Menescal ganha roupagem <i>jazzy electronic</i> do Bossacucanova
Trio de produtores-músicos e DJ, que vem ganhando notoriedade no exterior com novas versões para a velha bossa
Silvio Essinger
08/03/2001
"Estou pop, não?", brincou Roberto Menescal, depois de saber que o repórter tinha ouvido Brasilidade , disco que ele gravou com o trio de produtores-músicos e DJ do Bossacucanova. O autor de Barquinho, Você, Errinho À Toa (todas em parceria com Ronaldo Bôscoli) e de outros sucessos da música brasileira da década de 60 entrou de cabeça no departamento da jazzy electronic bossa, repleta de passagens house e drum'n'bass, no qual seu filho Márcio, o DJ Marcelinho Da Lua e Alexandre Moreira vêm ganhando cada vez mais notoriedade no exterior. Foi Menescal, por sinal, quem deu o título do disco, que por pouco não se chamou Bossacucanova Vol.2 (o primeiro volume saiu em 1997). "A minha idéia para o disco era a seguinte: pode-se usar tudo, todo tipo de eletrônica, desde que pareça que ele foi feito no Brasil", conta.
Brasilidade chega às lojas na próxima segunda-feira. Nos Estados Unidos, ele será lançado pelo selo Six Degrees; no Japão (com outra capa), pela King Records; na França, pela Warner Jazz; na Espanha pela Virgin e no resto da Europa pela Crammed Discs. No Brasil, o disco sai só Deus sabe quando, sabe-se lá por que gravadora. "Nossa última opção é lançá-lo pela Cucamonga (selo da Albatroz, gravadora de Menescal, que pôs no mercado brasileiro o primeiro disco do Bossacucanova)", diz Da Lua. Em junho, os quatro estréiam o show do disco, fazendo uma turnê européia de um mês, que muito provavelmente vai ser esticada até Nova York, para uma apresentação no festival Summerstage. Eles só não fazem uma incursão mais longa no exterior por causa dos compromissos profissionais de Menescal - em breve, ele lança seu disco ao vivo com Wanda Sá e Marcos Valle (leia matéria).
Não é de hoje que o veterano músico vem estreitando seu contato com o Bossacucanova. O projeto não só nasceu em seus estúdios, como ainda foi responsável pela recriação dançante de uma música sua, o Barquinho. Ela, por sinal, foi a faixa de Bossacucanova Vol.1 que mais fez sucesso no exterior. "Eles me disseram: faz a sua parte e deixa com a gente. Não houve surpresas, gostei muito. Eu, que sou produtor, fui produzido pela primeira vez", conta. Algum tempo depois, em show no Garden Hall (RJ), de comemoração dos 40 anos da bossa, Menescal fez um teste: levou o BCN para o palco, em uma versão de A Morte de um Deus de Sal (mais uma parceria com Bôscoli, que reaparece agora no Brasilidade). Muitos gostaram do que ouviram - o suficiente para ele ter certeza de que valia a pena fazer o disco.
Em algumas faixas, Menescal gravou o seu violão apenas acompanhado de um clique (metrônomo eletrônico), para que depois Márcio, Da Lua e Alexandre o vestissem de beats e blips. Noutras, fez improvisos de guitarra, por cima da parte rítmica montada pelo trio. A volta ao instrumento que tocava no começo da bossa nova e depois ficou anos sem sequer pegar é comemorada. "A guitarra é um brinquedo de que sempre gostei. Hoje estou até estudando ela um pouco", conta, ressaltando que foi um desafio criar melodias a partir das batidas.
Clássicos da bossa e inéditas
Brasilidade é recheado de recriações de clássicos da bossa, como Telefone, Nós e o Mar, Rio, A Morte de um Deus de Sal (todas da dupla Menescal-Bôscoli), Água de Beber (que por pouco não entrou na trilha de Sabor da Paixão, filme da venezuelana Fina Torres), Garota de Ipanema, Nanã e Surfboard, além de uma do sucesso Bye Bye Brasil, de Menescal e Chico Buarque. Mas havia a pressão da gravadora para que o disco trouxesse composições inéditas. O bossanovista e o BCN acabaram fazendo três: a faixa-título, Mais Perto do Mar e Guanabara. "O pessoal lá de fora dizia: tem que ter música nova, tem que ter percussão, batida house. Então, Guanabara a gente fez por encomenda", conta Márcio Menescal, que é produtor e também baixista. Nessa faixa, foi seu pai quem deu o fecho melódico para as idéias que o trio apresentara. "Eles tinham o projeto, faltava o desenhista", diz Roberto.
