O que rolou no festival Com:Tradição, em São Paulo

Evento promoveu três noites de encontros entre malditos da MPB tradicional e nomes da nova geração

Bruna Bittencourt (SP)
11/07/2003
Quem esteve no teatro do Sesc Pompéia (SP) entre os dias 3 e 6 de julho pode assistir a novos nomes da música brasileira, ao lado de outros já consagrados. O festival Com:Tradição, organizado pelo jornalista e produtor musical Alex Antunes, traçou um panorama da nova cena independente, além de promover encontros inusitados. O que se viu foi uma diversidade de estilos – do rock ao hip hop, do samba a eletrônica – e artistas, com o experimentalismo em comum.

A primeira noite do evento, Pós-Femynysta – teve as mulheres como destaque. O grupo carioca mim, que tem à frente a vocalista Eva Leiz, foi o primeiro a se apresentar. Formado em sua maioria por mulheres (entre elas Anelis Assumpção, filha de Itamar Assumpção), o Dona Zica - que impressiona por sua afiada percussão - foi o destaque da noite. A cantora baiana Rebeca da Mata trouxe seu rock soturno. Elza Soares, acompanhada por Mugomango – pseudônimo do produtor Arthur Joly - e pela percussionista Simone Soul, cantou sucessos rejuvenescidos pelas releituras eletrônicas de Joly.

Jards Macalé e Arnaldo Baptista foram os nomes de peso da segunda noite, Retropycalysta. O paulista Curumim – ex-baterista de Paula Lima e Arnaldo Antunes - mostrou seu samba (muito influenciada por Jorge Ben Jor), que junta cavaquinho e programação eletrônica com um jeito displicente de cantar, em um show acima da média. Mesclando jovem guarda, eletro e brega, a ótima Karine Alexandrino apresentou suas letras bem humoradas (algumas em parceria com o também cearense Fernando Catatau, líder do Cidadão Instigado) e releituras como o clássico Feelings (Morris Albert). Moisés Santana convidou Arnaldo Baptista que surgiu cantando Cê Tá Pensando que Eu sou Lóki?. Arnaldo cantou sozinho ao piano, no momento mais emocionante do festival. A noite terminou com o trip hop dos cariocas do Vulgue Tostoi ao lado do tropicalista Jards Macalé.

O samba deu o tom a terceira noite do evento, Samb’ O’ Matyca. Formado por ex-integrantes das bandas olindenses Eddie – autora de Quando a Maré Encher, mais tarde interpretada por Cássia Eller e Nação Zumbi – e Sheik Tosado - grupo de frevo core –, o Bonsucesso Samba Clube mostrou sua fusão de côco, ciranda, dub, eletrônica e samba. Responsável por álbuns de Mestre Ambrósio, Zélia Duncan e Pato Fú, o produtor Beto Villares fez sua estréia como artista. O alogoano Wado fez um show onde destacaram-se suas composições como a ótima Tarja Preta. Bojo recebeu Maria Alcina, em um show no qual o grupo, menos eletrônico e mais relaxado, deu espaço para a irreverência de Maria Alcina, que facilmente conquistou o público.

O carioca Maurício Negão abriu a última noite do festival, Black do B. Segunda atração a se apresentar, o grupo paulista de hip hop Mamelo Sound System recebeu os multinstrumentistas Maurício Takara e Ganja Man (representando o núcleo Instituto), ao lado dos consagrados Naná Vasconcellos e J.T Meirelles. O que parecia díspar se mostrou coeso: os três convidados misturaram sua musicalidade as boas bases do grupo, como provou a faixa instrumental que uniu todos. Morador do Morro do Cantagalo (RJ), o compositor Adão Dãxalebaradã não pode se apresentar por problemas respiratórios, mas fez ali discurso pacifista. BNegão foi responsável por um dos melhores shows do festival. Acompanhado por sua ótima banda, os Seletores de Freqüência, o vocalista misturou rock e funk a letras engajadas, repletas de ecos e delays. Arriscou até um funk carioca – A Dança do Patinho. Passeou ainda pelo dub e resgatou uma faixa instrumental de Tim Maia – Necessário - para a qual acrescentou letra.

Apesar do público reduzido, o festival foi uma boa oportunidade para ver reunidos nomes que não freqüentam as FMs ou o cast das grandes gravadoras. Uns mais afiados e a vontade que outros, mas todos renovando a música brasileira e alimentando a cena independente, mais do que necessária nos dias atuais.