Trama estréia portal na Internet em setembro

O diretor artístico da gravadora, João Marcelo Bôscoli, planeja usar o MP3 para divulgar artistas. Enquanto isso, prepara lançamentos no exterior e grava seu segundo disco de produtor

Silvio Essinger
03/08/2000
Lá pelas tantas do papo, João Marcelo Bôscoli, diretor artístico da gravadora Trama, não resiste a uma paráfrase do cantor e poeta americano Gil Scott-Heron: "A próxima revolução não vai ser televisionada – vai ser na Internet." O assunto é sério: mês que vem, a Trama inaugura o seu portal na rede e traça planos ambiciosos. Um deles é a criação de um departamento só para artistas que não têm contratos com gravadoras mostrarem os seus trabalhos no formato MP3, que permite o download das faixas. "O que não existe no mundo real, a gente cria no virtual", diz João, que é filho de Elis Regina e Ronaldo Bôscoli.

Ao contrário dos executivos de grandes gravadoras – e até de algumas populares bandas americanas –, o diretor artístico da Trama não teme os efeitos colaterais que a rede vem provocando na indústria, como a celeuma em torno do Napster, programa que permite que milhões de usuários troquem entre si os seus arquivos de músicas. "A Trama acredita que o Napster pode ajudar muito a vender disco", diz. "Só que nós buscamos dele uma contrapartida comercial." Para João, não será nenhuma surpresa se um dia as gravadoras estiverem fazendo de tudo para divulgar suas músicas por intermédio do programa.

Muitos reclamam da qualidade sonora das músicas em MP3. Mas o produtor garante que com a Trama – gravadora que tem estúdio próprio – a história será diferente. "A gente faz um MP3 bombado, porque masteriza diretamente neste formato", diz. A liberdade para experimentar num fomato temido pelas grandes gravadoras, segundo ele, é uma das vantagens de ser pequeno. O recordista de vendagem da Trama até agora é o disco Samba Pra Burro, do pernambucano Otto, com 30 mil cópias. "Mas depois dos 15 mil já estávamos com lucro", conta.

Para fora do Brasil
Os olhos de João Marcelo estão, mais do que nunca, voltados para o exterior. Ele fechou um contrato de representação no Brasil do selo Palm Pictures, fundado por Chris Blackwell, o criador da gravadora Island (de U2, Bob Marley e outros gigantes). Em troca, a Palm será a distribuidora dos discos da Trama nos EUA, Canadá e Europa. Inicialmente, desembarcarão no exterior os discos de Marcos Suzano, Baden Powell e dos eletrônicos do selo Sambaloco Records.

João não pensa pequeno quando o assunto é música brasileira: "A bossa nova, que era quase jazzística, tirou os Beatles da parada nos Estados Unidos. Se ela tivesse tido uma Trama, seria diferente." Sua meta é fazer justiça não só à bossa, mas à soul music brasileira – segundo ele, uma história que começou quando sua mãe gravou These Are The Songs com o autor, Tim Maia, e exigiu da sua gravadora que lançasse o disco do soulman.

E quando o soul encontra o samba? Departamento do Projeto Artistas Reunidos, que a Trama está lançando aos poucos. Começou com os discos de Max de Castro e Simoninha (filhos de Wilson Simonal), Pedro Mariano (filho de Elis com César Camargo Mariano) e agora segue com os iminentes CDs de Jairzinho e Luciana Mello (filhos de Jair Rodrigues, outro contratado da Trama). Antes de qualquer coisa, João Marcelo Bôscoli se encarrega de desfazer alguns mal-entendidos. "Simoninha e Max de Castro eu conheci os dois no colégio, não por intermédio dos nossos pais. E foi com Simoninha que eu conheci o Jairzinho". O Projeto, segundo ele, nasceu da empatia musical entre os seus integrantes, não de uma panelinha. "Panela é uma confluência de medíocres. Isso aqui é uma confluência de talentos", diz.

Só depois que todos os discos do Projeto estiverem lançados é que João parte para o lançamento de seu segundo disco "de produtor", Eletro Samba Soul. "Gostaria que não parecesse que fiz a gravadora só para mim", diz. A data do lançamento está marcada: 17 de março do ano que vem. Uma coisa apenas é certa: ele não vai assinar o CD como João Marcelo Bôscoli. "Acho uma falta de educação ter três nomes. Queria ser conhecido como o João, mas já tem o João Gilberto", brinca.