Miltinho Edilberto aposta na cruza de violas e sanfonas

O violeiro, um dos precursores do movimento forrozeiro em São Paulo, grava o seu terceiro disco com produção de Leandro Lehart, do Art Popular

Tom Cardoso
20/03/2001
Se hoje o Falamansa esbarra no milhão de discos vendidos, parte deste sucesso deve-se a Miltinho Edilberto. Folclorista, violeiro tarimbado, o compositor há anos peregrina por pequenas casas noturnas de São Paulo divulgando seu forró de estilo próprio, com forte influência da música caipira. Junto com outros grupos, como o Trio Virgulino e o próprio Falamansa, ajudou a consolidar o movimento do forró universitário, visto como a nova mina de outro da indústria fonográfica.

Miltinho recebeu a reportagem da CliqueMusic no estúdio caseiro do pagodeiro Leandro Lehart, líder do grupo Art Popular, que, junto com Arnaldo Saccomani, será o responsável pela produção de seu terceiro disco, a ser lançado pela DeckDisc/Abril Music. Fumando um cigarro de palha e testando acordes em sua viola de 10 cordas, o compositor de Mirandópolis, interior de São Paulo, diz não ter a pretensão de ser a bola da vez do forró universitário. "Não acho que vou chegar a um milhão de discos. Os rapazes do Falamansa estouraram porque, além de serem talentosos e bonitos, apareceram em todos os programas de televisão", diz Miltinho.

O violeiro acha que vários outros artistas têm o mesmo potencial de mercado do Falamansa. Ele cita como exemplos a banda carioca Forróçacana e os veteranos Trio Virgulino e Dominguinhos. "Imagine um músico com o carisma e talento como o Dominginhos tocando toda tarde no Faustão e no Gugu. Iria vender milhares de discos", aposta. Ao contrário do que pensa grande parte dos grandes forrozeiros, Miltinho não vê com pessimismo a nova onda, com grupos compostos por jovens bem nascidos de São Paulo e Rio de Janeiro. "De uma forma ou de outra eles estão abrindo o mercado para centenas de outros artistas. No pagode, por exemplo, as primeiras bandas eram formadas por branquelos. Hoje os negões, que entendem mesmo de samba, tomaram conta da cena."

Confundido com sertanejo
Apesar de ser apontando como um dos grandes representantes do forró universitário - até hoje se apresenta nas três principais casas do gênero em São Paulo (Remelexo, KVA e Projeto Equilíbrio), Miltinho não se considera um músico de forró. Tanto que, por não abrir mão do uso da viola em seus álbuns, já foi chamado de cantor sertanejo. "Não aceito rótulo nenhum. Se Jackson do Pandeiro, o rei do coco e da embolada, cantava acompanhado de viola, por que eu também não posso? As pessoas não entendem que o forró não é um gênero musical e sim uma grande festa onde se pode tocar xote, xaxado, coco, embolada, baião, maxixe e outros ritmos nordestinos."

Oswaldinho do Acordeom, Trio Virgulino, Tato (vocalista do Falamansa) e Leandro Lehart serão alguns do convidados do novo disco de Miltinho. A participação de uma grande cantora da MPB, que o músico não pode revelar, também é quase certa. Uma dica: Maria Bethânia tornou-se uma das fãs do compositor desde que gravou sua Não Tenha Medo no disco A Força que Nunca Seca. "Tenho a sorte e o privilégio de ser admirado por grandes artistas. Sei que a Elba gosta de meu trabalho e que Alceu ouviu uma música minha e disse: ‘É o cão chupando manga!’".

Miltinho se entusiasma para valer quando começa a falar sobre a atual força do movimento forrozeiro em São Paulo. Ele lembra que até o fim da década de 80, o único espaço dedicado à música nordestina era na boate Avenida, onde se apresentava a extinta banda Mexe com Tudo (que revelou a cantora Virgínia Rosa). Fora isso, os bailes de forró eram restritos à comunidade de migrantes nordestinos, com pouca estrutura e sem música ao vivo. "Naquela época, cantar forró não abria porta nenhuma. A classe média não consumia esse tipo de música, tinha um enorme preconceito".

O músico conta que foi preciso um grupo de universitários começar a freqüentar o Projeto Equilíbrio e o KVA, casas que apostaram no sucesso do forró, para que a música nordestina começasse a ser aceita pela classe média. "Isso tudo é maravilhoso. Não considero o forró universitário apenas um acontecimento musical. É um movimento comportamental e social, que passou por cima de todos os preconceitos."

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