O Brancaleone da MPB

A Itiberê Orquestra Família, formada por 32 músicos jovens e idealistas, faz rara apresentação no Rio de Janeiro, depois de passagem relâmpago por São Paulo

Nana Vaz de Castro
12/09/2000
Foto: Nana Vaz
Itiberê Orquestra Família
São 32 jovens, com idade média de 20 anos, armados com seus instrumentos – que vão de guitarra elétrica a escaleta, passando por violinos e flautas doces. Os ensaios podem durar até sete horas – e todos querem tocar o tempo inteiro. Assim como no filme O Incrível Exército de Brancaleone, de Mario Monicelli, as chances de sucesso, à primeira vista, não são muitas. Incrivelmente, o que reina não é o caos, e sim a harmonia, graças à condução do regente Itiberê Zwarg, 50 anos, idealizador da Orquestra Família que leva o seu nome.

Itiberê é o baixista que toca há 23 anos na banda do "bruxo" Hermeto Pascoal e há pouco mais de um ano comanda a orquestra, que nasceu depois de uma oficina promovido na escola Pro-Arte, no Rio. Quando a oficina (que contava com dez pessoas) acabou, ninguém quis que o trabalho ali desenvolvido terminasse. Os ensaios continuaram, mais gente foi chegando, outros foram saindo e enfim a "família" se formou.

O nome "Orquestra Família", segundo Itiberê, está diretamente relacionado ao sentimento que une todos os componentes. "Dentro do grupo tem casais de namorados, ex-namorados, irmãos, mas o clima é tão bom que esses laços não ficam pesados", garante o compositor. Dedicação, motivação e empenho foram requisitos básicos na hora de montar a orquestra. Os diferentes naipes (metais, cordas, base) ensaiam separadamente, por conta própria, fora do horário do ensaio geral, que acontece duas vezes por semana. Quem não se enquadrava acabou saindo naturalmente. Ser um grande instrumentista nem foi tão fundamental assim. "Teve gente que chegou aqui tocando quase nada e já melhorou muito. O importante é querer fazer som", diz o regente, totalmente integrado à filosofia Hermeto Pascoal de vida.

Aprendiz de feiticeiro
A influência hermetiana se faz presente todo o tempo. "Tocando com Hermeto, estamos sempre preparados para o inesperado", ilustra o baixista, que se coloca como uma espécie de herdeiro da tradição musical do genial músico alagoano. Com certeza Itiberê também já fez seus discípulos musicais. "É difícil estar na orquestra do Itiberê e tocar outros projetos ao mesmo tempo. Não é um trabalho como outro qualquer, exige muita entrega", confirma o trompetista Pedro Paulo Jr., um dos mais experientes do grupo, com 25 anos de idade. A dedicação que a orquestra exige já causou situações no mínimo embaraçosas. Itiberê conta que, tal qual um pretendente a namorado, já teve que conversar com pais apreensivos a respeito dos filhos, que de uma hora pra outra passaram a só pensar em música. "Alguns deles estão se assumindo agora como músicos profissionais. É um momento muito importante na vida deles, por isso procuro dar o maior apoio possível", reconhece o compositor.

O repertório da orquestra é composto por músicas de Itiberê, às vezes compostas durante os ensaios. "É o processo inverso: primeiro tocamos, fazemos o som, trabalhamos idéias, e depois eu falo para cada um colocar no papel, para não esquecer", explica, ressaltando que "música tem que ser tocada, e não lida". Mas que não se pense que impera a desorganização. Na hora de tocar, toda a bagunça se organiza milagrosamente, produzindo som de primeira qualidade. "Eu também cobro deles, que estudem, que cheguem no horário, que organizem as partituras em pastas", explica o músico paulista, há 23 anos no Rio.

Por causa do grande "efetivo" que compõe o exército musical de Itiberê, os shows são raros. Mas a orquestra encanta por onde passa, e quanto mais se apresenta, mais convites surgem. Em agosto foram dois dias no Sesc Vila Mariana e um show no Pororoca (ex-Vou Vivendo), ambos em São Paulo. Agora serão duas apresentações, dias 18 e 19, às 18h30, na Sala Funarte, no Rio. Quem quiser se surpreender não pode perder.

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