Vulgue Tostoi lança <i>Impaciência</i> no Ballroom (RJ)
Revelação dos festivais roqueiros, a sombria banda carioca leva para o palco o disco de estréia em que juntou eletrônico e guitarras, alta e baixa fidelidade, pop e indignação
Silvio Essinger
06/03/2001
Não adianta falar em MPC, a tal Música Popular Carioca - não é com eles. Cariocas, eles realmente são. Populares... bom, em certo sentido, sim. Desde que começou suas atividades, em dezembro de 1996, o trio Vulgue Tostoi vem angariando a simpatia e admiração do público nos festivais de rock de que participou - alguns dos mais importantes do país, como o SuperDemo, o Humaitá Pra Peixe (RJ), o Porão do Rock (DF) e Abril Pro Rock 2000 (PE), onde, por sinal, foi considerado revelação. Depois de dois CDRs - CDemo e Vegetal -, Jr Tostoi (guitarras e programações), Marcelo H (voz e programações) e Vitor Z (baixo e programações) chegam ao primeiro álbum, Impaciência (NetRecords - leia crítica), que será lançado esta quarta-feira à noite, com show no Ballroom (RJ). Mais do que somente fazer sacudir o esqueleto, o Vulgue quer provocar reações - ou seja, a eles interessa mais que as pessoas se perguntem "o que é isso?" do que saiam simplesmente batendo lata e fazendo festa.
Herdeiros legítimos de uma tradição do pop underground dos anos 80, de mostrar a outra cara da Cidade Maravilhosa (de bandas como Picassos Falsos e Black Future), o Vulgue Tostoi já está ficando acostumado aos títulos que têm sido associados à banda, como os sombrios do Rio. "Alguns momentos da gente são muito instrospectivos", reconhece Marcelo H, notando que isso é um tanto incompatível com o fato de o Rio ser "uma cidade de praia, solar". Mas eles não estão nem aí. Os músicos do Vulgue são ouvintes atentos do trip hop nublado de Massive Atack e Portishead, e usam samples, batidas programadas e outros recursos eletrônicos em seus shows e no disco. "Mas não somos uma banda de rock eletrônico", esclarece Jr. "A gente usa a música eletrônica mais como linguagem, nos procedimentos de edição de computador", diz. "O nosso lado eletrônico é bacana, mas o lado rock é muito bacana também", interfere Vitor Z, que trabalhou durante alguns anos como técnico do estúdio AR (RJ), um dos mais importantes do Brasil.
Antes do Vulgue, Jr Tolstoi tocava no Juliette (de onde saiu o rapper BNegão, do Planet Hemp) e acompanhou Paulo Ricardo (antes dos arroubos de romantismo do cantor), Lobão e Lenine (com o qual está até hoje). Marcelo cantava no Akbal e Victor tocava no Minha Mãe. "Um vinha estudando o outro", conta Jr. Eles começaram o Vulgue não como uma banda, mas como um projeto, gravando experimentalmente em maquininhas de quatro canais, com bateristas emprestados. Aos poucos, foram incorporando recursos sonoros computorizados, no laboratório da banda, que é o estúdio na casa do guitarrista. "Foi mais para fazer loops e edição de sons humanos", conta Jr. Depois de conseguirem fazer a guitarra soar como um teclado e o baixo parecer uma guitarra, eles resolveram radicalizar os experimentos: fazer uma música que não tivesse uma programação eletrônica sequer. É Robô, que não entrou no disco e estará sendo apresentada no show.
Vitor conta que o que se ouve em Impaciência é o resultado dos três anos de evolução do Vulgue Tostoi. Literalmente. A versão dark de Vapor Barato (Waly Salomão e Jards Macalé) que se ouve lá foi gravada no começo do trio, em quatro canais - e não foi mexida. Terrorismo Feliz é um registro demo em oito canais. Já Impaciência, a última a ser gravada, estende seu espectro sonoro por 24 canais. Masterizadas, essas faixas convivem perfeitamente no disco. "Estamos entre o hi-fi (alta fidelidade) e o lo-fi (baixa fidelidade)", diz o baixista, informando que um dos segredos do som característico do Vulgue foi ter alternado entre acústico e eletrônico, estúdios profissionais e caseiros e mesmo microfones super sensíveis e outros bem vagabundos. "Hoje o quartinho e o Pro Tools (programa de edição digital) possibilitam muita coisa. Estúdio profissional é indispensável para quem segue a estética do clean", conta. Ele lembra que muitos dos experimentos que se ouve nos discos de Madonna, por exemplo, começaram a ser feitos nos estúdios caseiros dos seus produtores.
