Racionais MCs preparam novo ataque

Com o título provisório de Vida Lôca, o próximo disco da celebrada banda paulistana de rap sai até o fim do ano. O rapper Edy Rock fala sobre as novas músicas e antecipa trecho de letra

Tom Cardoso
21/08/2000
Edy Rock é o mais discreto e sangue bom dos integrantes do grupo de rap Racionais MCs. Gosta de ler biografias de seus ídolos (Marx, Fidel Castro, Che Guevara e Lênin), de ajudar a comunidade do Jaçanã (bairro da Zona Norte de São Paulo) e, principalmente, de compor. Já escreveu quatro canções para o próximo disco do grupo, que deve chegar às lojas no fim do ano pelo selo da banda, o Cosa Nostra (distribuído pela Sony Music). Esse é, desde muito tempo, um dos discos mais esperados do ano – o anterior, Sobrevivendo no Inferno, bateu a marca dos 500 mil álbuns vendidos dentro de um esquema de distribuição absolutamente alternativo. E o pungente videoclipe da música Diário de um Detento (filmado no presídio do Carandiru) só fez aumentar a fama dos Racionais: foi eleito pela audiência da MTV o melhor do ano de 1998.

Diante da expectativa, Edy Rock vai avisando que, no que depender dele, pouca coisa muda no front do grupo: "A minha inspiração continua a mesma. Enquanto houver desigualdade social e violência na periferia, minha fonte não vai secar", diz o rapper que, ao lado de Mano Brown, é a cabeça pensante do Racionais e responsável pela produção das faixas e edição das músicas. "A gente compõe cada um na sua casa e depois discute todo mundo junto o conteúdo das letras. Nenhuma decisão é tomada individualmente".

A forte união entre os quatro racionais derruba qualquer tese de separação da banda, boato que surgiu com força na imprensa depois que Mano Brown e KL Lay anunciaram alguns projetos solos. "Cada um tem os seus planos, mas nunca pensamos em acabar com o grupo", afirma o rapper, autor de pelo menos metade das faixas do novo disco, que tem o título provisório de Vida Lôca, nome de uma música composta por Mano Brown.

Tim Maia e Cassiano
Fã de black music, Edy confessa que o seu grande sonho era convidar Tim Maia para participar de um disco dos Racionais. "Ele era um cara que eu admirava e respeitava, que falava o que queria", elogia. Na falta de Tim, ele convidou outro grande nome da música black brasileira: o soulman Cassiano. "O (Mano) Brown já conversou com ele, que topou na hora, só falta entrar em estúdio". Além de Cassiano, o grupo pensa em convidar outro ídolo, Jorge Ben Jor. Os Racionais gravaram uma canção dele em Sobrevivendo no Inferno: o clássico Jorge da Capadócia.

Até mesmo Cazuza, compositor de pouca afinidade com o grupo, deve ser lembrado no novo disco, na faixa A Cada 13 Minutos (leia letra abaixo), composta por Edy. "Nunca ouvi muito Cazuza, mas gostava daquela música em que ele dizia que "o tempo não pára". Resolvi colocar essa frase dentro dessa minha canção, que fala sobre o alto índice de criminalidade no Brasil, onde ocorrem 40 mil homicídios por ano e 13 por minuto".

Mais duas composições de Edy vão descrever a frenética violência nas cidades brasileiras – Vai e Vem do Crime e 5 Minutos de Paz, esta última um relato sobre a importância da música no combate à criminalidade. "Quando a pessoa está ouvindo uma canção, ela se desliga de tudo. Naqueles poucos cinco minutos tira a maldade da mente para pensar em coisas positivas", filosofa o compositor, que faz questão de cantar um trecho da faixa: "O ódio é um espinho pro coração/ A vingança é um veneno pra alma/ Cada lugar tem um louco/ Cada louco uma mania/ Cada mania uma loucura".

Parceria na cadeia
Edy ainda não sabe se todas as suas canções compostas este ano vão entrar no disco, pois a decisão final é sempre do grupo. Porém, uma das faixas é presença certa no próximo álbum: Carta, escrita em parceria com Dexter, vocalista do 509-E, grupo formado por presos da Casa de Detenção de São Paulo. "A gente troca cartas há um bom tempo e decidimos usar essa correspondência como fonte de inspiração para uma nova música", conta, enquanto espera uma autorização da organização do presídio para gravar a participação dos amigos no CD. Vem coisa boa por aí.



A Cada 13 Minutos (Edy Rock)

Mais uma vez estou aqui, andando pela selva
São Paulo, seja bem-vindo colega
Aqui não pára. O tempo não pára.
Psicopata de quebrada mete bala
Pense rápido, não respire
Se for mais rápido, então atire
Quem pensa duas vezes perde a vida
Infelizmente não temos outra alternativa
Quem foi feito pra te proteger
Te confunde com alguém
Que faz seu sangue escorrer
A menina do olho brilha
O ódio domina gerando mais uma quadrilha
Tá no crime, a flor da pele
Quem é ferido, com ferro fere
A arma de fogo impõe respeito
No submundo é desse jeito