Zé Kéti ganha perfil escrito por Nei Lopes
Para o biógrafo, o compositor de A Voz do Morro, falecido no ano passado, teve atuação fundamental nos anos 60 para manter viva a tradição do samba de morro na MPB
Rodrigo Faour
04/09/2000
Em meio às gravações de seu novo disco, o sambista e escritor Nei Lopes lança seu novo livro no próximo dia 13, às 20h, no Teatro Carlos Gomes. Zé Kéti – O Samba Sem Senhor é mais um volume da festejada Coleção Perfis do Rio (RioArte/ Relume Dumará), com direito a exposição de fotos no mesmo local. Depois de ter escrito O Samba na Realidade (1981), O Negro no Rio de Janeiro e Sua Tradição (92), Dicionário Banto do Brasil (96), 171 – Lapa-Irajá, Casos e Enredos do Samba (ambos de 99) e Logunedé: Santo Menino que Velho Respeita (2000), agora é a vez dele debruçar-se sobre a obra do autor de sambas e sucessos de carnaval antológicos, como A Voz do Morro, Diz que Fui por Aí, Opinião e Máscara Negra, morto em novembro do ano passado.
Nei recebeu o convite da RioArte e aceitou de pronto. Mesmo sem ter tido uma grande convivência com o sambista, ele diz que não foi nenhum bicho de sete cabeças escrever sobre sua vida. "Estive com Zé Keti apenas umas duas vezes, em roda de amigos. Mas o universo dele é, de certa forma, o meu também. Ambos somos negros e suburbanos; freqüentamos às vezes os mesmos lugares, como escolas de samba etc., e isso facilitou a compreensão de sua trajetória de vida", justifica Nei.
Zé Kéti, segundo Nei, tinha uma meta muito concreta em sua vida como homem e artista: a busca da realização econômica através do seu trabalho. "Tanto que ele foi até concessionário de uma linha de barcas fazendo o trajeto Paquetá- São Gonçalo, além de empresário do ramo de obras e reparos em prédios". Isso mesmo. Um dos detalhes mais surpreendentes descobertos por Nei durante a pesquisa de dados sobre o livro foi que Zé realmente foi acionista de uma empresa de barcas. "Essa história, de que eu já tinha ouvido falar mas achava que era fantasia, foi o que mais me surpreendeu. E o negócio parece que só não deu certo porque mexeu com empresas de grande poder econômico. Mas ele e os sócios tinham documentos valiosos, emitidos pela Marinha (que comprovavam o negócio)."
Esquerda e direita
Apesar da fama de engajado do artista, que em 1965 estrelou o antológico espetáculo Opinião, no Teatro de Arena, ao lado de João do Vale e Nara Leão (depois substituída pela estreante Maria Bethânia), Nei afirma que Zé não era das figuras mais politizadas da MPB. "Acho que Zé Keti nunca foi exatamente um cara de convicções ideológicas sólidas e inabaláveis, como muita gente quer. O convívio com o pessoal de esquerda fez com que ele inclusive, em 1964, fosse levar solidariedade a intelectuais famosos que tinham se exilado na embaixada da Bolívia. Mas ele cantou na casa do Carlos Lacerda, aproximou-se dos militares na questão da linha de barcas... A gente tem que entender que ele era um negro suburbano, de origens proletárias e escolaridade primária que precisava pagar suas contas e tinha anseios de ascensão econômico-financeira, como qualquer um de nós", define.
Apesar de não ter um perfil ideológico tão definido, ou de acima de tudo querer realizar-se financeiramente, sua figura na MPB não pode ser subestimada. Seu papel, segundo Nei, foi fundamental para a reafirmação do samba nos anos 60. "Zé Kéti foi um aglutinador. Formou conjuntos, organizou os espetáculos do Zicartola. E eu acho que o maior mérito dele foi, talvez sem saber, tornar-se o principal veículo da valorização do samba de morro diante do preconceito e da intolerância da bossa-nova em sua fase inicial", diz. Nei afirma que a partir da curiosidade de Carlos Lyra pelo sambista é que foi aberto o campo para que Nelson Cavaquinho, Cartola e outros grandes bambas pudessem se impor novamente no cenário da MPB de então.