A favor do pop, contra o descartável
Hoje, segundo Jr, estão distantes os tempos em que alguns viam o Vulgue Tostoi "como se fosse som de maluco". "Alguns amigos acham que, no disco, nosso som ficou mais pop". O que, como diz Marcelo, não chega a ser um demérito. "Às vezes acho que as pessoas pensam que somos contra a música pop. Somos contra o descartável, não contra o pop que se reinventa, como o do U2." Para manter-se longe das pressões do grande mercado, a banda, apesar de alguns convites de majors, optou por fechar contrato com a novata NetRecords. "As gravadoras sempre sugeriam que se regravasse uma faixa aqui, se remixasse outra ali", acusa o guitarrista. "A gente pensa em sempre ter controle de tudo."
Tudo mesmo. A bonita capa de Impaciência, por exemplo, foi feita por Marcelo H, autor de letras indignadas, como a de Quebra Cara ("Reação/ Finge que se fica indignado/ Finge que se pune/ Finge que se grita"). "A gente começa a se acostumar com a loucura e a fingir que não vê o que está acontecendo. A gente procura denunciar isso nas letras", diz ele, que considera sua escrita uma espécie de liqüidificador poético, misturando as informações que colheu a partir de observações, leituras e reflexões. "Quero usar a poesia. Não simplesmente falar, mas dar umas voltas até chegar ao ponto", conta.
Exceto pelo Rappa, não há outra banda no Rio (ou mesmo no país) que se possa dizer esteticamente afim com o Vulgue Tostoi. "Não tem um movimento de bandas como a gente - o que é bom e ruim. Mas a falta de identificação ajuda a gente a ser diferente", analisa Jr. O preconceito típico com as bandas cariocas é o que atrapalha um pouco, segundo ele. Algum tempo atrás, em São Paulo, criou-se um certo clima estranho quando eles foram chamados para fazer o show de abertura dos americanos do Man or Astroman?. "Diziam que Estronave (faixa de Impaciência) parecia Pedro Luís - o que é um elogio", diz o guitarrista. "Gosto do rock paulista dos anos 80, mas de bandas underground como o Fellini." O reconhecimento, porém, não tardou. O clipe de Vapor Barato, tão lo-fi quanto a faixa (com imagens de shows no CEP 20.000, no Rio), participou como finalista do Vídeo Music Brasil da MTV (em São Paulo) na categoria de melhor clipe demo.
O Vulgue Tostoi parte para o ataque no Ballroom com a participação de Jongui na bateria, criando por cima das programações. A cantora Katia B estará marcando presença no Vapor e em Que Horas Não São? (de Vitor Ramil) e Marcos Cunha tocará teclados nessas e em Robô. Os DJs Calbuque, Marcelinho Da Lua e Zé Otávio se encarregam de animar a noite antes e depois do show da banda.
Herdeiros legítimos de uma tradição do pop underground dos anos 80, de mostrar a outra cara da Cidade Maravilhosa (de bandas como Picassos Falsos e Black Future), o Vulgue Tostoi já está ficando acostumado aos títulos que têm sido associados à banda, como os sombrios do Rio. "Alguns momentos da gente são muito instrospectivos", reconhece Marcelo H, notando que isso é um tanto incompatível com o fato de o Rio ser "uma cidade de praia, solar". Mas eles não estão nem aí. Os músicos do Vulgue são ouvintes atentos do trip hop nublado de Massive Atack e Portishead, e usam samples, batidas programadas e outros recursos eletrônicos em seus shows e no disco. "Mas não somos uma banda de rock eletrônico", esclarece Jr. "A gente usa a música eletrônica mais como linguagem, nos procedimentos de edição de computador", diz. "O nosso lado eletrônico é bacana, mas o lado rock é muito bacana também", interfere Vitor Z, que trabalhou durante alguns anos como técnico do estúdio AR (RJ), um dos mais importantes do Brasil.