A simpatia pelo Bossacucanova garantiu algumas importantes participações especiais no disco, que foi todo gravado no estúdio Barquinho, montado recentemente por Menescal em uma ilha na Barra da Tijuca (RJ). Léo Gandelman gravou um naipe de saxes em Telefone e Ed Motta emprestou seus vocais jazzy a Garota de Ipanema, da qual participou também o percussionista Laudir de Oliveira. Outras participações vieram em forma de samples, que foram tirados dos discos de vinil, na tentativa de dar ao disco uma sonoridade de época. De um LP esquecido, veio uma seção de cordas para a nova versão de Rio. Já do disco Vinicius e Caymmi no Zum Zum, de 1967, veio uma fala do poetinha (tirada de Carta ao Tom), que foi incorporada, com autorização da família Moraes, à música Brasilidade.
Em Surfboard, Marcelinho Da Lua inventou de pôr um sample cheio de chiados e flanger, num efeito sonoro de causar espanto. Essa faixa, segundo Roberto Menescal, foi a mais difícil de montar no disco - ele tem uma harmonia "andante", de quatro guitarras que se completam em um naipe. Essa composição de Tom Jobim, aliás, não poderia ficar de fora do disco - e por uma simples razão: "Tom me disse que, se ele não tivesse feito essa música, eu acabaria fazendo", conta Menescal, que, com seu conjunto, foi responsável pela gravação inaugural de Surfboard.
Além dos samples de vinil, ambiências naturais (os ecos foram todos criados em salas), equipamento valvulado e cordas de verdade (da companhia de Pascoal Perrota, na faixa A Morte de um Deus de Sal), foram outros recursos usados em Brasilidade para amenizar a frieza eletrônica das máquinas. "No disco não tem programações, só edição de sons", revela Márcio Menescal. Isso foi o que possibilitou, por exemplo, a grande variedade rítmica na versão drum'n'bass de Nós e o Mar, cuja versão extended é a faixa seguinte, Mais Perto do Mar - de tão comprida que ficou a gravação, ela que teve que ser dividida em duas faixas. E o som do mar na música foi obtido da forma mais inusitada possível: é um sample de O Barquinho tirado da versão em vinil, estrangeira, de Bossacucanova Vol.1.
A expectativa de Menescal e o Bossacucanova em relação a Brasilidade é grande. "Os estrangeiros gostam muito do contraste das gerações", diz o veterano músico. A grande dificuldade, segundo ele, vai ser reproduzir o disco ao vivo - o que não é impossível, exceto pelas quatro guitarras de Surfboard. Ele e o BCN prometem ensaiar bastante - pelo menos um mês antes da turnê. "As evoluções técnicas vão dando novas opções para o músico. Mas o que vai dizer se o trabalho é válido é se ele vai poder ser reproduzido ou não", diz Menescal. Disposto a cultivar o contraste que tanto atrai os estrangeiros, ele revela sua maior preocupação nos shows com o Bossacucanova: "É saber com que roupa eu vou" - quem o conhece sabe que ele costuma andar em trajes tão ou até mais joviais que os do trio.
Brasilidade chega às lojas na próxima segunda-feira. Nos Estados Unidos, ele será lançado pelo selo Six Degrees; no Japão (com outra capa), pela King Records; na França, pela Warner Jazz; na Espanha pela Virgin e no resto da Europa pela Crammed Discs. No Brasil, o disco sai só Deus sabe quando, sabe-se lá por que gravadora. "Nossa última opção é lançá-lo pela Cucamonga (selo da Albatroz, gravadora de Menescal, que pôs no mercado brasileiro o primeiro disco do Bossacucanova)", diz Da Lua. Em junho, os quatro estréiam o show do disco, fazendo uma turnê européia de um mês, que muito provavelmente vai ser esticada até Nova York, para uma apresentação no festival Summerstage. Eles só não fazem uma incursão mais longa no exterior por causa dos compromissos profissionais de Menescal - em breve, ele lança seu disco ao vivo com Wanda Sá e Marcos Valle (leia matéria).
Não é de hoje que o veterano músico vem estreitando seu contato com o Bossacucanova. O projeto não só nasceu em seus estúdios, como ainda foi responsável pela recriação dançante de uma música sua, o Barquinho. Ela, por sinal, foi a faixa de Bossacucanova Vol.1 que mais fez sucesso no exterior. "Eles me disseram: faz a sua parte e deixa com a gente. Não houve surpresas, gostei muito. Eu, que sou produtor, fui produzido pela primeira vez", conta. Algum tempo depois, em show no Garden Hall (RJ), de comemoração dos 40 anos da bossa, Menescal fez um teste: levou o BCN para o palco, em uma versão de A Morte de um Deus de Sal (mais uma parceria com Bôscoli, que reaparece agora no Brasilidade). Muitos gostaram do que ouviram - o suficiente para ele ter certeza de que valia a pena fazer o disco.
