Rafael Ramos cresce e produz novo João Donato
Ex-VJ da MTV, ex-integrante do Baba Cósmica e descobridor dos Mamonas Assassinas, rapaz de 21 anos ganhou a admiração do pré-bossanovista por ter produzido Anna Júlia
Silvio Essinger
09/04/2001
Não é de hoje que Rafael Ramos anda envolvido com a indústria fonográfica. No começo da adolescência, ele convenceu o pai, João Augusto (atual diretor artístico da Abril Music, então ocupando o mesmo cargo na EMI) a escutar com boa vontade a fita demo de uma banda chamada Mamonas Assassinas. O resultado: o primeiro disco daqueles que João inicialmente achou que eram "imitadores dos Raimundos" em pouco tempo bateu a marca inacreditável de mais de dois milhões de cópias vendidas.
Na esteira da notoriedade precoce, Rafael gravou dois discos com a finada banda de rock adolescente Baba Cósmica (o primeiro, tocando bateria; o segundo, cantando) e foi apresentador, junto com a VJ Cris Nicklas, do programa Quiz MTV, de perguntas-e-respostas. Agora, aos 21 anos de idade, o rapaz brincalhão encara com seriedade o primeiro grande desafio de sua vida: produzir o primeiro disco de inéditas em 15 anos de um dos músicos mais cultuados da MPB: João Donato.
Parece loucura, mas nem tanto assim quando se analisa a trajetória de Rafael. Ele já tem em seu currículo de produtor os discos Los Hermanos ( estréia da banda carioca, que traz o sucesso Anna Júlia), O Barulho dos Inocentes (dos punks paulistanos Inocentes), Já (dos brasilienses do Maskavo), O Circo Está Armado ( dos paranaenses do Relespública), Registro Sonoro Oficial ( dos gaúchos do Video Hits, além dos discos de estréia das bandas cariocas Matanza e MCs HCs, que saem em breve, respectivamente, pela Deck e pela Abril Music.
O disco de Donato é, portanto, o seu primeiro fora do rock. E não podia ser outro, afinal foi por conta do pianista e compositor acreano, um dos pais da bossa nova, que ele despertou para a MPB. "O CD Coisas Tão Simples (de 97) mudou minha visão", conta ele. "Antes, eu usava camisa preta e ouvia Obituary (banda americana de death metal)." Hoje, Rafael é um grande interessado pela música de mestres como Gilberto Gil e Chico Buarque. "Mas não virei assim um connaisseur de MPB", admite.
Coisas Tão Simples foi um disco que nasceu logo depois que a mãe de Rafael, a produtora Mônica Ramos, trabalhou com Donato em um disco da nissei Lisa Ono destinado ao mercado japonês. Da amizade, veio o convite para que o músico gravasse seu disco de inéditas para a DeckDisc - selo de Mônica e João Augusto, que tem uma mina de ouro de forró universitário (as bandas Falamansa e Rastapé - leia matéria), a série de CDs O Som do Barzinho, além dos revividos Ira! e Ultraje a Rigor. Quando soube que a mãe não queria um disco careta para Donato, Rafael se candidatou, meio de brincadeira. O convite - que quase deixou o rapaz catatônico - veio do próprio músico, que, reza a lenda, teria dito: "O cara que gravou Anna Júlia é quem vai me fazer tocar no rádio."
Aprendendo a deixar o barco correr
Com as gravações quase completas (faltam algumas vozes, metais e convidados especiais) e as mixagens em curso, Rafael tira um tempo para contar a história desse disco, que foi todo registrado no renomado estúdio AR, na Barra da Tijuca (RJ). "Queria ter o melhor ambiente possível", conta o produtor, informando que Donato gravou num piano que ficava de frente para um jardim, só para manter a descontração. Confesso metódico, ele não esconde que teve alguns problemas, já que o artista em questão é tudo, menos metódico. "Donato está me ensinando a ouvir, sentir e deixar o barco correr", diz, lembrando que o disco deveria ter sido lançado agora em abril ("Mas a gente aprendeu que com o Donato não pode ter data marcada").
