Jair Rodrigues se assume como <i>Intérprete</i>

O 41º disco - em uma carreira de 40 anos - do cantor traz fina seleção de clássicos produzida pelo filho Jair Oliveira

Marco Antonio Barbosa e Mônica Loureiro
02/10/2002
Se é preciso haver um referencial do samba em São Paulo, esse nome é Jair Rodrigues. O cantor está lançando Intérprete ouvir 30s. Mas intérprete você sempre foi, certo, Jair? "A idéia por trás do disco foi do meu filho Jair (Oliveira, ex-Jairzinho, que produziu o CD). Ele sugeriu que eu gravasse compositores que eu nunca tinha cantado, como Dominguinhos, João Bosco, Djavan. Mas teria de ser do meu jeito, sem cair na mesmice", fala o cantor. São 41 discos em uma carreira de 40 anos. Jair se diz satisfeito com sua atual gravadora. "A Trama deixa a gente totalmente à vontade para escolher repertório, músicos. Tudo acaba ficando muito bem sintonizado", elogia Jair.

Intérprete tem clássicos - No Meu Pé de Serra, Mineira, Incompatibilidade de Gênios, Arrastão - e duas inéditas - Catimbó Numa Perna Só (dos carioquíssimos Ary do Cavaco e Otacílio da Mangueira) e Mãe de Verdade (do filho Jair). "Catimbó é um partido alto, bem enraizado; Mãe de Verdade era para a trilha da novela A Padroeira, pedi para Jairzinho fazer, mas acabou não dando tempo de entrar", explica.

Segundo Jair, o disco foi feito rapidamente: "Começamos a gravar na segunda quinzena de abril, e na primeira de maio estava pronta a parte de estúdio". O CD tem vários convidados, como Lobão, Rappin' Hood, Dominguinhos, José Domingos, Wilson Simoninha e os filhotes Luciana Mello e Jair.

Jair comenta alguns desses encontros: "Eu conheço o Lobão há muito tempo, quando ele ainda era gordo... Eu ia nos ensaios da Mangueira e o observava como ritmista, percebia o quanto era bom no samba também. Aí o Jairzinho sugeriu a participação, e ele adorou. No estúdio, nós não sabíamos a letra de Incompatibilidade de Gênios, entramos para gravar assim mesmo e dez minutos estava pronta. Foi de primeira!".

Outra participação bastante especial no disco foi a do crooner José Domingos em Perfil de São Paulo. "Ele é um pernambucano que tem uma casa noturna aqui no Sumaré, a Confraria. Era para ele ter sido um dos baluartes da música brasileira, mas acho que por ser um pouco preguiçoso, só cantava na noite e pronto. Eu não, cantava mas ia para a porta das gravadoras toda manhã e, de tanto encher o saco, acabaram me dando uma chance... Ele é uma figura, fala baixo, é encantador aos seus 74 anos. Já o convidei para participar da turnê", diz.

Parceiro de Elis Regina na clássica série Dois na Bossa (resultando em três LPs ao vivo entre 65 e 67), Jair homenageia a cantora justamente com um de seus primeiros sucessos - Arrastão. "É muito difícil gravar músicas que Elis já tenha gravado. Mas nessa, eu percebi que ela tinha deixado um espaço... Aproveitei que o Cesar Camargo Mariano estava no estúdio e fizemos ritmados só no piano", diz.

O encontro com o pianista resultou não só na bela releitura mas também no início de um outro projeto: "Ele trouxe uma idéia lá de fora e pensou em mim para começar. O artista entra no estúdio com a banda, mas sem arranjos nem nada. Aí vai gravando até fazer uns, dois, três discos, de forma bem informal. Eu, quando tiver material para uns dez discos, a gente faz uma caixa! Estou doido para começar", diz, com uma simpatia insuperável.

Em seu novo disco, Jair Rodrigues também homenageia Clara Nunes. "Eu e Clara fomos muito amigos e também namorados. Aliás, eu posso ter perdido a namorada, mas o Brasil ganhou uma grande intérprete. Mas sinto que ela já está quase esquecida, não toca mais", lamenta. Para os fãs de todo o Brasil, Jair tem uma boa notícia: segue com uma intensa agenda de shows. Reforçada ainda mais neste ano eleitoral, dividida entre a divulgação do disco e showmícios. Ele avisa: "Comigo não tem negócio de partido, não. Faço show pra deputado, senador... só não fiz pra presidente porque parece mesmo que a cartada final vai ser para o segundo turno. E dessa forma que faço, sempre deu certo, nunca ninguém torceu o nariz pra mim", garante.