Virgínia Rodrigues - enfim - faz temporada no Rio

Cantora apadrinhada por Caetano Veloso diz que não acredita no futuro do país e acha que atualmente tem mais espaço para seu trabalho no exterior que no Brasil

Rodrigo Faour
29/08/2000
Aquela negra gordinha que canta como se estivesse conversando com Deus está de volta aos palcos brasileiros. Depois de uma turnê internacional e depois de passar por São Paulo, cantando no Sesc Vila Mariana, Virgínia Rodrigues aporta no Rio de Janeiro, no Teatro Rival, em temporada que vai de quarta a domingo, sempre às 19h30. Ela vem quase seis meses depois do lançamento de seu último CD, Nós, apenas com versões mais intimistas de clássicos dos blocos negros baianos, como Salvador Não Inerte, Uma História de Ifá, Afreketê, Depois que o Ilê Passar e Deus do Fogo de da Justiça. "Nesse show eu danço mais do que no primeiro. É mais alegre", afirma a cantora que incluiu no repertório canções de seu primeiro CD, Sol Negro, mais Berimbau e Consolação, afro-sambas da dupla Baden Powell/Vinicius de Moraes, e canções de Gilberto Gil e de seu padrinho Caetano Veloso, que a lançou, a produziu e agora dirige seu show.

Virgínia não é do tipo que se dobre fácil a quem quer que seja e Caetano é uma pessoa de gênio forte. Como então foi o encontro da dupla neste trabalho? "Ele tem temperamento forte mas não é um ditador e como artista é muito sensível. A gente se sentou juntos e ouvi sugestões suas porque ele é a voz da experiência. O projeto desse disco é dele. Tive medo no início porque pensei que não fosse conseguir realizá-lo porque as músicas fugiam de tudo que eu estava acostumada a cantar", justifica a cantora que ficou satisfeita com o disco, lançado aqui pela Natasha e no mercado internacional pelo selo americano Ryko.

Falando em mercado externo, seu trabalho vem sendo muito bem aceito. Em três anos de carreira, Virgínia já realizou três turnês internacionais. A primeira por Europa e Estados Unidos, a segunda apenas nos States e a terceira e mais completa abrangendo Inglaterra, França, Itália, Espanha, Bélgica, Eslovênia, Alemanha, duas cidades canadenses e oito americanas. "Consegui mostrar para as pessoas um pouco do que está acontecendo na MPB atual, que tem gente nova chegando. Tive boas críticas, graças a Deus, e o respeito do público, que por incrível que pareça era composto de muito poucos brasileiros", explica ela que ainda não conseguiu fazer uma turnê decente pelo Brasil. "Isso ainda é meu sonho de consumo. Aqui os custos são muito altos", esclarece.

Ajuda dos deuses
Difícil ganhar a vida no Brasil? Virgínia sabe que sim. Ela, que já foi lavadeira, faxineira, manicure e cozinheira até ser descoberta por Márcio Meirelles (que a convidou para integrar o Bando de Teatro Olodum, na Bahia), nunca conseguiu fazer as pazes com o país que nascera. "Todo mundo sonha com a melhora do Brasil. Mas na verdade não acredito que realmente que o Brasil vá melhorar. As pessoas não querem". Ex-protestante e atualmente adepta do Candomblé, ela ensina que só é possível caminhar com a ajuda dos deuses. "Nós temos que nos apegar com os deuses para termos força, senão a gente frito! Se formos contar com as pessoas da terra, sobretudo o povo que governa nosso país, em questões como saúde e educação, é melhor morrer logo", dispara.