Homenagem alto-astral para Wilson Simonal

No primeiro aniversário de morte do cantor, o filho Simoninha faz show com suas músicas e planeja relançar seus álbuns

Marco Antonio Barbosa
24/06/2001
Parece que foi ontem, mas já faz um ano - exatamente neste dia 25 - que o cantor Wilson Simonal morreu. A história artística do "rei da pilantragem" é uma das mais extraordinárias que este Brasil já testemunhou: consagrado nos anos 60, legítimo construtor da moderna música negra brasileira, relegado ao ostracismo depois do infame episódio da "delação" (durante a ditadura militar), e enfim recuperado para o mundo musical. Um tanto tarde demais, pois em 2000, cinco anos após lançar seu primeiro álbum (Brasil) desde 1991, Simonal faleceria, vítima de uma disfunção hepática crônica (clique aqui para ver mais sobre a carreira e discografia de Simonal). No entanto, se depender de Wilson Simoninha, o filho mais velho de Simonal, neste dia 25 não vai haver nem choro nem vela para reverenciar o pai - vai ter sim muito suíngue. Simoninha faz show na noite do dia 25 no Blen Blen Club (a "casa" do grupo Artistas Reunidos) com um repertório composto apenas de clássicos gravados por seu pai. E não vai parar por aí: pretende lançar, em parceria com a gravadora Trama, todos os álbuns de Simonal, enfim no formato digital.

"Eu estava sozinho em casa um dia desses, ouvindo música, e de repente bateu a vontade de ouvir um Simonal. Fiquei lá, escutando as músicas, viajando no som, e aí foi que me toquei: já vai fazer um ano da morte dele... Não podia deixar a data passar em branco", começa a explicar Simoninha. "A primeira idéia foi logo a mais óbvia: mandar rezar uma missa. Mas depois pensei: missa? Por que não fazer um show? Homenageá-lo com música, a música dele. Ao mesmo tempo, teria um clima de festa. Seria uma forma de homenagear o público também." O filho de Simonal propôs a idéia à sua banda, que topou na hora. "Começamos a ensaiar há umas três semanas. Acabou dando supercerto. Apesar de ser a primeira vez em que fazemos um projeto desse tipo, só com músicas do Simonal, logo sacamos que tinha tudo a ver", conta Simoninha.

Para o show no Blen Blen - a pequena casa noturna que serviu de base para vários e memoráveis shows comandados por Simoninha, junto à galera dos Artistas Reunidos (Pedro Mariano, Max de Castro, Jairzinho de Oliveira...) -, Simoninha promete uma panorâmica na carreira de Simonal. "Quis juntar todas as músicas que tiveram uma significância na trajetória dele. Tem algumas coisas mais óbvias para quem já conhece a carreira do Simonal. Como aquelas músicas que ficaram famosas da época da 'pilantragem' - País Tropical ou Meu Limão, Meu Limoeiro, por exemplo - mas também vou tocar músicas dos primeiros tempos de carreira dele, como Lobo Bobo e Balanço Zona Sul. E algumas canções que ele lançou, mas que muita gente nem sabe que ele chegou a gravar. Além disso, quis colocar certas canções que ele gravou nos últimos tempos de carreira, músicas que de repente não são tão importantes quanto as outras, mas que eu pessoalmente acho interessantes, bacanas", diz Simoninha. O cantor avisa que mesmo sem ter feito nenhum convite oficial, os músicos amigos e os colegas dos Artistas Reunidos podem (e devem) dar uma forcinha a ele no palco.

Ao mesmo tempo em que se encontra empolgado com a homenagem, Simoninha ressalta: "Esse show vai ser o primeiro e único desse tipo. Não estou fazendo nenhum tipo de tributo 'oficial', nem levantando algum manifesto à memória do meu pai. Na verdade, nem queria que o show tivesse muita divulgação, ou que se transformasse em algo badalado, maior do que é na realidade. É uma coisa tão pessoal, que eu podia fazer esse show na minha casa mesmo. Preferi o Blen Blen - que, afinal de contas, também é um lugar pequeno - porque sei que há muita gente que curte as músicas do Simonal. Mas de maneira nenhuma quero que essa noite sirva para me promover."

Também sem caráter algum de auto-promoção é o projeto que Simoninha está desenvolvendo junto à sua gravadora, a Trama, para relançar em CD a obra de Wilson Simonal. "Esses relançamentos já fogem do caráter de homenagem. A intenção é que fazer com que as pessoas vejam a importância que ele teve para a música brasileira, e que hoje em dia quase ninguém mais lembra. Temos que mostrar o quanto ele criou dentro da MPB, e a quantidade de coisas bacanas que ele fortaleceu e ajudou a crescer", fala Simoninha.

Na verdade, as conversações para o relançamento já vêm desde o ano passado, conduzidas por um "comitê" composto por Simoninha, a Trama e as gravadoras que detém os direitos sobre os discos mais importantes de Simonal - a EMI e a Universal. "O plano é relançar todos os álbuns que ele fez entre 1965 e 1975, a fase mais importante e a que tem os maiores sucessos dele", afirma Simoninha, que continua: "No começo deste ano, depois de muito conversar, conseguimos que a EMI e a Universal liberassem os títulos. Mas aí a Trama resolveu reformular a estratégia de lançamentos para 2001, e o projeto acabou esfriando um pouco. Não digo que teremos de recomeçar do zero, mas vai depender de mais conversa, agora que a Trama finalmente deu o sinal verde."

O pacote incluiria então, a princípio, 11 álbuns, do Wilson Simonal de 1965 ao Se Dependesse de Mim, de 1972 (justamente o ano em que sua carreira capotou). Ou seja, o período no qual Simonal, já distanciado da bossa nova com que se lançou no mercado, consolidou seu estilo bem brasileiro de black music - incorporando à brasilidade sambística as influências do soul, do funk e também do iê-iê-iê da Jovem Guarda. Isso desembocaria na tal pilantragem, da qual Simonal foi o astro maior.

"Também gostaria muito de relançar alguns dos álbuns que ele lançou nos anos 80, discos que não fizeram sucesso mas que têm muitas músicas interessantes. Esses álbuns estão hoje em poder da BMG, então seria mais conversa..." fala Simoninha. "Não que a minha onda seja ficar ali, espanando o pó do caixão do meu pai. Mas se alguém tem o dever de fazer isso, esse alguém sou eu, que sou filho!", termina o cantor.

Só para lembrar: nenhum dos discos clássicos de Simonal tem edição em CD. Apenas as coletâneas A Bossa e o Balanço de Wilson Simonal, de 1998, Bem Brasil, de 1998, Meus Momentos, o último disco de inéditas (o já citado Brasil), e um título da série "Dois LPs em um CD" da BMG, resgatando os pouco expressivos Ninguém Proibe o Amor (75) e A Vida É Só Pra Cantar (77).