Songbook de João Bosco traz 131 canções

Além dos três livros, uma trinca de CDs reúne boa parte da nata da MPB em releituras de seu repertório

Mônica Loureiro
08/09/2003
Idealizador da série "Songbook" no Brasil, Almir Chediak deixou como último trabalho três volumes e três CDs do amigo João Bosco. Ao ser brutalmente assassinado em maio deste ano, o violonista, produtor e compositor já havia finalizado o material e ansiava lançá-lo no final de julho. "Eu estava na temporada do Malabaristas do Sinal Vermelho, no (Teatro) Rival, no Rio de Janeiro, e lembro que ele deixou para ir na segunda semana de apresentação. Foi quando aconteceu o crime", lembra, triste, João Bosco. E é no mesmo teatro que acontece hoje o lançamento oficial do songbook.

As últimas conversas entre João e Chediak foram por telefone, sobre as gravações de Papel Marché e Corsário. "As gravações de Yamandú Costa com Paula Toller e de Daniela Mercury foram as últimas, e Almir tinha deixado lá em casa para eu ouvir", conta. João participou de todos os songbooks de Chediak. O primeiro, de Caetano Veloso, foi lançado em 1988, mas só a partir do de Noel Rosa, em 1991, os volumes começaram a ser acompanhados por CDs com gravações exclusivas - quando foi criada a Lumiar Discos.

A idéia de produzir o de João veio em 1989: "Ele quis fazer naquela época, mas é um trabalho muito demorado. Ouvir fitas, colocar tudo em partituras, revisar, conciliar agendas, gravar... Só mesmo Chediak conhecia esse processo e sabia organizar tudo. Há dois anos falamos: 'Vamos fazer agora!'. Então intensificamos o processo e para isso nos encontrávamos semanalmente".

O trabalho é composto por três volumes que reúnem 131 canções, com letras cifradas e partituras. Os três CDs têm 46 faixas, interpretadas por mais de 50 artistas. Mas as peças podem ser adquiridas separadamente. "É um trabalho que não tem aquele efeito imediato, de lançamento. Sempre estará em catálogo. Aliás, temos que, de alguma maneira, ajudar para que a idéia dos songbooks permaneça. O acervo da Lumiar é muito grande e importante", destaca João. O artista lembra que as produções de Chediak seguiam sempre uma proposta definida: "No livro, as partituras são fiéis às músicas originais, e no disco, a interpretação fica à critério do artista, que pode fazer sua própria leitura".

Os volumes trazem uma entrevista de João feita pelo próprio Chediak, textos de Zuza Homem de Mello e Sérgio Cabral e muitas fotos. "Um texto analítico da obra e uma biografia são muito importantes. Afinal, a gente sempre aprende algo com a vida das pessoas!", diz.

Os CDs contam com a participação de artistas de várias vertentes da música brasileira. Milton Nascimento (Caça à Raposa), Chico Buarque (Incompatibilidade de Gênios), Alcione (Coisa Feita), Elba Ramalho (Flor de Ingazeira), Cauby Peixoto (Dois pra Lá, Dois pra Cá), Lenine (O Ronco da Cuíca) e Djavan (Desenho de Giz) são apenas alguns dos que emprestam a voz e um novo olhar para as canções mais conhecidas de João. "Daniela Mercury (que interpreta Corsário no songbook), quando se apresentava na Bahia e ainda nem havia gravado, cantava meu repertório. A Ana Carolina, em seu início de carreira em Minas (ela canta Linha de Passe) também. O Arnaldo Antunes, eu conheço desde o princípio dos Titãs, e o admiro muito. Quando pensei em Mama Palavra, sabia que só havia ele para cantá-la", comenta João sobre outras participações.

João, por sua vez, está presente em uma faixa de cada CD. "A princípio, eu não participaria de nenhuma música. Afinal, um songbook registra a obra, não o autor. Mas eles me convidaram para cantar e tocar", diz. Ele se refere a Simone, Martinho da Vila e Aldir Blanc, que interpretam, respectivamente, Nação, O Mestre-sala dos Mares e O Bêbado e a Equilibrista. "Simone e Martinho quiseram apenas meu violão; Aldir preferiu cantar comigo e ser acompanhado por seus músicos", detalha.

Sobre o reencontro com seu velho parceiro Aldir - após uma separação de mais de 20 anos -, João encara com toda naturalidade. "Com Aldir nunca é reencontro, é encontro. Porque nos comportamos sempre como da última vez, não parece que ficamos anos sem trabalhar juntos. O importante é que fizemos obras bacanas juntos, nos separamos mas estamos inteiros, ninguém ficou para trás", diz, sem destacar futuras parcerias.