Rafael optou por uma banda de craques para gravar todas as bases: Jurim Moreira (bateria), Jamil Joanes (baixo) e Ricardo Silveira (guitarra). Participação especial, até agora, só a do tecladista Fábio Fonseca, com quem Donato faz dueto em uma música, com alguns teclados dos anos 70, como Clavinets e Mini Moogs (que desde aquela década o músico não tocava). Como bom produtor, o rapaz não quer deixar vazar muitas informações sobre o disco, mas adianta que ele será "mais brasileiro e menos jazzístico" e que há material para pelo menos dois CDs.
Tem mais: Donato canta em todas as faixas, que navegam pela bossa nova, salsa, mambo, rock, funk e até o drum'n’bass - só que tocado em baixo e bateria. Preocupado com a excelência instrumental, Rafael preferiu evitar as eletrônicas. "Quis pegar o bom feeling das gravações", diz, ressaltando que Donato está num momento muito criativo e produtivo. "Tive muita sorte", conta. Com a convivência, o rapaz sentiu-se à vontade para atualizar musicalmente o mestre, passando-lhe discos de artistas como Dave Matthews Band, Jungle Brothers e D'Angelo, que, por sinal, ele tem devorado com voracidade.
Passado hardcore
De uns tempos para cá, Rafael resolveu se dedicar somente à produção e à DeckDisc (onde cuida da edição de novos artistas). Tanto que largou a MTV, a faculdade de Comunicação, e, bem antes, a Tamborete Entertainment, selo de rock pesado que agora é gerenciado por Leonardo Panço, fanzineiro e guitarrista da banda de hardcore Jason (no qual ele tocava bateria com a proteção do pseudônimo Azeitona). Foi Rafael, aliás, quem produziu os dois discos do Jason, Odeia Eu ( 98) e Eu Sou Quase Fã de Mim Mesmo ( 2000), lançados pela Tamborete.
Enquanto a banda segue em turnê pelos buracos alternativos da Europa, ele fica aqui, produzindo discos. Entre eles, o mais novo solo do ex-Kid Abelha Leoni, o de Fred Martins (compositor niteroiense gravado por Ney Matogrosso e Zélia Duncan), o próximo do Maskavo e o da banda Bois de Gerião (para a BMG). E continua atrás de novos artistas para a Deck. "Não deixo de ir a um show underground, a um show grande, a um camarim", jura.
Na esteira da notoriedade precoce, Rafael gravou dois discos com a finada banda de rock adolescente Baba Cósmica (o primeiro, tocando bateria; o segundo, cantando) e foi apresentador, junto com a VJ Cris Nicklas, do programa Quiz MTV, de perguntas-e-respostas. Agora, aos 21 anos de idade, o rapaz brincalhão encara com seriedade o primeiro grande desafio de sua vida: produzir o primeiro disco de inéditas em 15 anos de um dos músicos mais cultuados da MPB: João Donato.
Parece loucura, mas nem tanto assim quando se analisa a trajetória de Rafael. Ele já tem em seu currículo de produtor os discos Los Hermanos ( estréia da banda carioca, que traz o sucesso Anna Júlia), O Barulho dos Inocentes (dos punks paulistanos Inocentes), Já (dos brasilienses do Maskavo), O Circo Está Armado ( dos paranaenses do Relespública), Registro Sonoro Oficial ( dos gaúchos do Video Hits, além dos discos de estréia das bandas cariocas Matanza e MCs HCs, que saem em breve, respectivamente, pela Deck e pela Abril Music.
O disco de Donato é, portanto, o seu primeiro fora do rock. E não podia ser outro, afinal foi por conta do pianista e compositor acreano, um dos pais da bossa nova, que ele despertou para a MPB. "O CD Coisas Tão Simples (de 97) mudou minha visão", conta ele. "Antes, eu usava camisa preta e ouvia Obituary (banda americana de death metal)." Hoje, Rafael é um grande interessado pela música de mestres como Gilberto Gil e Chico Buarque. "Mas não virei assim um connaisseur de MPB", admite.