Em algumas faixas, Menescal gravou o seu violão apenas acompanhado de um clique (metrônomo eletrônico), para que depois Márcio, Da Lua e Alexandre o vestissem de beats e blips. Noutras, fez improvisos de guitarra, por cima da parte rítmica montada pelo trio. A volta ao instrumento que tocava no começo da bossa nova e depois ficou anos sem sequer pegar é comemorada. "A guitarra é um brinquedo de que sempre gostei. Hoje estou até estudando ela um pouco", conta, ressaltando que foi um desafio criar melodias a partir das batidas.
Clássicos da bossa e inéditas
Brasilidade é recheado de recriações de clássicos da bossa, como Telefone, Nós e o Mar, Rio, A Morte de um Deus de Sal (todas da dupla Menescal-Bôscoli), Água de Beber (que por pouco não entrou na trilha de Sabor da Paixão, filme da venezuelana Fina Torres), Garota de Ipanema, Nanã e Surfboard, além de uma do sucesso Bye Bye Brasil, de Menescal e Chico Buarque. Mas havia a pressão da gravadora para que o disco trouxesse composições inéditas. O bossanovista e o BCN acabaram fazendo três: a faixa-título, Mais Perto do Mar e Guanabara. "O pessoal lá de fora dizia: tem que ter música nova, tem que ter percussão, batida house. Então, Guanabara a gente fez por encomenda", conta Márcio Menescal, que é produtor e também baixista. Nessa faixa, foi seu pai quem deu o fecho melódico para as idéias que o trio apresentara. "Eles tinham o projeto, faltava o desenhista", diz Roberto.
A simpatia pelo Bossacucanova garantiu algumas importantes participações especiais no disco, que foi todo gravado no estúdio Barquinho, montado recentemente por Menescal em uma ilha na Barra da Tijuca (RJ). Léo Gandelman gravou um naipe de saxes em Telefone e Ed Motta emprestou seus vocais jazzy a Garota de Ipanema, da qual participou também o percussionista Laudir de Oliveira. Outras participações vieram em forma de samples, que foram tirados dos discos de vinil, na tentativa de dar ao disco uma sonoridade de época. De um LP esquecido, veio uma seção de cordas para a nova versão de Rio. Já do disco Vinicius e Caymmi no Zum Zum, de 1967, veio uma fala do poetinha (tirada de Carta ao Tom), que foi incorporada, com autorização da família Moraes, à música Brasilidade.
Em Surfboard, Marcelinho Da Lua inventou de pôr um sample cheio de chiados e flanger, num efeito sonoro de causar espanto. Essa faixa, segundo Roberto Menescal, foi a mais difícil de montar no disco - ele tem uma harmonia "andante", de quatro guitarras que se completam em um naipe. Essa composição de Tom Jobim, aliás, não poderia ficar de fora do disco - e por uma simples razão: "Tom me disse que, se ele não tivesse feito essa música, eu acabaria fazendo", conta Menescal, que, com seu conjunto, foi responsável pela gravação inaugural de Surfboard.
Além dos samples de vinil, ambiências naturais (os ecos foram todos criados em salas), equipamento valvulado e cordas de verdade (da companhia de Pascoal Perrota, na faixa A Morte de um Deus de Sal), foram outros recursos usados em Brasilidade para amenizar a frieza eletrônica das máquinas. "No disco não tem programações, só edição de sons", revela Márcio Menescal. Isso foi o que possibilitou, por exemplo, a grande variedade rítmica na versão drum'n'bass de Nós e o Mar, cuja versão extended é a faixa seguinte, Mais Perto do Mar - de tão comprida que ficou a gravação, ela que teve que ser dividida em duas faixas. E o som do mar na música foi obtido da forma mais inusitada possível: é um sample de O Barquinho tirado da versão em vinil, estrangeira, de Bossacucanova Vol.1.
A expectativa de Menescal e o Bossacucanova em relação a Brasilidade é grande. "Os estrangeiros gostam muito do contraste das gerações", diz o veterano músico. A grande dificuldade, segundo ele, vai ser reproduzir o disco ao vivo - o que não é impossível, exceto pelas quatro guitarras de Surfboard. Ele e o BCN prometem ensaiar bastante - pelo menos um mês antes da turnê. "As evoluções técnicas vão dando novas opções para o músico. Mas o que vai dizer se o trabalho é válido é se ele vai poder ser reproduzido ou não", diz Menescal. Disposto a cultivar o contraste que tanto atrai os estrangeiros, ele revela sua maior preocupação nos shows com o Bossacucanova: "É saber com que roupa eu vou" - quem o conhece sabe que ele costuma andar em trajes tão ou até mais joviais que os do trio.
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