Sandra de Sá renova fórmula funk-soul-romântica

Cantora faz duetos com Gabriel Pensador, Cássia Eller e Falcão do Rappa em Momentos Que Marcam Demais, seu 13º disco em 20 anos de carreira

Silvio Essinger
27/06/2000
"Não sou estrategista", avisa Sandra de Sá. Na hora de escolher repertório para seus discos, ela recorre ao mesmo expediente: orienta-se "pelo que está batendo, pelo que arrepia". Foi mais uma vez assim que a cantora fez em seu 13° e mais novo álbum, Momentos Que Marcam Demais (leia crítica). "Apesar de ter ouvido muitas críticas de que tinha um repertório perdido, é isso que dá certo. Graças a Deus hoje percebo isso, antes costumava ficar grilada", diz, expressando um certo alívio. À beira de completar os 45 anos de idade e os 20 de carreira, Sandra não escapou, porém, de algumas mudanças.

Depois de um tempo em que passou "travada", voltou subitamente a compor. E com novos parceiros: a cantora Renata Arruda (em Faço de Tudo e Nós) e o cantor e compositor Zé Ricardo (Dançando com a Vida). "Pode parecer pouco tempo, mas as parcerias são do tipo Roberto e Erasmo", garante. Na versão em português de Forever Don´t Last (umas das músicas inéditas que a matriz da gravadora Warner enviou para sua apreciação), ela aprontou outra: chamou a amiga Elba Ramalho para dividir o trabalho – o resultado pode ser ouvido em A Cor do Teu Sorriso.

Momentos Que Marcam Demais ainda não é uma comemoração, diz Sandra. "O grande lance vai ser os 21 anos, na entrada do século 21", diz. Ela lembra bem de quando deixou de ser só a estudante de Psicologia da Gama Filho que tocava violão e cantava nas horas vagas: finalista do Festival MPB 80, cantou sua Demônio Colorido na frente de 20 mil pessoas no Maracanãzinho. "Eu parecia um pastel, nunca desafinei tanto", diverte-se. A música não ganhou nada, mas a carreira de cantora deslanchou. Logo, Sandra estaria fazendo sucesso com outra música, o funk Olhos Coloridos, que é revisitado no novo disco em Dançando com a Vida. "Percebi [essa conexão] mais nitidamente agora", admite.

Músicas de Peninha e do Roupa Nova
A cantora diz que Momentos é um disco "altamente romântico, beirando o bregão, mas com muito bom gosto". Depois de (indiretamente) ressuscitar Peninha para as paradas de sucesso – sua gravação de Sozinho em 1997 chamou a atenção de Caetano Veloso, que decidiu regravá-la e a transformou no maior sucesso comercial de sua carreira –, Sandra volta ao compositor com Outra Onda. "Era uma música daquela mesma leva", avisa. Morrer de Amor, por sua vez, é da dupla Nando e Ricardo Feghali, do Roupa Nova – que, por sinal, é a banda que acompanha a cantora na faixa.

As participações especiais dão um sabor especial a Momentos Que Marcam Demais. Dançando com a Vida tem o rap de Gabriel o Pensador. "Depois de Nelson Motta e do Guto Graça Mello, o Gabriel é o branco mais criouleba que eu conheço. Ele fala a coisa de um jeito que tanto uma criança quanto um velho entendem", elogia. Soul, de Pedro Luís, conta com vocais de outro novo talento: Falcão, do Rappa. Já Um Tiro No Coração, do titã Nando Reis, é cantada em dueto com Cássia Eller. "Sempre tive vontade de gravar uma música do Nando", diz Sandra. "E quando vi a Cássia cantando suas músicas terrivelmente – no bom sentido – vi que tinha que ser ela a cantar comigo"

Tida muito justamente como a rainha do soul brasileiro, Sandra de Sá vem acompanhando o interesse – culto, por vezes – que colegas e contemporâneos seus como Cassiano e a Banda Black Rio despertaram entre a juventude soul de hoje em dia. "A coisa não se fortaleceu porque éramos muito mais livres – era difícil de acreditar que aquele trabalho era sério", analisa. "Passávamos noites e noites no estúdio do Robson Jorge e Lincoln Ollivetti tocando e gravando. Era tudo muito na frente do seu tempo – o som da Black Rio, a cabeça do Cassiano..." Por falar no autor de A Lua e Eu, ela destaca um ensinamento do mestre: "O grande lance da música é o que a gente não canta". Para Sandra, a nova turma do soul brasileiro tem garra, mas a eletrônica deu uma travada na criatividade. "As pessoas deveriam ouvir mais a outra época. Se fizessem com o som daquela época o que se faz hoje com o pagode...", sonha.

Sandra ainda se aborrece com a "crueldade" do meio musical no Brasil: "O Frank Sinatra é isso tudo – mas por que o Jamelão não pode ser também? O Cauby, por exemplo, é muito melhor que o Tom Jones." Ela lamenta que os músicos não sejam mais engajados e solidários. "O Lobão é a única pessoa que pode botar a boca no trombone – nem eu posso!", brinca. E se é para por a boca no trombone, a cantora cobra o seu disco ao vivo. "Há muito tempo quero gravar um. Todas a gravadoras por que passei me enrolaram. Mas agora está perto, é o que eu mais quero no momento."