Henrique Cazes: rindo para chorar
O músico comemora 25 anos de carreira lançando ao mesmo tempo CD, exposição e livro
Julio Moura
23/07/2001
O bom-humor está de volta à vida de Henrique Cazes. E, com ele, uma infinidade de projetos. Novamente casado - ele atribui a fase de sorrisos fáceis ao sucesso matrimonial com Marília -, Cazes comemora 25 anos de carreira com uma exposição inspirada em seu livro Choro, do Quintal ao Municipal e o lançamento de um novo projeto editorial, o livro 171 Histórias Engraçadas de Músicas e Músicos. Em São Pedro da Serra, localidade próxima a Friburgo (RJ), ele exercita o cavaco, elaborando uma nova série de estudos para o instrumento, que deverá ser lançada até o fim do ano pela Lumiar.
Henrique também celebra o casamento musical com Cristina Buarque no recém-lançado e elogiadíssimo álbum Sem Tostão 2... A Crise Continua (Kuarup), recheado de criações burlescas de Noel Rosa, incluindo a famosa polêmica com Wilson Batista. Aguarda ansioso o lançamento do novo CD de Monarco, Uma História de Samba, produzido por ele para o mercado japonês, via JVC, e por enquanto sem previsão de edição brasileira. E não é tudo. Cazes prepara o début nacional do cantor e compositor J. Canalha, alter ego inusitado de um certo instrumentista que surgiu na música brasileira como integrante dos grupos Coisas Nossas e Camerata Carioca e nas últimas décadas tornou-se possivelmente a maior referência contemporânea do cavaquinho no choro.
"Realmente, estou numa fase bastante ativa e os projetos surgem sem dor. Depois que me separei de minha primeira mulher, em 94, o humor esteve ausente de minha vida. O casamento com Marília foi a melhor coisa que me aconteceu. Além de tudo, por influência dela, estou apurando os ouvidos para outros estilos musicais. Além do pop nacional de Lenine e Pedro Luís, tenho escutado muito reggae, descobri cada baixista incrível", assume.
O choro, entretanto, continua a ser a música para a qual Henrique dedica seus melhores acordes. Ao lado da produtora Ana Cunha, ele vem desenvolvendo o site www.chorobr.com.br, um elaborado banco de dados, informações e partituras sobre o gênero. Ana é também a curadora da exposição que Cazes inaugura no próximo dia 7 de agosto, no BNDES, no centro do Rio, e que deve seguir para o Sesc Pompéia, em São Paulo, a partir de setembro.
"A exposição é uma tradução visual e ambiental de meu livro ‘Choro, do quintal ao Municipal’. Pretendemos recriar o universo do choro em cinco ambientes que resumem sua trajetória. Haverá uma sala em homenagem aos pioneiros, como Chiquinha Gonzaga, Nazareth e Anacleto de Medeiros, outra dedicada à era do rádio, o auge de Jacob do Bandolim, Waldir Azevedo e Canhoto. Para lembrar Pixinguinha, vamos inaugurar a choperia Naquele Tempo. Teremos ainda rodas de choro, com a geração que surgiu a partir dos anos 70, na qual eu me incluo", ciceroneia.
O cavaquinista elogia a nova leva de chorões, que vem despontando desde meados dos anos 90. Ele acredita que o gênero recebeu um impulso nos últimos anos, através do surgimento de métodos didáticos e da produção independente dos pequenos selos: "O choro passou por um momento de ostracismo, na década de 80. O Camerata Carioca chegou a ser barrado no Mistura Fina, onde o pessoal preferia o fusion. Hoje, muitos dos músicos que tocavam fusion naquela época, estão aderindo ao choro. A criação de oficinas e métodos de estudo, como o meu próprio (‘Escola moderna do cavaquinho’), o de Mário Séves, para sopros, e o de Afonso Machado, para bandolim, proporcionou uma literatura didática que a minha geração não teve. Músicos como Hamilton de Holanda e os grupos Sarau e Rabo de Lagartixa se beneficiaram destas novidades. Toda semana eu conheço um jovem instrumentista que me impressiona", avalia Cazes, que cita as gravadoras Acari, Rob Digital e Kuarup como as que mais investem no segmento.
