Pedro Mariano: com intuição e aceno à Elis Regina

Cantor lança terceiro disco apostando em repertório inédito, mas regrava canção lançada pela mãe

Marco Antonio Barbosa
02/07/2002
A temporada 2002 dos Artistas Reunidos está em franco progresso. O coletivo de jovens talentos agrupados em torno da gravadora paulista Trama já despachou este ano o segundo álbum de Jair Oliveira (Outro ouvir 30s ) e pretende lançar, até o fim do ano, os novos discos de Max de Castro e Daniel Carlomagno. Entre um e outros, porém, com o estofo de ter dado ao selo seu primeiro disco de ouro (pela venda de mais de 100 mil cópias de Voz No Ouvido ouvir 30s , seu CD anterior), chega Pedro Mariano e seu mais recente trabalho, Intuição ouvir 30s . Um som que faz uma ponte natural com as obras anteriores do cantor; um bom punhado de canções inéditas; uma homenagem à mãe Elis Regina - falecida há 20 anos; e, claro, muita intuição, são as armas que Pedro usa neste seu retorno.

Como está claro no título do disco, Pedro Mariano não nega que a intuição ocupe um grande espaço em sua vida e seu trabalho. "Eu me considero um cara intuitivo. Tomo muitas decisões guiados pelo feeling. E isso se aplica especialmente em relação à música, que acaba aguçando minha intuição", considera o cantor. No disco novo, produzido por ele, o pai César Camargo Mariano e Otávio de Morais, esta abordagem instintiva aflorou, por exemplo, na gravação dos vocais - sempre feitos pelo cantor em um só take, depois que todos os instrumentos já tinham sido gravados. "Meu pai fica tenso com este método de trabalho. Mas minhas opções são totalmente pessoais. Assim, acho que o caminho que tomo fica mais vivo", fala Pedro.

Uma vida que se manifesta especialmente em 20 Anos Blues, pinçada do repertório de Elis Regina à guisa de homenagem. A canção (de Sueli Costa e Victor Martins) foi gravada ao vivo e transposta para o CD sem nenhum retoque. "Ela gravou essa em 1972. Era a única canção do repertório dela que falava em '20 anos', daí a opção", explica Pedro. Ele prossegue: "Não participei de festa nem de tributo algum a ela este ano. Então resolvi fazer minha homenagem pessoal agora." Além de prestar o respeito à grande cantora que Elis foi, Pedro também aproveita para repensar o papel que a mãe teve em sua formação. "Musicalmente, meu pai foi mais importante para mim. Mas minha mãe me influenciou em tudo, na vida mesmo. É uma responsabilidade ser visto como 'herdeiro' dela, as pessoas ainda me cobram isso. O que ela fez é intocável, não dá para seguir. Mas uma hora essa história passa."

Apesar da inclusão de 20 Anos Blues, a tônica de Intuição são as músicas inéditas. Pedro Mariano reflete bem-humorado sobre o processo de seleção musical: "Graças a Deus, eu não componho. Poupo a humanidade desse mal. O que eu componho é a escolha do meu repertório; meus discos são 'compostos' por mim com base nas coisas que ouço." E ele ouve, naturalmente, a rapaziada dos Artistas Reunidos, que comparece com quatro faixas: O Amor se Acaba e Tudo Certo, ambas de Jair Oliveira, e Distante Calma e Furacão, de Daniel Carlomagno. Jorge Vercilo contribui com Pode Ser. Uma possível surpresa é a colaboração com os membros do Pato Fu, que cederam 5 Discos ("É a minha favorita do disco", diz Pedro) e Por Amar.

"Acho que a MPB nunca esteve tão bem representada quanto a nova geração", fala Pedro, confiante. Por isso, a escolha preferencial por compositores contemporâneos. "Muitos intérpretes olham muito para o passado na hora de escolher seu repertório. É sempre Tropicália, Bossa Nova. Comigo é diferente; sinto-me obrigado a retratar a minha geração", diz. A opção por material inédito causa eventuais atrasos no cronograma. "Para conseguir uma música do Jair (Oliveira) ou do Daniel (Carlomagno) é difícil, porque compõem primeiramente para eles mesmos. Já em relação ao Pato Fu, eu pedi uma música a eles - sem pretensão alguma - e estava disposto até a regravar alguma antiga, desde que não fosse muito batida. Acabei ganhando duas inéditas", narra.

Complementando a safra de novidades, Pedro Mariano apresenta as regravações de Você Vai Ver (Tom Jobim), De Repente (Lulu Santos/Nelson Motta) e Preciso Dizer que Te Amo (Cazuza/Frejat). A música de Tom Jobim acabou sendo gravada com Zélia Duncan. "Quem me indicou Você Vai Ver foi meu irmão (João Marcello Bôscoli, presidente da Trama) e quando eu ouvi uma versão que meu pai gravou com a Leny Andrade me apaixonei pela canção. Pensei na Zélia de cara para gravar comigo", fala Pedro. Preciso Dizer... já havia sido gravada pelo cantor num álbum-tributo a Cazuza, em 1998. Tudo se encaixa de modo exemplar à sonoridade do disco, que mantém o sotaque soul-pop dos trabalhos anteriores, com mais sutileza.