Mestre Ambrósio reforça as raízes em novo disco

A banda de Recife grava ao vivo em estúdio o seu Terceiro Samba, trabalho no qual busca tornar conhecidos instrumentos como o fole de oito baixos, o ilu e a alfaia de maracatu

Silvio Essinger
16/03/2001
Terceiro Samba amostras de 30s é o terceiro disco do Mestre Ambrósio, banda de Recife que, apesar de ter sido revelada no país junto com Chico Science & Nação Zumbi, Mundo Livre S/A e outros expoentes do mangue beat, está bem mais próxima das raízes da música pernambucana (maracatu, cavalo marinho, embolada) do que dos sons pop-eletrônicos captados pelas parabólicas enfiadas na lama. No entanto, assim como a Nação (que lançou ano passado o disco Rádio S.Amb.A. amostras de 30s) e o Mundo (que estreou em 1994 com o Samba Esquema Noise amostras de 30s), o Mestre incorpora ao título do disco esse que é um dos termos mais conhecidos da música brasileira - só que não na acepção que normalmente se imagina.

Do samba, música oficial brasileira desde a sua primeira explosão, na década de 30, os recifenses não puderam escapar. "Mas a palavra tem outros significados em Pernambuco", explica Siba, que canta e toca rabeca e guitarra no Mestre, além de compor boa parte das músicas da banda. "Samba também pode ser uma reunião com música - nem sempre o samba - e dança", explica. Daí o Terceiro Samba ser a terceira festa (em disco) do Mestre Ambrósio.

No entanto, além da conhecida mistura de estilos tradicionais do Nordeste, a banda traz no disco dois sambas mesmo, no melhor estilo carioca: Saudade (do vocalista e multiinstrumentista Sérgio Cassiano) e Lembrança de Folha Seca (de Siba). Há, por sinal, uma sutil jogada no título, que vem com a letra R e o I em tipos brancos, a mesma cor do fundo - de mais longe, ele pode ser lido como Tecer o Samba. O que nos remete, inevitavelmente, ao Estudando o Samba amostras de 30s, de Tom Zé.

A referência ao experimental baiano não é casual: segundo o guitarrista, o Mestre Ambrósio decidiu em Terceiro Samba explorar radicalmente alguns instrumentos ainda pouco conhecidos no Sudeste, como o fole de oito baixos, o ilu (tipo de atabaque que veio das religiões afro-brasileiras), a alfaia de maracatu e a caixa-prato. "Eles têm tantas possibilidades quanto quaisquer outros", prega. O disco foi todo gravado com a banda tocando ao vivo - os recursos tecnológicos empregados foram tão somente os que aumentam a sensibilidade dos microfones. "Ao vivo é a melhor maneira de captar o som", diz Siba.

No Terceiro Samba, o Mestre evitou as manipulações de estúdio que caracterizaram seu disco anterior, Fuá na Casa de CaBRal amostras de 30s (98), que foi produzido pelo falecido Suba. "Naquele CD, a gente quis um namoro com os recursos tecnológicos", assume o guitarrista. No novo disco, a produção foi de Beto Villares, que saiu pelo país gravando os sons que foram apresentados na série Música do Brasil, do antropólogo Hermano Vianna, e foi responsável por algumas faixas do último disco solo do irmão deste, Herbert (O Som do Sim amostras de 30s). "Queríamos alguém que entendesse da linguagem musical e timbrística brasileira", diz Siba.

Orgulhoso da maturidade que o Mestre apresenta nas composições e na execução de Terceiro Samba, Siba vê com cada vez mais distância a guitarra roqueira que tocava em bandas de garagem. "Percebi que gostava muito mais da viola nordestina. Assim, desenvolvi na guitarra uma forma de tocar muito próxima da viola."

Nos festivais europeus de world music
Radicados em São Paulo há quatro anos, os músicos do Mestre Ambrósio têm percorrido o Brasil com boa desenvoltura. O show do novo disco estréia dia 23, no Sesc Belenzinho, em São Paulo. Logo depois, em abril, a banda toca no Rio de Janeiro, ainda sem data ou local marcados. Dois mil e um promete para o Mestre: este ano, ele vai passar cerca de três meses no exterior, realizando três turnês européias e uma americana. "Costumamos tocar em festivais de música do mundo [a popular world music], onde tem um público muito especial, muito aberto e cheio de curiosidade por esse lado do Brasil ao qual ele não costuma ter acesso, já que só o que costuma aparecer são artistas de samba e bossa nova", diz Siba. Portugal, Bélgica, Alemanha, Inglaterra, França, Eslovênia e Holanda são os países europeus em que a banda mais costuma se apresentar.

Os lançamentos internacionais do Mestre Ambrósio, infelizmente, ainda são poucos - Fuá na Casa de CaBRal saiu no Japão, e olhe lá. "Não conseguimos convencer a Sony a investir nesse campo", lamenta o guitarrista. "As lojas lá de fora pedem muito o nosso primeiro CD, Mestre Ambrósio amostras de 30s (de 96), que é independente."