Os dedos, cronologicamente adaptados às pequenas casas do cavaquinho ("O corcunda sabe como deita. Com o tempo, os dedos vão cabendo nas escalas", compara), por vezes trocam as cordas de aço pelas teclas do Mac Intosh e o músico dá lugar ao escritor. Cazes prepara seu terceiro livro, ainda à procura de editora, com histórias hilárias de colegas de profissão, colecionadas por ele em seus 25 anos de carreira. O humor, que voltou a dar a tônica na vida do instrumentista, é a dominante da empreitada:
"Estou escrevendo às gargalhadas. Mostrei algumas passagens ao Marcelo Madureira (do Casseta & Planeta) e ele também riu muito. A idéia deste livro tem tudo a ver com a fase agradável que estou vivendo. Muitas dessas histórias surgem em mesas de botequim, como as que promovemos às segundas-feiras, no bar Bracarense", conta Cazes, enumerando Chico Caruso, Orlann Divo e o baterista Oscar Bolão como alguns dos participantes. Ele adianta duas das passagens relatadas no livro:
"Nos anos 80, houve uma encenação da ópera Aída, de Verdi, na Praça da Apoteose. Era uma montagem destinada ao fracasso, já que o público de ópera não combina muito com o Sambódromo. Depois da apresentação, com a Apoteose vazia, o produtor do espetáculo disse aos músicos da orquestra que havia sido assaltado e não dispunha do cachê combinado para pagá-los. Um dos músicos levantou-se e disparou, em meio ao constragimento geral: ‘Viemos tocar Aída e levamos uma volta’, conta.
Outra história tem como protagonista o cantor Nelson Ned e o apresentador do Festival de Viña Del Mar, no Chile:
"Era uma chileno metido a entender tudo de música brasileira. Na hora de anunciar os artistas brasileiros, ele dispensava as fichas de apresentação. Olhava para a coxia, reconhecia alguém e anunciava. Na hora do Nelson Ned entrar em cena, o apresentador não sabia de quem se tratava. Aflito, improvisou: ‘Con usteds, Toquinho!’".
Já que o assunto é humor, Cazes aproveita para apresentar sua mais nova criação: J. Canalha, uma espécie de Julinho de Adelaide escrachado, segundo Cazes, "o único sambista politicamente incorreto do Brasil": "Trata-se de um colecionador de paródias. Canalha é autor de sucessos como Baranga das Dez, Broto das Duas e Samba Geral dos Chatos, cuja letra diz: ‘Lugar pra juntar chato é botequim / de todo formato e variedade sem fim / o pior chato é o que faz samba ruim. / Se o cara chateia, concordando com o que você fala: é mala’".
Cazes promove o alter-ego, ainda sem data de lançamento ou gravadora definida: "É o único sambista novo que não é afilhado da Beth Carvalho", defende.
Henrique também celebra o casamento musical com Cristina Buarque no recém-lançado e elogiadíssimo álbum Sem Tostão 2... A Crise Continua (Kuarup), recheado de criações burlescas de Noel Rosa, incluindo a famosa polêmica com Wilson Batista. Aguarda ansioso o lançamento do novo CD de Monarco, Uma História de Samba, produzido por ele para o mercado japonês, via JVC, e por enquanto sem previsão de edição brasileira. E não é tudo. Cazes prepara o début nacional do cantor e compositor J. Canalha, alter ego inusitado de um certo instrumentista que surgiu na música brasileira como integrante dos grupos Coisas Nossas e Camerata Carioca e nas últimas décadas tornou-se possivelmente a maior referência contemporânea do cavaquinho no choro.
"Realmente, estou numa fase bastante ativa e os projetos surgem sem dor. Depois que me separei de minha primeira mulher, em 94, o humor esteve ausente de minha vida. O casamento com Marília foi a melhor coisa que me aconteceu. Além de tudo, por influência dela, estou apurando os ouvidos para outros estilos musicais. Além do pop nacional de Lenine e Pedro Luís, tenho escutado muito reggae, descobri cada baixista incrível", assume.
O choro, entretanto, continua a ser a música para a qual Henrique dedica seus melhores acordes. Ao lado da produtora Ana Cunha, ele vem desenvolvendo o site www.chorobr.com.br, um elaborado banco de dados, informações e partituras sobre o gênero. Ana é também a curadora da exposição que Cazes inaugura no próximo dia 7 de agosto, no BNDES, no centro do Rio, e que deve seguir para o Sesc Pompéia, em São Paulo, a partir de setembro.
