Rebeldia e farra no rock de Minas Gerais

Mary’s Band grava CD de estréia apostando num som adolescente onde prevalece o trio básico: sexo, drogas e rock’n’roll

Rodrigo Faour
17/10/2000
Depois da fase do Clube da Esquina, Minas Gerais está invadindo o Brasil com sons cada vez mais pops e internacionais. Em, seguida ao pop dançante de Pato Fu, Skank e Jota Quest, agora é a vez do rock adolescente com acento punk da Mary’s Band. Que ninguém os compare com seus conterrâneos. É um fenômeno inédito na música mineira porque trata-se de músicas que versam sobre o velho trio "sexo, drogas e rock’n’roll", envoltos em guitarras, com direito a toda imagem marrenta a que têm direito na capa do disco. Formada há quatro anos por quatro jovens entre 21 e 24 anos, a banda originalmente possuía um nome maior e mais polêmico – Mary’s Band Ruana – numa referência explícita à maconha. Através de Henrique Portugal, do Skank, foi feito o contato com a Sony Music que contratou a banda e lança já com o nome abreviado o CD Tô Virado (leia crítica). O lançamento no Rio será no Ballroom, dia 22, abrindo para Mark Ramone, ex-baterista dos Ramones, e em São Paulo, nos dias 10 e 11, abrindo para os compadres do Jota Quest.

Orlando Andra, vocalista, baixista e líder da banda, 24, é bastante simpático, educado e até gentil. Pelo menos é a impressão passada por ele na entrevista que concedeu a CliqueMusic. Ninguém imaginaria que seria ele o autor de canções com títulos sugestivos (nada bem comportados) como Coliforme Fecal, Minha Mãe Tá Louca ou Happy Birthday (Fuck You!!!). Mais uma prova de que a proposta atual da banda é mesmo divertir e não ter uma postura agressiva. Aliás, o nome da banda foi mudado para não acumular mais problemas do que os que já colecionavam no passado por sua postura rebelde. "Sempre houve um preconceito com relação ao nome da banda. Tínhamos um CD independente e os diretores das escolas nas quais a gente tocava seqüestravam os nossos CDs. O pior é que os diretores eram todos uns doidões! (risos) Então, trocamos o nome para viabilizar nosso som porque a gente vive de música", explica Orlando, que, assim como os outros integrantes, largou a faculdade e cursos afins para dedicar-se à música.

De assalto à igreja aos estúdios da Sony
Quando eram adolescentes, os integrantes da Mary’s Band eram bastante tinhosos e para arrumarem seus instrumentos fizeram algo bem "rock’n’roll". "Saqueamos uma igreja para conseguir nossos instrumentos, porque eles tinham um monte de instrumentos jogados num canto. Ficávamos indignados porque essa igreja era riquíssima, estava reformando e colocando piso de granito. E a gente nem foi tão radical, pegamos uns instrumentos mais velhos, e eles nem deram pela falta", surpreende Orlando. Eles chegaram a formar a banda Os Farmacêuticos, com um amigo mais velho, Félix, que os iniciou em Ramones, Sex Pistols, UK Subs, Lou Reed, Stray Cats e New York Dolls – algumas de suas influências mais marcantes, ao invés de Guns’n’Roses e Metallica, que faziam mais sucesso entre seus colegas de geração.

Para uma banda de rapazes tão novos não é fácil estrear logo de cara numa gravadora grande como a Sony. Orlando diz que isso não veio do céu, que eles têm estrada. "Mudamos em 98 do interior para Belo Horizonte e, já no primeiro ano de atuação na capital, a gente saiu tocando em todos os lugares e despertamos interesse de outras bandas. O Capital Inicial foi a primeira banda a dar força, depois a revista Rock News nos levou até o pessoal do Green Day (espécie de espelho sonoro do grupo), que aprovou que a gente abrisse seus shows no Brasil. Acabou que em 99 fechamos o ano com um saldo de 120 shows e fizemos um bafafá no mercado", justifica.

Política, drogas e supermães
A maioria das letras da Mary’s Band trata de excessos de adolescentes rebeldes. Numa música eles querem dinheiro do pai para ir ao motel (Pai Me Dê Grana), em outra ele quer porque quer transar com uma garota (Vestibular), noutra há considerações "edificantes" sobre excrementos (Coliforme Fecal) e em várias há referências explícitas a "viagens" barra pesada e dependências de vícios (Cansei, Abagabalô, Tô Virado, Massa Cefálica). Na verdade, essas últimas são autobiográficas. "A gente passou e sofreu na pele muitas coisas desse tipo, como problemas com drogas pesadas e polícia. Mas a gente era de menor. Na época do nosso grupo Os Farmacêuticos, éramos muito loucos, mas teve uma hora que a gente se sentiu vazio. Mas graças a Deus, demos a volta por cima. Acho que, assim como digo em Happy Birthday, não existe dia feliz, a gente tem que viver o dia de hoje como se fosse o último. Desde o momento que a gente nasce já começa a contagem regressiva para morrer", acredita.

Já que eles já passaram por maus lençóis por conta de drogas, será que eles se engajariam em algum tipo de campanha contra elas? Orlando diz que não. E diz que pessoalmente crê que o homem de verdade é aquele que entra e consegue sair das drogas. Mas ainda acha cedo para posicionar-se a respeito. "Não tenho capacidade de responder a essa pergunta com total firmeza agora", admite.

A faixa mais divertida do CD é uma bem humorada crítica à superproteção materna (Minha Mãe Tá Louca), que diz "Tesão mal resolvido; ‘Vê se me entende, mãe, eu sou seu filho!’ Minha mãe tá louca/ Louca pra beijar minha boca". O que a mãe de Orlando achou da letra do filho? "É uma homenagem a ela porque ela me adorava tanto... fui um garoto-problema na minha infância e mesmo quando meu pai ficava contra mim, ela estava sempre do meu lado. Fiz essa música de sacanagem mesmo. Só sei que ela vai nos shows e pira com essa música", diverte-se.