigante da Floresta, trabalho no qual tenta ganhar as crianças com a historinha e os pais com a música

Carlos Calado
26/10/2000
Conhecido pelas trilhas sonoras que tem escrito para premiados programas infantis veiculados pela TV Cultura, como Glub Glub e o Castelo Rá-Tim-Bum, o compositor paulista Hélio Ziskind retorna às lojas com seu trabalho mais ambicioso na área da música para as crianças. O CD O Gigante da Floresta – Uma Viagem Musical de Hélio Ziskind ouvir 30s(distribuição Eldorado) traz de volta os personagens do programa Cocoricó (o boneco Júlio, as galinhas Lola, Lilica e Zazá, o cavalo Alípio e o galo Galileu), numa história que aponta para a defesa do meio ambiente. O projeto nasceu em 1997, quando Hélio acompanhou pelos jornais o caso de uma árvore de 1.500 anos (um jequitibá com 54 metros de altura), que foi alvo de um incêndio criminoso, em Carangola (MG). Os bombeiros precisaram de uma semana inteira para apagar o fogo, que queimou a parte interna do enorme tronco. A árvore sobreviveu.

"Eu queria agora fazer um trabalho mais autônomo. Essa é a base para tentar iniciar uma outra comunicação com o público", diz Ziskind, considerando que seu disco anterior, Meu Pé, Meu Pé Querido (Velas, 1997), era uma coletânea de trabalhos que ainda estava excessivamente ligada ao contexto da TV Cultura. "É o primeiro momento da minha vida de músico em que eu me pus tão claramente em primeiro plano. Existe uma vontade de me colocar pessoalmente, de ir em busca da música popular. Acho que misturei a necessidade de fazer um disco infantil com a vontade de fazer um disco pessoal", explica.

Ziskind não acredita na existência de um gênero musical infantil. "As crianças escutam todo o tipo de música. Acho que existe uma atração das crianças pelo mundo do ritmo. Quando a coisa está mais no mundo das notas e da harmonia, a criança já precisa ter amadurecido um pouco mais sua relação com a música para haver interesse naquilo. Mas eu acho uma redução muito grande pensar na música feita para criança como algo mais simples", argumenta o compositor, acreditando que a música de O Gigante da Floresta pode ser apreciada não só pelo público infantil. "Eu nem me preocupei com isso na hora de compor. Além da parte musical, o CD contém uma história, que tem até uma atitude ética. Então é um disco para crianças, mas que os pais podem ouvir como música", afirma.

Sonoridade de conjunto de câmara
O rigor musical de Ziskind, que nos anos 80 fez parte do grupo Rumo, levou-o a requisitar para as gravações alguns dos melhores músicos de São Paulo, como Nailor Proveta Azevedo (saxofones, clarinete e arranjos de sopros), Silvio Mazzuca Jr. (baixo elétrico e acústico) e Tuco Marcondes (guitarras, violões, dobro e cavaquinho português), além do percussionista carioca Marcos Suzano. "Procurei uma sonoridade mais próxima à de um conjunto de câmara", diz o arranjador e compositor, que teve a intenção de criar um produto que acrescente conteúdo musical à experiência das crianças. "Eu quis oferecer um objeto que possa ser imitado pela criança, e que ela lucre com isso. Tudo ali é feito pensando que alguém vai imitar aquilo, como eu imitei o João Gilberto", compara.

Outra referência musical de Ziskind para compôr algumas das canções do disco foi Jorge Ben Jor. "Eu lembrava muito aquela história do filme Xica da Silva. O Jorge Ben recebeu o roteiro e já saiu cantando o próprio roteiro", recorda, admitindo que Chove Chuva e W Brasil, de Ben Jor, serviram de modelos para suas composições. "Fui sentindo que a música popular brasileira era uma casa para mim. Nela, eu já tinha gêneros de sobra para preencher as canções."

O Gigante da Floresta nasceu também da necessidade de Ziskind de criar composições mais extensas, diferentemente das curtas canções e vinhetas que é obrigado a fazer para a TV. "Eu andava muito grilado com essa pulverização do veículo, essa coisa de fazer música de 30 segundos. Eu queria fazer músicas maiores, queria ficar mais tempo dentro da música", reconhece o compositor. Ao mesmo tempo, acrescenta Ziskind, houve também a preocupação de criar algo mais duradouro. "Estou dando continuidade a uma coisa que começou por acaso, uns 13 ou 14 anos atrás, quando eu já dava aulas de música para crianças. Esse disco carrega a vontade de fazer uma coisa inteiriça, que foi feita para durar mais."

A disputa com Xuxa e outros artistas que atuam na área da música infantil, apoiados no poder de fogo das TV comerciais, não parece preocupar Ziskind. "Já vou ficar feliz se o meu disco estiver na mesma prateleira dos discos da Xuxa e da Eliana. Não tenho muita preocupação com essa concorrência, não vou ficar dizendo que eu sou a qualidade e elas não", afirma, inicialmente. Porém, com um pouco de insistência, Ziskind reconhece suas diferenças em relação à rainha dos baixinhos e similares. "Na base, nem se compara a minha experiência musical e a delas. Eu me debruço sobre a música como quem está fazendo o principal, e elas não. A Xuxa, por exemplo, tem uma habilidade grande de fazer personagens, mas não desenvolveu uma voz para cantar. Ela não tem questões musicais a tratar, não usa a música como um canal de expressão. O disco dela não permite à criança amadurecer questões musicais. Se ela colocasse alguém de outra natureza para dirigir seus discos, até poderia chegar a outros resultados." Quem quiser saber um pouco mais sobre o disco de Ziskind pode conferir no site www.gigantedafloresta.com.br.