"A exposição é uma tradução visual e ambiental de meu livro ‘Choro, do quintal ao Municipal’. Pretendemos recriar o universo do choro em cinco ambientes que resumem sua trajetória. Haverá uma sala em homenagem aos pioneiros, como Chiquinha Gonzaga, Nazareth e Anacleto de Medeiros, outra dedicada à era do rádio, o auge de Jacob do Bandolim, Waldir Azevedo e Canhoto. Para lembrar Pixinguinha, vamos inaugurar a choperia Naquele Tempo. Teremos ainda rodas de choro, com a geração que surgiu a partir dos anos 70, na qual eu me incluo", ciceroneia.
O cavaquinista elogia a nova leva de chorões, que vem despontando desde meados dos anos 90. Ele acredita que o gênero recebeu um impulso nos últimos anos, através do surgimento de métodos didáticos e da produção independente dos pequenos selos: "O choro passou por um momento de ostracismo, na década de 80. O Camerata Carioca chegou a ser barrado no Mistura Fina, onde o pessoal preferia o fusion. Hoje, muitos dos músicos que tocavam fusion naquela época, estão aderindo ao choro. A criação de oficinas e métodos de estudo, como o meu próprio (‘Escola moderna do cavaquinho’), o de Mário Séves, para sopros, e o de Afonso Machado, para bandolim, proporcionou uma literatura didática que a minha geração não teve. Músicos como Hamilton de Holanda e os grupos Sarau e Rabo de Lagartixa se beneficiaram destas novidades. Toda semana eu conheço um jovem instrumentista que me impressiona", avalia Cazes, que cita as gravadoras Acari, Rob Digital e Kuarup como as que mais investem no segmento.
Os dedos, cronologicamente adaptados às pequenas casas do cavaquinho ("O corcunda sabe como deita. Com o tempo, os dedos vão cabendo nas escalas", compara), por vezes trocam as cordas de aço pelas teclas do Mac Intosh e o músico dá lugar ao escritor. Cazes prepara seu terceiro livro, ainda à procura de editora, com histórias hilárias de colegas de profissão, colecionadas por ele em seus 25 anos de carreira. O humor, que voltou a dar a tônica na vida do instrumentista, é a dominante da empreitada:
"Estou escrevendo às gargalhadas. Mostrei algumas passagens ao Marcelo Madureira (do Casseta & Planeta) e ele também riu muito. A idéia deste livro tem tudo a ver com a fase agradável que estou vivendo. Muitas dessas histórias surgem em mesas de botequim, como as que promovemos às segundas-feiras, no bar Bracarense", conta Cazes, enumerando Chico Caruso, Orlann Divo e o baterista Oscar Bolão como alguns dos participantes. Ele adianta duas das passagens relatadas no livro:
"Nos anos 80, houve uma encenação da ópera Aída, de Verdi, na Praça da Apoteose. Era uma montagem destinada ao fracasso, já que o público de ópera não combina muito com o Sambódromo. Depois da apresentação, com a Apoteose vazia, o produtor do espetáculo disse aos músicos da orquestra que havia sido assaltado e não dispunha do cachê combinado para pagá-los. Um dos músicos levantou-se e disparou, em meio ao constragimento geral: ‘Viemos tocar Aída e levamos uma volta’, conta.
Outra história tem como protagonista o cantor Nelson Ned e o apresentador do Festival de Viña Del Mar, no Chile:
"Era uma chileno metido a entender tudo de música brasileira. Na hora de anunciar os artistas brasileiros, ele dispensava as fichas de apresentação. Olhava para a coxia, reconhecia alguém e anunciava. Na hora do Nelson Ned entrar em cena, o apresentador não sabia de quem se tratava. Aflito, improvisou: ‘Con usteds, Toquinho!’".
Já que o assunto é humor, Cazes aproveita para apresentar sua mais nova criação: J. Canalha, uma espécie de Julinho de Adelaide escrachado, segundo Cazes, "o único sambista politicamente incorreto do Brasil": "Trata-se de um colecionador de paródias. Canalha é autor de sucessos como Baranga das Dez, Broto das Duas e Samba Geral dos Chatos, cuja letra diz: ‘Lugar pra juntar chato é botequim / de todo formato e variedade sem fim / o pior chato é o que faz samba ruim. / Se o cara chateia, concordando com o que você fala: é mala’".
Cazes promove o alter-ego, ainda sem data de lançamento ou gravadora definida: "É o único sambista novo que não é afilhado da Beth Carvalho", defende.