Lenine grava disco na terra de Lênin

Compositor pernambucano encara inverno russo em fevereiro para gravar novo disco junto com quinteto de Moscou

Tom Cardoso
03/10/2000
Um pernambucano, discípulo de Jackson do Pandeiro e Alceu Valença, gravando um disco na Rússia com uma banda erudita local, que musicalmente lembra muito Dorival Caymmi? É isso mesmo. Lenine já marcou para fevereiro sua ida a Moscou, onde vai gravar as bases para o seu próximo disco, que será feito em parceria com um quinteto que ele conheceu este ano durante uma turnê na Alemanha. "Pode até ser que eu mude de idéia até a gravação do disco, mas a verdade é que estou encantado com essa banda. São instrumentistas fantásticos, que misturam música tradicional russa com elementos pop e de outras culturas", elogia o compositor.

Lenine não está preocupado com o inverno russo e nem tão pouco com sua total falta de familiaridade com a língua russa. "Não sei nem pronunciar o nome do grupo", conta. Ele ficou emocionado quando ouviu pela primeira vez a banda, que ele jura ter semelhanças com a música feita por Dorival Caymmi. "Eu já sabia que a cultura russa tinha algumas coisas parecidas com a nossa, mas não imaginava que fosse tão forte no terreno musical", diz o pernambucano, que tem outros laços fraternais com o país. "O meu nome foi dado em homenagem ao Lênin (revolucionário e estadista russo). Meu pai era um ferrenho defensor do regime comunista."

Segundo o compositor pernambucano, a prova definitiva de que a música não tem fronteiras ocorreu durante o Heineken Concerts, festival realizado em abril deste ano. Lenine comandou uma noite em que estiveram juntos no palco músicos franceses, pernambucanos, africanos e alagoanos. "Eu vi Dominguinhos tocando acordeom junto com Richard Bona (sanfoneiro de Madagascar) e o Caju e Castanha dividindo uma embolada com o Fabulous Troubadours (dupla francesa). Todos pareciam ter nascido no mesmo país."

E pelo jeito a sua pesquisa musical pelo mundo ainda dará muitos frutos. Recém-chegado de uma turnê grandiosa (foram três meses viajando) pela Europa e Japão, Lenine já tem shows agendados em 15 cidades da França, país onde o disco Na Pressão vendeu respeitosas 20 mil cópias. "Os franceses sempre gostam e se interessaram muito pela boa música. O jazz sobreviveu uma época só por causa do mercado francês."

No pouco tempo que permaneceu no Brasil nos últimos meses, Lenine fez questão de gravar sua participação em dois projetos – no Grande Encontro 3, junto com Elba Ramalho, Geraldo Azevedo e Zé Ramalho, e no novo disco de Lula Queiroga (seu parceiro no álbum Baque Solto, de 1983). "O Lula é um grande cronista, um exímio letrista. O seu disco, Aboiando a Vaca Mecânica, está sensacional, estou batendo os tambores para que tudo dê certo."