Coisas Tão Simples foi um disco que nasceu logo depois que a mãe de Rafael, a produtora Mônica Ramos, trabalhou com Donato em um disco da nissei Lisa Ono destinado ao mercado japonês. Da amizade, veio o convite para que o músico gravasse seu disco de inéditas para a DeckDisc - selo de Mônica e João Augusto, que tem uma mina de ouro de forró universitário (as bandas Falamansa e Rastapé - leia matéria), a série de CDs O Som do Barzinho, além dos revividos Ira! e Ultraje a Rigor. Quando soube que a mãe não queria um disco careta para Donato, Rafael se candidatou, meio de brincadeira. O convite - que quase deixou o rapaz catatônico - veio do próprio músico, que, reza a lenda, teria dito: "O cara que gravou Anna Júlia é quem vai me fazer tocar no rádio."
Rafael no AR, mixando o novo Donato
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Com as gravações quase completas (faltam algumas vozes, metais e convidados especiais) e as mixagens em curso, Rafael tira um tempo para contar a história desse disco, que foi todo registrado no renomado estúdio AR, na Barra da Tijuca (RJ). "Queria ter o melhor ambiente possível", conta o produtor, informando que Donato gravou num piano que ficava de frente para um jardim, só para manter a descontração. Confesso metódico, ele não esconde que teve alguns problemas, já que o artista em questão é tudo, menos metódico. "Donato está me ensinando a ouvir, sentir e deixar o barco correr", diz, lembrando que o disco deveria ter sido lançado agora em abril ("Mas a gente aprendeu que com o Donato não pode ter data marcada").
Rafael optou por uma banda de craques para gravar todas as bases: Jurim Moreira (bateria), Jamil Joanes (baixo) e Ricardo Silveira (guitarra). Participação especial, até agora, só a do tecladista Fábio Fonseca, com quem Donato faz dueto em uma música, com alguns teclados dos anos 70, como Clavinets e Mini Moogs (que desde aquela década o músico não tocava). Como bom produtor, o rapaz não quer deixar vazar muitas informações sobre o disco, mas adianta que ele será "mais brasileiro e menos jazzístico" e que há material para pelo menos dois CDs.
Tem mais: Donato canta em todas as faixas, que navegam pela bossa nova, salsa, mambo, rock, funk e até o drum'n’bass - só que tocado em baixo e bateria. Preocupado com a excelência instrumental, Rafael preferiu evitar as eletrônicas. "Quis pegar o bom feeling das gravações", diz, ressaltando que Donato está num momento muito criativo e produtivo. "Tive muita sorte", conta. Com a convivência, o rapaz sentiu-se à vontade para atualizar musicalmente o mestre, passando-lhe discos de artistas como Dave Matthews Band, Jungle Brothers e D'Angelo, que, por sinal, ele tem devorado com voracidade.
Passado hardcore
De uns tempos para cá, Rafael resolveu se dedicar somente à produção e à DeckDisc (onde cuida da edição de novos artistas). Tanto que largou a MTV, a faculdade de Comunicação, e, bem antes, a Tamborete Entertainment, selo de rock pesado que agora é gerenciado por Leonardo Panço, fanzineiro e guitarrista da banda de hardcore Jason (no qual ele tocava bateria com a proteção do pseudônimo Azeitona). Foi Rafael, aliás, quem produziu os dois discos do Jason, Odeia Eu ( 98) e Eu Sou Quase Fã de Mim Mesmo ( 2000), lançados pela Tamborete.
Enquanto a banda segue em turnê pelos buracos alternativos da Europa, ele fica aqui, produzindo discos. Entre eles, o mais novo solo do ex-Kid Abelha Leoni, o de Fred Martins (compositor niteroiense gravado por Ney Matogrosso e Zélia Duncan), o próximo do Maskavo e o da banda Bois de Gerião (para a BMG). E continua atrás de novos artistas para a Deck. "Não deixo de ir a um show underground, a um show grande, a um camarim", jura.