A MÚSICA BRASILEIRA DESTE SÉCULO POR SEUS AUTORES E INTÉRPRETES - JOÃO DO VALE
João do Vale (2000)
Crítica
Cotação:
Dorival Caymmi disse certa vez que a música de João do Vale tinha cheiro de barro, um traço selvagem e autêntico, qualidades só encontradas em compositores genuinamente populares como ele próprio. No Programa MPB Especial (Ensaio), reproduzido nesta coleção Sesc São Paulo, João do Vale nunca esteve tão relaxado e próximo da definição traçada pelo velho Caymmi. Normalmente tímido (tinha de tomar generosas doses de cachaça para se soltar nos shows), o compositor maranhense desfila com desenvoltura um repertório de clássicos, dos forrós erotizados O Canto da Ema e Pisa na Fulô a canções de protesto, caso de Sina de Caboclo, Segredo do Sertanejo (Uricuri) e Carcará, seu maior sucesso, eternizado na voz de Maria Bethânia. Faltaram grandes canções, como Na Asa do Vento e Pé do Lageiro, e um acordeão para acompanhar o violão de Eduardo Gudin e a percussão de Carlinhos. Afinal, ouvir forrós como Pisa na Fulô e O Canto da Ema sem sanfona é a mesma coisa que ouvir João Gilberto sem violão ou Jimi Hendrix sem guitarra. Mas isso não tira o brilho do disco. Só as histórias contadas por João já valem o programa. O compositor lembra que foi trabalhar como ajudante de pedreiro no Rio de Janeiro na mesma época em que Marlene estourou nas rádios com uma canção sua, Estrela Miúda. Enquanto colocava massa entre os tijolos, ouvia a música ser tocada nas rádios de toda a vizinhança. Um dia, não resistiu e resolveu contar aos companheiros de obra que o autor daquele sucesso era ninguém menos que ele mesmo. Recebeu um olhar torto da turma e ainda foi ridicularizado: "Conversa, neguinho, tu tá delirando. Coloca mais massa aí sô!"
(Tom Cardoso)
Faixas