Antes do Vulgue, Jr Tolstoi tocava no Juliette (de onde saiu o rapper BNegão, do Planet Hemp) e acompanhou Paulo Ricardo (antes dos arroubos de romantismo do cantor), Lobão e Lenine (com o qual está até hoje). Marcelo cantava no Akbal e Victor tocava no Minha Mãe. "Um vinha estudando o outro", conta Jr. Eles começaram o Vulgue não como uma banda, mas como um projeto, gravando experimentalmente em maquininhas de quatro canais, com bateristas emprestados. Aos poucos, foram incorporando recursos sonoros computorizados, no laboratório da banda, que é o estúdio na casa do guitarrista. "Foi mais para fazer loops e edição de sons humanos", conta Jr. Depois de conseguirem fazer a guitarra soar como um teclado e o baixo parecer uma guitarra, eles resolveram radicalizar os experimentos: fazer uma música que não tivesse uma programação eletrônica sequer. É Robô, que não entrou no disco e estará sendo apresentada no show.
Vitor conta que o que se ouve em Impaciência é o resultado dos três anos de evolução do Vulgue Tostoi. Literalmente. A versão dark de Vapor Barato (Waly Salomão e Jards Macalé) que se ouve lá foi gravada no começo do trio, em quatro canais - e não foi mexida. Terrorismo Feliz é um registro demo em oito canais. Já Impaciência, a última a ser gravada, estende seu espectro sonoro por 24 canais. Masterizadas, essas faixas convivem perfeitamente no disco. "Estamos entre o hi-fi (alta fidelidade) e o lo-fi (baixa fidelidade)", diz o baixista, informando que um dos segredos do som característico do Vulgue foi ter alternado entre acústico e eletrônico, estúdios profissionais e caseiros e mesmo microfones super sensíveis e outros bem vagabundos. "Hoje o quartinho e o Pro Tools (programa de edição digital) possibilitam muita coisa. Estúdio profissional é indispensável para quem segue a estética do clean", conta. Ele lembra que muitos dos experimentos que se ouve nos discos de Madonna, por exemplo, começaram a ser feitos nos estúdios caseiros dos seus produtores.
A favor do pop, contra o descartável
Hoje, segundo Jr, estão distantes os tempos em que alguns viam o Vulgue Tostoi "como se fosse som de maluco". "Alguns amigos acham que, no disco, nosso som ficou mais pop". O que, como diz Marcelo, não chega a ser um demérito. "Às vezes acho que as pessoas pensam que somos contra a música pop. Somos contra o descartável, não contra o pop que se reinventa, como o do U2." Para manter-se longe das pressões do grande mercado, a banda, apesar de alguns convites de majors, optou por fechar contrato com a novata NetRecords. "As gravadoras sempre sugeriam que se regravasse uma faixa aqui, se remixasse outra ali", acusa o guitarrista. "A gente pensa em sempre ter controle de tudo."
Tudo mesmo. A bonita capa de Impaciência, por exemplo, foi feita por Marcelo H, autor de letras indignadas, como a de Quebra Cara ("Reação/ Finge que se fica indignado/ Finge que se pune/ Finge que se grita"). "A gente começa a se acostumar com a loucura e a fingir que não vê o que está acontecendo. A gente procura denunciar isso nas letras", diz ele, que considera sua escrita uma espécie de liqüidificador poético, misturando as informações que colheu a partir de observações, leituras e reflexões. "Quero usar a poesia. Não simplesmente falar, mas dar umas voltas até chegar ao ponto", conta.
Exceto pelo Rappa, não há outra banda no Rio (ou mesmo no país) que se possa dizer esteticamente afim com o Vulgue Tostoi. "Não tem um movimento de bandas como a gente - o que é bom e ruim. Mas a falta de identificação ajuda a gente a ser diferente", analisa Jr. O preconceito típico com as bandas cariocas é o que atrapalha um pouco, segundo ele. Algum tempo atrás, em São Paulo, criou-se um certo clima estranho quando eles foram chamados para fazer o show de abertura dos americanos do Man or Astroman?. "Diziam que Estronave (faixa de Impaciência) parecia Pedro Luís - o que é um elogio", diz o guitarrista. "Gosto do rock paulista dos anos 80, mas de bandas underground como o Fellini." O reconhecimento, porém, não tardou. O clipe de Vapor Barato, tão lo-fi quanto a faixa (com imagens de shows no CEP 20.000, no Rio), participou como finalista do Vídeo Music Brasil da MTV (em São Paulo) na categoria de melhor clipe demo.
O Vulgue Tostoi parte para o ataque no Ballroom com a participação de Jongui na bateria, criando por cima das programações. A cantora Katia B estará marcando presença no Vapor e em Que Horas Não São? (de Vitor Ramil) e Marcos Cunha tocará teclados nessas e em Robô. Os DJs Calbuque, Marcelinho Da Lua e Zé Otávio se encarregam de animar a noite antes e depois do show da banda.