"Foi por isso que a bossa-nova se desalienou um pouco. Se isso não tivesse acontecido, acho que Paulinho da Viola teria tomado outro rumo e Martinho da Vila, Dona Ivone Lara, Monarco e outros não teriam aparecido. E o samba não teria conseguido experimentar a grande renovação que experimentou nos anos 80, com o Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e os outros", acredita.
Quando passar o burburinho do lançamento, Nei lançará seu novo CD, que até agora já está com 12 bases prontas. "Posso adiantar que deverá ter apenas umas três inéditas. Mas algumas das já gravadas, fora os standards, são pouco conhecidas. E mesmo as manjadas vêm com arranjos totalmente diferentes, assinados por cobrões da chamada MPB", antecipa.
Nei recebeu o convite da RioArte e aceitou de pronto. Mesmo sem ter tido uma grande convivência com o sambista, ele diz que não foi nenhum bicho de sete cabeças escrever sobre sua vida. "Estive com Zé Keti apenas umas duas vezes, em roda de amigos. Mas o universo dele é, de certa forma, o meu também. Ambos somos negros e suburbanos; freqüentamos às vezes os mesmos lugares, como escolas de samba etc., e isso facilitou a compreensão de sua trajetória de vida", justifica Nei.
Zé Kéti, segundo Nei, tinha uma meta muito concreta em sua vida como homem e artista: a busca da realização econômica através do seu trabalho. "Tanto que ele foi até concessionário de uma linha de barcas fazendo o trajeto Paquetá- São Gonçalo, além de empresário do ramo de obras e reparos em prédios". Isso mesmo. Um dos detalhes mais surpreendentes descobertos por Nei durante a pesquisa de dados sobre o livro foi que Zé realmente foi acionista de uma empresa de barcas. "Essa história, de que eu já tinha ouvido falar mas achava que era fantasia, foi o que mais me surpreendeu. E o negócio parece que só não deu certo porque mexeu com empresas de grande poder econômico. Mas ele e os sócios tinham documentos valiosos, emitidos pela Marinha (que comprovavam o negócio)."
Esquerda e direita
Apesar da fama de engajado do artista, que em 1965 estrelou o antológico espetáculo Opinião, no Teatro de Arena, ao lado de João do Vale e Nara Leão (depois substituída pela estreante Maria Bethânia), Nei afirma que Zé não era das figuras mais politizadas da MPB. "Acho que Zé Keti nunca foi exatamente um cara de convicções ideológicas sólidas e inabaláveis, como muita gente quer. O convívio com o pessoal de esquerda fez com que ele inclusive, em 1964, fosse levar solidariedade a intelectuais famosos que tinham se exilado na embaixada da Bolívia. Mas ele cantou na casa do Carlos Lacerda, aproximou-se dos militares na questão da linha de barcas... A gente tem que entender que ele era um negro suburbano, de origens proletárias e escolaridade primária que precisava pagar suas contas e tinha anseios de ascensão econômico-financeira, como qualquer um de nós", define.
Apesar de não ter um perfil ideológico tão definido, ou de acima de tudo querer realizar-se financeiramente, sua figura na MPB não pode ser subestimada. Seu papel, segundo Nei, foi fundamental para a reafirmação do samba nos anos 60. "Zé Kéti foi um aglutinador. Formou conjuntos, organizou os espetáculos do Zicartola. E eu acho que o maior mérito dele foi, talvez sem saber, tornar-se o principal veículo da valorização do samba de morro diante do preconceito e da intolerância da bossa-nova em sua fase inicial", diz. Nei afirma que a partir da curiosidade de Carlos Lyra pelo sambista é que foi aberto o campo para que Nelson Cavaquinho, Cartola e outros grandes bambas pudessem se impor novamente no cenário da MPB de então.
"Foi por isso que a bossa-nova se desalienou um pouco. Se isso não tivesse acontecido, acho que Paulinho da Viola teria tomado outro rumo e Martinho da Vila, Dona Ivone Lara, Monarco e outros não teriam aparecido. E o samba não teria conseguido experimentar a grande renovação que experimentou nos anos 80, com o Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e os outros", acredita.
Quando passar o burburinho do lançamento, Nei lançará seu novo CD, que até agora já está com 12 bases prontas. "Posso adiantar que deverá ter apenas umas três inéditas. Mas algumas das já gravadas, fora os standards, são pouco conhecidas. E mesmo as manjadas vêm com arranjos totalmente diferentes, assinados por cobrões da chamada MPB", antecipa.